Como de resto é tradição nesta altura da temporada desportiva, as atenções estão concentradas no mercado de transferências de jogadores. As movimentações, as entradas e as saídas, as contratações mais ou menos sonantes, os reajustamentos aos plantéis, as cláusulas que são batidas, negociadas, espremidas por clubes de ligas mais competitivas, os adeptos que se entusiasmam com as estatísticas e as promessas de performance de encher as medidas dos que chegam, as televisões em direto contínuo do aeroporto em busca da imagem exclusiva e da declaração mais promissora. É todo um ecossistema que fervilha e que alimenta a novidade, o suspense, a incerteza, a um ritmo diário e que está na génese de dezenas de manchetes (umas mais certeiras do que outras) e muitas horas de comentário, seguramente até ao final do mês de agosto.
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sábado, 26 de julho de 2025
A CENTRALIZAÇÃO DE DIREITOS TV E O FUTURO DO FUTEBOL PROFISSIONAL EM PORTUGAL
Ainda assim, e para lá desta agitação conjuntural, há um tema que, pelo seu impacto económico-financeiro e pelas consequências estruturais que provavelmente introduzirá nos modelos competitivos, promete transformar as fundações do futebol profissional em Portugal. A centralização dos direitos televisivos é uma decisão política, estabelecida desde 2021, irreversível e apresentada como crucial para a sustentabilidade e competitividade da Liga Portugal.
A matéria é regida pelo Decreto-Lei 22B/2021, aprovado pelo Governo em março de 2021, onde se estabelece a titularidade dos direitos de transmissão televisiva, multimédia e demais conteúdos audiovisuais relativos aos campeonatos de futebol das I e II Ligas, bem como as regras relativas à sua comercialização. Em concreto, o diploma determina que tais direitos deverão começar a ser comercializados de forma centralizada a partir da época de 2028/29, ficando vedada a possibilidade de os clubes o fazerem individualmente. Embora os contratos vigentes se mantenham até 2027/28, o diploma impõe que a FPF e a Liga Portugal apresentem uma proposta de modelo de centralização até ao final da época de 2025/26, que será apreciada pela Autoridade da Concorrência.
A fórmula que tem estado sujeita a debate assenta essencialmente na distribuição em duas componentes principais: 50% do valor distribuído de forma equitativa por todos os clubes e os restantes 50% distribuídos com base no mérito desportivo e implantação social, considerando o número de adeptos de cada clube, a audiência média apresentada, a afluência aos recintos de jogo, entre outras variáveis.
De acordo com informação veiculada pela Liga, estudos recentes apontam para um valor anual entre 150 e 170M€, caso os clubes continuassem a comercializar os direitos individualmente. Com a venda centralizada, na formulação que tem sido estudada, apresentam-se projeções mais otimistas, estimando um valor agregado entre 275 e 325M€ por ano, o que representaria um incremento de 56% a 85% face à hipótese de cada clube negociar per si.
De entre as vantagens que têm sido identificadas no futuro modelo, destaca-se o reforço do equilíbrio concorrencial, considerada a potencial redução de disparidade entre os clubes maiores e os de menor dimensão. Atualmente, o ratio situa-se em 1 para 15 e, nesta nova reformulação, estima-se que poderá situar-se em 1 para 4, promovendo uma redistribuição de proventos mais equitativa entre contendores. Ao nível da projeção internacional da Liga Portugal, onde atualmente as receitas representam somente 5 a 10%, o futuro modelo centralizado promete abrir oportunidades de transmissão em mercados como os dos PALOP, do Médio Oriente e da América do Norte. A isto acrescem as melhorias na componente audiovisual, ao permitir padronizar e elevar a qualidade da transmissão dos jogos, melhorar a capacidade e conforto das infraestruturas e, com isso, beneficiar a experiência do adepto nos estádios, melhorias que visam fortalecer o valor comercial da competição nacional nas multiplataformas de difusão internacional.
Registam-se, ainda assim, algumas inquietações que exigem o aprofundamento das condições efetivas em que o processo de centralização avançará, desde logo a iminente perda de receita para os três clubes mais representativos, que, de acordo com projeções recentes, pode cifrar-se em quebras anuais entre os 10 e os 25M€. Acresce a avaliação ao cenário macroeconómico potencialmente adverso no futuro, de particular instabilidade geoeconómica à escala global, com a subida da inflação e das taxas de juro, que poderá impactar de forma determinante o poder de compra de potenciais operadores interessados em participar das negociações para adquirir os direitos de transmissão.
Não subsistem dúvidas de que o processo de centralização dos direitos televisivos em Portugal representará uma mudança estrutural com elevado potencial de valorização do produto audiovisual, mitigando desigualdades, e que contribuirá para o fortalecimento do futebol profissional. O sucesso da operação está intimamente dependente da conceção e adoção de um modelo robusto de distribuição que combine desempenho e mérito desportivo, representatividade e potencial de crescimento, assim como da capacidade de atrair novos mercados de transmissão e diferentes operadores, em ambiente concorrencial. Face à fortíssima concorrência de mercados como o inglês, o espanhol e o italiano, onde coabitam jogadores de primeiríssima linha, equipas altamente competitivas e emoção da primeira à última jornada, os clubes profissionais portugueses devem preparar o processo de implementação de um novo modelo de direitos televisivos com prudência e realismo e tomar decisões tendo por base evidências.
Ricardo G. Cerqueira, in a Bola

Banalidades e números tirados de um chapéu qualquer. Só fumo. Como é que se duplica a receita? Qual o modelo de comercialização que vai permitir esse crescimento?
ResponderEliminarE não bate a bota com a perdigota, porque os montantes totais e os rácios apresentados não são consistentes com a temida quebra anual. Ou está certo o bolo de 300 milhões (!) e o rácio 1:4, ou a quebra de 10-25M (que diga-se, é uma margem de erro brutal).
O Cerqueira tem de se de dedicar à poesia lírica.