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quinta-feira, 30 de maio de 2013

QUEM ESGOTOU O BENFICA?

ANÁLISE: quem esgotou o Benfica? (parte II)

ANÁLISE: quem esgotou o Benfica? 

A decisão do campeonato

A minha tese sobre o campeonato que passou é esta: decidiu-se no Benfica-Estoril. Claro que um campeonato não se decide, vai sendo decidido. Lance a lance, jogo a jogo. Mas do meu ponto de vista aqueles foram os 90 minutos fundamentais. Como tentarei explicar.

Para o caso não me interessa muito quem perdeu mais oportunidades na Luz, para que lado o árbitro erros mais e só acho ligeiramente interessante a expulsão de Carlos Martins. Não por o Estoril ter ficado com um jogador mais, apenas por ser Carlos Martins. O que me interessa nesse jogo é o domínio do Estoril, a forma fácil como controlou o meio-campo e as oportunidades que conseguiu criar. Nessa noite, o Benfica tentou entrar forte, marcar cedo, enfim, o costume. Depressa se percebeu que estava simplesmente esgotado.

Esse jogo com o Estoril, a 6 de maio, começa de facto uns dias antes. Mais precisamente a 30 de Março. Nesse dia, depois de ganhar 6-1 ao Rio Ave, Jesus disse o seguinte: «Neste momento, estamos em três frentes, temos de tentar jogar nos limites em tudo. Não vamos gerir em função do próximo jogo. É assim que vamos continuar para estes últimos oito jogos». Antes, durante semanas, Jesus dissera (e praticara) algo minuto diferente. Esse foi o tempo em que o campeonato era tudo, o resto logo se veria.

Esta mudança de estratégia, é a minha tese, esgotou o resto da energia dos jogadores. Sobretudo Matic e Enzo Pérez. O centro da equipa. Ao mesmo tempo, Jesus passou a socorrer-se de André Almeida como lateral esquerdo, perdendo o terceiro médio. André Gomes ficara para trás, Aimar nunca contou e Carlos Martins também não. Esse jogo com o Estoril foi a exceção e o internacional português, sob pressão, mostrou o lado pior: foi expulso e lesionou-se.

Quando comparamos os minutos jogados pelo onze base do Benfica (Artur; Maxi, Luisão, Garay e Melgarejo; Matic e Enzo; Salvio e Gaitán; Lima e Carodozo) com os minutos do onze base (Helton: Danilo, Mangala, Otamendi e Alex Sandro; Fernando, Moutinho e Lucho; James, Jackson e Varela) do F.C. Porto chegamos a uma conclusão que não surpreende: os benfiquistas jogaram mais. Um bom bocado mais, porque o Benfica também foi chamado a mais jogos do que o F.C. Porto. Do lado benfiquista, 39898 minutos. Do lado portista, 36339.

A surpresa acontece quando analisamos apenas os minutos na Liga. Nessa competição, o melhor onze do campeão nacional soma 24607. O do Benfica, 23020. Acresce que muitos destes minutos foram jogados depois de esforço em outras competições, nomeadamente a Liga Europa e a Taça de Portugal.

É evidente que estes dois números resultam de múltiplos factores, sendo os mais relevantes estes: opção dos treinadores, lesões e castigos. Mas o facto é este: o F.C. Porto jogou mais vezes com os melhores do que o Benfica. A alteração do discurso, e da prática, a mês e meio do final da Liga ajudou a agravar o problema. O que, minha tese, leva ao tal jogo com o Estoril.

Só três jogadores de campo, nos dois plantéis, passaram os 4 mil minutos: Garay, Matic e Sálvio. Foquemo-nos no sérvio. Entre esses 4077 minutos estão 90 com o Freamunde (Taça), mais 180 com o Moreirense (Taça e Taça da Liga), outros 90 nos 4-0 à Académica (Taça) e mais 90 minutos na segunda mão da Taça de Portugal, com o Paços de Ferreira. E até 90 minutos no jogo com o Rio Ave, em casa, a goleada da temporada.

Enzo Pérez jogou um pouco menos, mas nessa partida com o Estoril teve de sair à meia hora. Não era uma lesão grave, continuou a competir depois disso. Simplesmente não aguentava, como Jesus confessou algumas vezes. O argentino competiu 3450 minutos. Será que deveria ter estado em todos esses jogos? Eis alguns dos que fez. Olhanense e Moreirense, ambos da Taça da Liga. 90 minutos com a Académca, na vitória por 4-0 para a Taça de Portugal e mais 90 minutos na segunda mão das meias-finais, com o Paços de Ferreira.
Enquanto Matic e Enzo Perez, dois dos melhores jogadores da equipa, se esgotavam, Carlos Martins, Aimar, André Almeida e André Gomes eram utilizados de forma irregular. Carlos Martins jogou 792 minutos (titular apenas 7 vezes). O argentino somou 510 minutos (titular 4 vezes, esteve no banco sem competir em 14 ocasiões). André Almeida foi opção, na equipa principal, para perto de 2400 minutos, mas nos últimos oito jogos foi lateral em sete deles. André Gomes jogou cerca de 1000 minutos, mas nos últimos três meses só fez 160 minutos. No F.C. Porto, Lucho foi substítuido 26 (!) vezes, uma forma de poupar o capitão. Moutinho começou no banco ou saiu durante o jogo em 12 ocasiões.

De quem é a responsabilidade?

Tanto quanto sei, os objetivos de uma equipa de futebol são decididos pela direção do clube. Devem ser. Se aceita os objetivos, o treinador fica e trabalha para os atingir. O primeiro, depois o segundo, o terceiro e por aí fora.

Foi percetível que o campeonato era o principal objetivo da época do Benfica. Se vencesse a Liga, tudo o resto interessaria pouco aos adeptos. Durante meses a equipa foi o espelho dessa opção. No tal diz 30 de Março, tudo mudou.

Este facto, que na altura me causou perplexidade, origina uma pergunta: quem decidiu mudar? Se foi o treinador, a estrutura do futebol deveria ter-se assegurado de que a opção era correta, avaliá-la. Se foi tomada de comum acordo, então treinador e direção partilham a responsabilidade. Creio que a resposta a esta pergunta é crucial para entendermos o que se passou no Benfica.

Outra questão fundamental é responder a esta pergunta: Jesus escolheu o plantel? O treinador concordou com os meios ao seu dispor? Vou ser mais concreto. Foi Jesus que disse ser suficiente ter como médios Matic, Enzo, Aimar, Carlos Martins, André Gomes e André Almeida? Se foi, o treinador deve explicar a seguir porque não jogaram mais Aimar e Carlos Martins. Porque se eclipsou André Gomes. Porque acabou André Almeida a oscilar entre defesa direito e defesa esquerdo.

Se, pelo contrário, Jesus chamou a atenção para a necessidade de ter pelo menos uma opção de qualidade próxima de Matic e Enzo, então deve ser a direção a explicar por que não correspondeu ao pedido do treinador. Mais uma vez uma resposta clara a este ponto é essencial para compreender o processo.

Creio que todos os adeptos teem a noção que um plantel é sempre o encontro possível entre os desejos do treinador e a disponibilidade da direção. Mesmo o treinador do Bayern Munique, vencedor da Liga dos Campeões, gostaria de ter mais uns quantos jogadores.

A resposta para a pergunta do momento («Jesus fica?») deve estar contida no que forem as respostas às questões que levantei.

Se a direção validou (dizendo sim ou não dizendo não..) a mudança de rumo a 30 de Março, então não pode criticar o treinador. Se a direção não forneceu os meios que o treinador eventualmente pediu, então sabia que o risco de colapso a meio-campo existia. Assumindo que a direção é co-responsável na definição de objetivos e na formação do plantel, mais quatro aspetos devem ser ponderados no momento de definir o treinador para a próxima época: tem a relação necessária com o plantel? Tem a força anímica para começar a época? Os adeptos estão disponíveis para continuar a acreditar no treinador e na equipa? Existe uma outra opção para o lugar, com expectativa de sucesso e a mesma relação preço-qualidade?

Aqui chegado, o meu ponto é este: precisamos de mais informação para compreender exatamente o que se passou com o Benfica entre abril e maio. Informação que é crucial para entender a decisão que Luís Filipe Vieira tomar no processo Jesus. Enquanto ela não chega, fica a minha opinião, baseada na observação e nos números: o Benfica não guardou o esforço dos melhores para os jogos decisivos da Liga, o seu principal objetivo. O F.C. Porto foi capaz de o fazer.

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