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terça-feira, 5 de setembro de 2017

O ABSURDO DO FUTEBOL PORTUGUÊS


Campeões europeus em título, três equipas na fase de grupos da Champions, melhor jogador do Mundo da atualidade e vendas de jogadores perto dos 300 milhões, somados os valores dos três grandes neste defeso. Visto assim, o futebol português é uma história de sucesso. Convém, contudo, não olhar muito para além da superfície. Há o risco de se ser confrontado com um cenário absurdo, que ameaça dar cabo de um negócio de milhões e, mais importante, afastar qualquer pessoa que goste verdadeiramente do jogo jogado.

Estamos em setembro e esta época é que era. A verdade desportiva – uma contradição nos termos, tendo em conta a dose de aleatoriedade presente numa competição desportiva – chegaria a Portugal em absoluto, com a introdução do vídeo-árbitro. Claro que o VAR trouxe melhorias, mas, como também era expectável, rapidamente se transformou em mais um instrumento ao serviço do clima beligerante que envolve o futebol português. No que é um indicador avançado disso mesmo, os programas de televisão que gastavam 90% do seu tempo a analisar ad nauseam as arbitragens passam, agora, 95% do seu tempo a analisar ad nauseum os erros de arbitragem junto com os erros dos VAR. Debate sobre o futebol jogado, que é o que aproxima os clubes das vitórias, é uma quase-raridade.
Tudo previsível. Como era previsível que os que se queixavam dos árbitros, para depois denunciarem os fiscais de linha, para logo se lamentarem dos avaliadores dos árbitros, fossem os primeiros a dizer que a culpa afinal passou a ser do VAR. Não faltará muito tempo para ouvirmos queixas sobre operadores de VAR.
Este clima de suspeição permanente é, aliás, coerente com a singularidade nacional que são as queixinhas dos clubes. Com mais ou menos regularidade, nenhum resiste a delatar comportamentos dos outros. Este clima de denúncia permanente é de tal forma absurdo que os clubes se queixam não de incidentes em que atletas seus estiveram diretamente envolvidos mas de ações entre terceiros.
Nada surpreende. Afinal, outra idiossincrasia lusa são os diretores de comunicação. Protagonistas discretos e remetidos à sombra um pouco por toda a Europa, entre nós são figuras proeminentes, sempre a caminhar numa linha ténue entre a pura boçalidade e a afronta a princípios básicos que devem reger uma sociedade decente. A forma como suspensos continuam a praticar impunemente os mesmos atos incendiários que levaram às suas suspensões permanece um mistério profundo.
Se os órgãos da Liga e da Federação continuarem a assobiar para o ar, demitindo-se da sua função reguladora e permitindo que o absurdo se instale definitivamente, pagaremos todos caro. O sucesso económico e desportivo transformar-se-á em miragens do passado e, muito mais grave, a sã paixão pelo futebol dará lugar a uma combinação singular de violência da parte de alguns e de desinteresse da parte de muitos.
Pedro Adão e Silva, in Record

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