Quem viu Ederson fazer de líbero em Stamford Bridge, compensando uma ou outra falha dos companheiros, melhor compreende aquilo que de certa maneira já sabíamos e que Basileia e Funchal confirmaram: no verão, o Benfica perdeu não um grande guarda-redes, mas dois. A última época, constituindo o tempo de afirmação do atual dono incontestado da baliza do City, foi igualmente a da despedida de Júlio César do elevado nível exibicional que o consagrou e o trouxe um dia para a Lisboa.
O golo de ontem do Marítimo está gravado na memória dos benfiquistas: centro a sobrevoar uma defesa de "espectadores" e remate de cabeça de Ricardo Valente, já na pequena área. Júlio César hesitou, não saiu de imediato debaixo dos postes – a trajetória da bola, a "fugir" do guarda-redes, tornava difícil uma interceção com êxito, mas é nesses lances que se faz a diferença – e ficou irremediavelmente batido. E se formos recapitular os golos sofridos pelo Benfica na Suíça, encontraremos também uma enervante lentidão do brasileiro a sair da baliza. O tempo não perdoa e a verdade é dura. Júlio César, com pesar o escrevo, deixou de ser guarda-redes para o Benfica.
Claro que os encarnados não têm apenas um problema na defesa e a oportunidade perdida para se reaproximar dos seus rivais vai exigir um esforço sério para ultrapassar o problema. Mas não é a crise do futebol da Luz que pode justificar o que se passou na assembleia-geral. E não valorizo sequer as agressões ou cadeiras pelo ar, que já nada me admira na triste noção de convivência e de civismo que distingue as franjas de excluídos e de energúmenos que um pouco por todo o lado – e usando diversos emblemas – nos envergonham. O que me surpreende é a falta de memória de alguns benfiquistas, que não só desvalorizam a gestão da era Vieira – hoje voltada igualmente, e bem, para a redução do passivo – como se esquecem de tudo o que a antecedeu e se permitem, assim, insultar o presidente. Nunca dependi de Luís Filipe Vieira – nem sequer na década em que dirigi este jornal – mas admiro cada vez mais o seu mérito na recuperação da grandeza do monstro adormecido e a infinita paciência com que atura a ingratidão e a estupidez.
O último parágrafo vai desta feita para o despedimento de Carlo Ancelotti do Bayern de Munique, uma situação que só não é normal na vida de um treinador porque Carletto foi empurrado por um quinteto de jogadores, entre os quais Ribéry e Robben, um com 34 anos e outro que para lá caminha, ambos longe do rendimento que justifique os 8 ou 9 milhões de euros que ganham por ano. Não entendo uma empresa que trabalha assim e espero que em breve a dupla de imprestáveis milionários receba a resposta. Ainda ontem, vimos como um ex-condenado esmagou nas urnas uma criatura que ele tinha inventado e que o abandonou. Como Roma, que não paga aos traidores, as pessoas não esquecem, nem perdoam.
Alexandre Pais, in Record
Sem comentários:
Enviar um comentário