"A reconquista afirma-se nos relvados e contagia-se com uma comunicação que não precisa ser diária nem constante
1. Hoje é Domingo de Páscoa. Onde conjugam e combinam as palavras humildade e, também, responsabilidade. E, ainda, disponibilidade. Mas sabemos que as religiões estão repletas de feitos épicos, muito sangue e sofrimento. Cheguemos ao futebol. Para muitos uma quase religião! Com a derrota do Benfica na Alemanha - merecida! - e do Futebol Clube do Porto no Dragão - também merecida! - o futebol português ficou afastado das meias-finais das duas competições europeias de clubes. Fica a clara satisfação para as tesourarias de ambas as sociedades desportivas, já que realizaram as maiores receitas de sempre. Acredito que no total ambas as sociedades arrecadaram mais de cento e sessenta milhões de euros, com a equipa de Sérgio Conceição a ganhar naturalmente mais euros. Mas os números são implacáveis nos oito melhores! A Inglaterra tem quatro equipas (50%) nas meias-finais. A Espanha duas (25%) e, depois, a grande surpresa da época, o Ajax, e igualmente o Eintracht de Frankfurt. Olhando para o ranking da UEFA, os dois primeiros países - Espanha e Inglaterra - claramente dominam. Depois surge o clube alemão que afastou a equipa de Bruno Lage - e a Alemanha está no quarto lugar do ranking - e o Ajax que, aliás, em termos de valor, custa meio Ronaldo, ou seja 50 milhões de euros. A derrota na Alemanha, merecida, apesar do grave erro de arbitragem, implica que não ignoremos que o Benfica está a a sofrer nos últimos dois golos por jogo. O que é algo que importa analisar e estudar agora que toda a concentração - e acrescento toda a responsabilidade - se virou para a reconquista da nossa Liga. Agora cada jogo na Liga é mais do que uma final. Tem de continuar a haver total entrega e sem que haja desculpas para o objectivo desta época. A prioridade assumida exige que se analisem erros individuais, se suscitem momentos de forma de certos jogadores e, sem contemplações, a estrutura de comunicação do Benfica promova e efectiva humildade e afaste permanentes deslumbramentos. A reconquista afirma-se nos relvados e contagia-se com uma comunicação que não precisa de ser diária nem constante. É que nestas finais que restam, a começar na de amanhã frente a um acossado Marítimo, o Benfica, este Benfica, tem de combinar humildade com entrega, fé com vontade, disponibilidade total com inequívoca responsabilidade. Nos tempos que correm importa lembrar que nada se ganhou. E já se perdeu a Taça da Liga e a Taça de Portugal. E, agora, também a Liga Europa, onde encontraríamos um Chelsea que quer chegar à Liga dos Campeões conquistando a Liga Europa. Tal como digo-o, o Arsenal. Sem esquecermos o Valência, já que, de verdade, não acredito que o Frankfurt consiga ultrapassar a equipa de Maurizio Sarri. Daqui a um mês quero terminar esta época em verdadeira unidade mas sem unidade, em beleza. Sabendo que toda a equipa, técnicos e jogadores, quer dar uma imensa alegria a todos os benfiquistas e a todos aqueles que sentem, na emocional razão, o Benfica. Como o Tiago, que solicitou uma folga extraordinária ao patrão - que torceu o nariz - e que fez de autocarro, envergando a camisola do seu ídolo de sempre Rui Costa, seiscentos quilómetros - de Sierre na Suíça à cidade capital financeira da Europa - e que, de noite, regressou ao seu pequeno apartamento e marcando já um voo para estar presente no jogo final do seu Benfica e marcar presença no Marquês de Pombal. E o Tiago - e todos os outros Tiagos e Luíses, Vandas e Carlas - tem sempre presente uma frase que o meu querido e saudoso Senhor Artur Semedo me pediu para nunca esquecer: «O Benfica nunca perde. De vez em quando é que não ganha!» E como nos legou T. S. Eliot, «a única sabedoria que uma pessoa pode esperar adquirir é a sabedoria da humildade». E como escreveu Jean-Paul Sartre, «não fazemos o que queremos, e, no entanto, somos responsáveis pelo que somos: eis a verdade»! E, assim, na verdade dos números se constrói a reconquista. De uma Liga que Bruno Lage merece, que os benfiquistas ambicionam e que o Benfica, num imenso voo da águia, agarrará. Perdoando a alguns que lhe fizeram mal e a outros que, na sua imensa solidão, não entendem a dimensão de uma identidade que está para além deste concreto presente.
2. Só falta o jogo de amanhã na Liga NOS para terminar mais uma jornada. Em razão deste domingo de Páscoa - e nunca esqueço que nasci num lindo Domingo de Páscoa - já se disputaram oito jogos da jornada trinta. Há, assim, ainda doze - ou quinze - pontos em disputa e, acredito, a disputa vai ser difícil, complexa e jogada em muitos tabuleiros. Mesmo muitos. E, aqui, na minha modesta opinião - e só os homens calados é que não erram! -, o silêncio é ouro. E de ouro. E ouro é reconquista!
3. Sei bem que nos faltou - rotundamente falhou! - o VAR na Alemanha. Com ele não haveria o um a zero. E a história do jogo poderia ser bem outra. Como houve muito VAR - mesmo muito! - nos jogos da Liga dos Campeões. No Dragão validou um golo. Em Manchester não vimos uma repetição, bem evidente, do golo de Fernando Llorente que levou o City, e os seus 60 milhões de euros em aquisições, a ficar, uma vez mais - e pelo terceiro ano consecutivo - fora das meias-finais da Liga dos Campeões. E, em sentido contrário, o nosso Cristiano Ronaldo, no meio de uma incapaz Juventus, viu-se afastado, pela primeira vez em largos anos, se uma presença numa meia-final da competição ais emblemática do futebol mundial. E agora ao City, ao Liverpool, ao Tottenham, ao United, ao Chelsea e ao Arsenal faltam, na liga interna, seis finais. O Arsenal é o único que não tem de defrontar nenhum dos direitos antagonistas. E ambiciona com a Liga Europa chegar à Liga dos milhões. E com a consciência que, em tempo de Brexit, o futebol inglês pode conquistar a Europa. Sinais de tempos controversos e... sem que se possa ignorar, como é habitual e bem consciente, o Barcelona de Messi e companhia. Incluindo o nosso Nélson Semedo. Mas, aqui, sente-se, e pela Catalunha do futebol - e em vésperas de eleições legislativas em Espanha -, ao contrário do que ocorre em Paris e no PSG, humildade e responsabilidade. Mas sempre com o futebol a apertar os nossos corações e com uns com fartas comemorações e outros com dolorosas desilusões. Como o nosso Tiago. É a vida com o seu prazer e a sua dor. Mas sempre a vida. A vida vivida. Que não se repete. A na Madeira o que ocorreu, num instante, foram 29 vidas que se perderam. E como Louis Aragon nos disse, «a vida é um viajante». É mesmo!
4. (...)"
Fernando Seara, in A Bola
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