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sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

DE VEZ E SEM DÓ


"Que ninguém tenha dúvidas. O assunto não se circunscreve no âmbito desportivo, não é uma matéria que possa restringir-se à esfera da competitividade, e muito menos poderá ser reduzido a uma questão de clubismos. O que aconteceu em Guimarães, num estádio e durante um desafio de futebol, foi mais um gravíssimo sintoma de uma doença civilizacional que se tem desenvolvido lavarmente, perante a estranha, longuíssima e generalizada passividade de todas as nossas estruturas sociais e políticas.
O que é incrível é que, de acordo com as lições que a História nos deixou, nem mesmo antes dos alvores da nacionalidade, quando ainda nos confrontávamos com outras pessoas de outras origens que então nos dominavam politicamente e civilizacionalmente, os nossos antepassados que aqui viviam nesse longo período de gestação da identidade colectiva souberam acolhê-los, assimilando até, dessa convivência, a sabedoria e as conveniências possíveis de que ainda hoje, nove, dez, onze séculos mais tarde, mantemos vestígios e marcas culturais bem patentes.
Do modo ainda mais evidente, é também absolutamente óbvio para todos nós que se, depois de completada a definição das nossas fronteiras, não tivessem os nossos governantes e os nossos heróis, durante o momento histórico da Expansão portuguesa, buscado expressamente outros horizontes e outros identidades, outros homens e mulheres, com costumes e perfis completamente diferentes dos que levámos na extensa Viagem, não seríamos hoje o que hoje somos.
Bem podem agora oportunistas ou demagogos de todos os quadrantes e naturezas vir com as teorias esdrúxulas que quiserem, para se tentarem aproveitar das tristes circunstâncias que a espuma dos dias infelizmente lhes concede... De nada lhes servirá. Eles não conseguirão entortar a Grande História que, afinal, nos determina a todos: se o caminho comum dos portugueses tivesse sido o exclusivismo, da xenofobia ou do racismo, este país não seria este país.
Por outro lado, além desses populistas sem pudor, também é tempo de serem naturalmente identificáveis e isolados e punidos de vez, sem dó, os marginais que, nas curtas franjas da poderosa corrente inclusivista comum, lhes tomam boleia daquelas vergonhosas ideias passando a miseráveis práticas de coacção e violência, se ousarem prosseguir as suas indecorosas bravatas numa viagem de metro, num ajuntamento político ou num estádio de futebol qualquer. Em todo o caso, que não nos venham, outros, com histórias: se, evidentemente, estamos juntos com Marega, nós não esquecemos do que, muito antes, aconteceu com Mantorras, nem do que fizeram a Nélson Semedo, nem do que disseram de Renato, por exemplo."

José Nuno Martins, in O Benfica

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