"Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. Parece-me claro que a frase proferida por Luís Vaz de Camões continua actual. Seja qual for o contexto, mas especialmente se estivermos a falar de futebol. Sejam quais forem os agentes desportivos envolvidos, mas especialmente se estivermos a falar de empresários de futebol
O artigo de opinião que se segue não é uma crítica a uma classe cada vez mais poderosa no mundo do futebol. É apenas a constatação de um facto há muito sabido e cada dia mais reforçado: o amor à camisola e o plano desportivo pouco ou nada podem perante o dinheiro em abundância e as promessas de enriquecimento instantâneo.
João Félix terá estado próximo de regressar ao Benfica. Digo terá estado porque não creio que alguma vez tivesse sido essa a intenção do seu empresário. Pura e simplesmente porque se Jorge Mendes tivesse realmente esse intuito, o antigo craque encarnado teria sido apresentado aos sócios durante a Eusébio Cup.
Seria assim tão simples quanto isso? A meu ver, sim. Ou não fosse ele o empresário de futebol mais poderoso e bem relacionado do mundo. E reside aqui boa parte do problema benfiquista no que ao regresso de Félix diz respeito.
Ao ser uma figura tão influente e bem relacionada, facilmente se prevê que Jorge Mendes é alguém com inúmeras ligações a inúmeros clubes, fundos de investimento, magnatas e empresários de sucesso que investem no futebol. Essas ligações têm um custo claro: a rentabilização financeira de activos, neste caso, de jogadores.
O Chelsea nunca levou a sério a proposta apresentada pelo Benfica. Por ser demasiado baixa e por não garantir o retorno financeiro pretendido para fazer face ao investimento efectuado aquando da transferência de Félix do Atlético de Madrid para Stamford Bridge.
No entanto, e porque era necessário ganhar tempo e encontrar novos interessados, os londrinos foram “cozinhando” o negócio em “banho-maria”. Alimentaram as esperanças encarnadas enquanto alguém procurava eventuais novos parceiros que pudessem ajudar o Chelsea a ter o tal retorno financeiro.
Conseguem imaginar quem foi esse alguém? Não é difícil, pois não?
Em abono da verdade, não há mal nenhum que assim tenha sido. Cada um sabe de si e das suas funções, cada um tem os seus objectivos e as suas gratificações. O que significa que Jorge Mendes fez aquilo que lhe pediram para fazer e no qual ele tem sido extremamente competente ao longos dos anos: encontrar uma solução financeiramente vantajosa para as partes interessadas…e que lhe interessavam.
Obviamente que o facto do Al Nassr ter Cristiano Ronaldo como figura de proa ajudou. Mais até do que a possibilidade de trabalhar com Jorge Jesus. Mas o que realmente foi decisivo em todo este processo foi a parceria Chelsea-Mendes, na qual ambos teriam muito mais a ganhar se Félix rumasse à Arábia Saudita do que ao campeonato português.
Então e a vontade do jogador? E a possibilidade de regresso “a casa”, onde é (era) estimado, acarinhado e onde poderia vir a relançar a sua carreira? Isso não deveria/ poderia ser tido em consideração? Deveria…se o fenómeno futebol fosse um mundo diferente do que realmente é.
Deveria se o plano desportivo interessasse mais a todas as partes do que o plano financeiro. Poderia se João Félix estivesse realmente disposto a mostrar que, afinal, Simeone, Xavi, Conceição e Maresca estavam errados ao não lhe concederem a titularidade absoluta e inequívoca nas suas equipas. Poderia se Félix tivesse verdadeiramente o controlo sobre a sua carreira e fosse o dono da última palavra.
Mas não está. Não tem. E não é..."
Laurindo Filho, in ZeroZero

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