Não constitui grande surpresa o deserto de ideias para o futuro que tem sido a pré-campanha do Benfica. O passado já nos mostrou como os sócios tomam decisões nestas alturas. Nada a fazer?
Uma corrida eleitoral com seis candidatos faria prever, em tese, o funcionamento da democracia em todo o seu esplendor. Diferenças de abordagem, ideias para o futuro, respeito no debate, elevação e civismo nos atos de candidatura.
Era tudo uma ilusão, se é que chegou a sê-lo. Na verdade é provável que não, porque infelizmente abundam na história do futebol português (e basta pensar no século 21) exemplos lamentáveis ocorridos na vida política dos clubes, nomeadamente em Assembleias Gerais, espaços que deveriam ser, por definição, a ágora onde se discute e decide o futuro das instituições. Não será preciso esmiuçar o que sucedeu com o FC Porto, incluindo consequências criminais associadas, ou com as AG de destituição de Bruno de Carvalho do Sporting. Ou com anteriores assembleias na Luz. Isto para não falar de Alcochete.
O que se passou este fim de semana na vida do mais representativo clube português traduz uma degradação que tem raízes profundas, é certo, na quase exclusividade da emoção como fio condutor da relação dos adeptos com os clubes de futebol. E sim, escrevi clubes de futebol de propósito, porque todos sabemos qual é a força motriz de cada um dos principais emblemas nacionais. O Benfica ter vencido o Sporting ontem, em hóquei em patins, não retira nem acrescenta um voto a qualquer candidato; potenciais vitórias da equipa de futebol do Benfica em Londres, no Porto e em Newcastle podem decidir tudo a favor de Rui Costa, como aliás o próprio Luís Filipe Vieira referiu ontem em entrevista televisiva.
Mas além desta irracionalidade sócio-económico-filosófico-financeira que está na base dos clubes-religião, há uma responsabilidade importante a imputar à classe dirigente, ou aos candidatos a membros da classe dirigente: cavalgam a onda e conseguem, agora no caso do Benfica, passar um fim de semana inteiro a marcar a agenda informativa sem a divulgação de uma ideia para os próximos quatro anos do clube.
Os seis candidatos — incluindo os dois outsiders que, talvez por isso mesmo, ainda tentam aqui e ali gritar um pensamento mas não conseguem ser ouvidos — trocaram acusações, disseram mal uns dos outros, marcaram posições e desdobraram-se em declarações para tentar arregimentar votos.
Há uma frase brejeira que fala de «descida de nível e subida de interesse». Aqui, não tem havido nível nem interesse.
Alexandre Pereira, in a Bola

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