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segunda-feira, 9 de março de 2020

TRISTEZA NÃO


"O Benfica acredita sempre. O Benfica confia sempre. Sabendo que «confiança é a mãe do descuido». E, por ora, já chega de descuidos

1. O Benfica, uma vez mais, não venceu. Ficámos bem tristes. Logo no instante do apito final de João Pinheiro. Ontem em Setúbal assistimos a um fraco jogo de futebol. Principalmente na primeira parte. E não vale a pena falarem-nos de um jogo que não vimos. O Benfica e Pizzi, uma vez mais, falharam uma grande penalidade. Que a serem concretizadas teriam permitido a manutenção da liderança, se bem que as últimas exibições não tenham sido, de verdade, e no seu todo, entusiasmantes. Nos últimos jogos o Benfica mostrou insuficiências e não concretizou evidências. O Benfica, uma vez mais, mudou o onze inicial e só a defesa tem sido a mesma nos últimos jogos. Sei bem que os onzes dependem dos adversários. Sei-o. Mas também sei que, neste momento da época, tem de haver um mínimo de estabilidade. Cervi entre e depois Cervi sai. Samaris passa a ser o gajo e Rafa salta do onze inicial para o banco. E os exemplos poderiam ser outros! Bruno Lage não está a saber gerir, mesmo em termos psicológicos, este mau momento. Há três meses o Benfica jogava, dominava e entusiasmava. Agora, há oito jogos, o Benfica joga e não motiva, por vezes domina mas não concretiza. O que se sente é que o Benfica está muito intranquilo. Mas esta intranquilidade não pode suscitar uma falta de solidariedade nem uma alienação de responsabilidade. Mas também não pode ser sinal de resignação nem da não percepção de inequívocas dificuldades. Para nós, simples adeptos, fica a tristeza de exibições não conseguidas e de largos pontos perdidos. Mas fica, sempre, a convicção de que regressaremos às vitórias e voltaremos à conquistas dos três pontos. Acreditando que não deixaremos de falhar grandes penalidades. Mas, no final do jogo de ontem no Bonfim, recordámos André Gide: «Não há problemas, apenas há soluções. O espírito do homem, depois, inventa o problema!» E, tendo presente esta afirmação, a combinação entre simplicidade e sinceridade é meio caminho para o regresso da necessária tranquilidade. A todos os níveis. Na certeza que não poderemos acompanhar Gustavo Flaubert quando nos adverte que importa ter cuidado com a tristeza já que «ela é um vicio». E este vício o Benfica, este Benfica acredita sempre. O Benfica confia sempre. Sabendo bem que «confiança é a mãe do descuido». E, por ora, já chega de descuidos! Já chega mesmo!

2. A liberdade individual é um bem que se conquista e não se aliena. Ser livre implica dizer sim, quando se acredita, e acentuar, quando devido, o não. Ser livre determina que não dependemos de ninguém e que não confundir as nossas obrigações institucionais com as nossas necessidades pessoais. Ser livre significa não ceder nas nossas responsabilidades e não ficar preso a pretensas fidelidades que nos condicionam, quando não amordaçam. E no mundo do futebol global há lideranças que perderam a autoridade e a influência, mesmo que assumam que exercem o poder. A disputa entre a UEFA e a FIFA é real e cresce mês a mês. Já não é uma disputa surda. É um confronto directo. Há disputas em diferentes patamares da justiça desportiva e há, entre nós, novidades na justiça do Estado no que concerne ao futebol! Um conjunto de situações de e da justiça do Estado - do estado de Direito! - invadiram números impressionantes, sejam positivos - como as assinaláveis e impressionantes contas do primeiro semestre da presente época no que concerne ao Benfica e à sua SAD (com 104 milhões de lucro!) - sejam negativos, como os resultados alarmantes e bem preocupantes da SAD do Futebol Clube do Porto. Ou, então, de factos relevantes como a milionária transferência de Rúben Amorim do Braga para o Sporting e, aqui, sem ignorar que foi graças à sagacidade e ao empenho jurídicos da Dra. Ana Rita Relógio e ao Dr. Manuel Loureiro que o agora treinador leonino não ficou impossibilitado de registo por uma época desportiva bem como, na altura, de noventa dias de suspensão! Mas, ao mesmo tempo, surgiu a Operação fora de jogo que, em razão dos inúmeros arguidos (e arguidas), parece que determina ou um silêncio colectivo ou, então, abaixo assinados que, mesmo sendo um legítimo clamor de liberdade, perturbam a justiça, os seus titulares e as suas reafirmadas decisões. A curto prazo teremos, a par de proclamações de «libertem-no», porventura outras, em relação a outros sujeitos, no sentido de «prendam-nos»! E, assim, e mesmo para muitos que nunca passaram uma vista de olhos pelo livro Football Leaks - de Rafael Buschmann e Michael Wulzinger -, importa assumir que nas suas páginas há factos que perturbam, dados que angustiam e divagações que, decerto, levaram diferentes autoridades a abrir processos e a determinar inquéritos. Não é, por ora, o momento para mais perplexidades. Mas é a circunstância para dizer que, também nestas sede, e para lá de haver decisões de defesa que não se entendem - há mesmo impedimentos, pelo menos éticos, que existem -, é o tempo para deixar a justiça funcionar, seja nos seus múltiplos mecanismos de defesa seja nas suas vertentes de investigação. Com a consciência que, perante as sombras que invadem a nossa justiça e, diga-se, poucos dos seus actores, haverá, no final e afinal, verdadeira justiça doa a quem doer! E esta convicção, que brota das mais altas instâncias do poder judicial, é válida para todas as investigações. Para todas mesmo. Para todo os processos, sejam, ou não, mediáticos. E, logo, para todos os arguidos. Singulares ou pessoas colectivas. Estejam, até, e a nível singular, uns em prisão preventiva, outros em domiciliária ou apenas, muitos outros(as), com termo de identidade e residência. E, aqui, e como sugestão, aconselho a deliciosa leitura de um livro - Histórias da Justiça - de António Canêdo Berenguel, acabado de sair, que nos leva ao mundo real da justiça, dos seus dramas e enredos, dos seus processos e, acima de tudo, à riqueza de histórias de vida. Como a descoberta de notas falsas de cem réis em ceroulas... Sim em ceroulas! Leiam! Faz-nos bem! Ficamos menos tristes. Sorrimos!

3. (...)"

Fernando Seara, in A Bola

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