Que o futebol é um negócio, de âmbito global e com rentabilidade cada vez mais garantida a um pequeníssimo nicho de profissionais que à volta dele cirandam, já todos sabemos e, de resto, com essas evidências somos confrontados quase em permanência.
Seja nas negociações plurianuais de direitos de transmissão de jogos, seja no respetivo alinhamento de acordo com os interesses de main sponsors, dos seus produtos e dos seus targets, ou na dimensão mais prosaica das transferências efetuadas, falhadas ou teoricamente promovidas apenas para aumentar o valor de mercado deste ou daquele jogador.
Chegamos, de facto, a um ponto em que o adepto, as suas experiências nos estádios ou em torno do jogo se transformam em acessórias e quase irrisórias, quando, na realidade, é ele (o adepto), que deve sustentar a modalidade, que deve enformar o espetáculo e, no limite, garantir condições para que ele se realize.
Deixemos, porém, este enquadramento da utopia para nos centrarmos nos mercados de transferências, fenómeno cada vez mais difícil de organizar e de regulamentar.
Desde logo porque, sendo o mais visível e rentável, o mercado europeu se rege por dois períodos (um alargado no verão e outro, contido num mês, no inverno), mas deixa margem, ainda, para mercados emergentes, talvez agradáveis do ponto de vista desportivo e financeiro, noutros países e noutras zonas do globo. Ora esta diversidade absoluta de datas é o pior para o adepto e para o treinador, mas talvez represente mesmo uma vantagem para os jogadores e, sobretudo, para uma classe profissional tantas vezes na sombra, porém cada vez mais decisiva (e rica): os agentes, essa penumbra que a FIFA tenta organizar e regulamentar, e que, por serviços de intermediação, cobra entre cinco e dez por cento dos negócios e assume papel determinante na sua prossecução (ou não), balizando, tantas e tantas vezes, a real vontade do jogador que, para imensos casos, não conta nada e não faz falta nenhuma…
Atenhamo-nos, agora, no mercado de inverno dos três principais clubes portugueses (pelo menos no plano mediático). Bem diferentes as abordagens e as potenciais consequências.
Pressionado pela situação financeira, pelos problemas de tesouraria e pela reorganização metodológica em curso no Dragão, André Villas-Boas e o FC Porto foram quem mais lucrou e menos lucrou.
No capítulo financeiro, quem dera aos azuis e brancos terem períodos de transações tão favoráveis como o que terminou esta semana. 90 milhões de euros em caixa, uma maré fresca de dinheiro que permite reequilibrar uma balança muito deficitária, um sinal importante nesse capítulo dado aos adeptos.
O reverso da medalhe foi a venda de Galeno e, sobretudo, de Nico González, jogadores que poderiam ser muito importantes para um novo treinador que, assim, vê um claro sinal vermelho na perspetiva real de conquista de títulos esta temporada. Ninguém de bom senso poderá exigir vitórias em competições ao jovem técnico argentino, até porque o sinal transmitido pela abordagem ao mercado intermédio pela SAD portista foi, claramente, no sentido contrário: reformulação interna (incluindo plantel…), preparação com tempo e a tempo (um fator tão arredio do futebol de alto rendimento), e projeção de uma equipa verdadeiramente competitiva e à imagem do treinador para a temporada de 2025/2026. Os portistas, aliás, representam bem a ideia de que nada pode ser perfeito e de que, em determinados momentos, quando se tapa os pés certamente se destapa a cabeça…
Já em Lisboa os ares de mercado foram necessariamente distintos. Enquanto o Sporting se limitou a uma gestão de danos cautelosa, acreditando no seu scouting para identificar o brasileiro Biel no Bahia (alguém que poderá competir com Pedro Gonçalves, por exemplo, na titularidade do campeão nacional), do outro lado da segunda circular o ar foi bem mais agitado com uma fuga para a frente de Rui Costa no ataque ao mercado.
O presidente encarnado percebeu que esse poderia ser o único modo de dar um sinal interno de vitalidade, após um período de contestação que não se resumiu a questões desportivas — entenda-se, de rendimento puro da equipa principal de futebol — mas que alastrou a diversas franjas críticas do universo benfiquista, em ano eleitoral e com as consequências imediatas e, sobretudo, mediáticas que tal facto acarretaria.
Estrategicamente, o atual líder da Luz mostrou presença, reconhecendo tacitamente a necessidade de retocar o plantel e mostrando alguma força nas negociações. Caso a caso, só o futuro próximo poderá confirmar ou desmentir a eficácia das operações, mas a chegada de Manu Silva, Dahl, Bruma e Belotti à Luz confere a Bruno Lage elasticidade e competitividade.
Mesmo que consideremos o passado recente do campeão europeu italiano (muito pouca presença e rentabilidade na Fiorentina e no Como), Pavlidis e, até, Arthur Cabral ganham um concorrente direto, experiente e muito físico na sua abordagem ao jogo. Para ser titular? Duvido…
Já Manu insere-se numa boa identificação de um valor seguro, que poderá dar a Florentino algumas dores de cabeça na discussão de um lugar no onze, e Bruma, veterano mas buliçoso e certamente com muita vontade de mostrar serviço, questionará Akturkoglu sobre titularidade e estará sempre na alternativa a um Di María que os benfiquistas desejariam fosse dez anos mais novo…
De dinheiros e de empresários falaremos em breve. Dos três grandes, o Benfica é, notoriamente, o campeão do mercado de inverno.
Cartão branco
Há muito que o judo português tem relevância internacional. Modalidade corpo a corpo, de grande intensidade física e técnica, requerendo completa dedicação e determinação, é bem o exemplo de um crescimento sustentado e do equilíbrio na balança entre uma alta competição coesa e regenerada a cada geração, e um plano de massificação e criação de condições de base para a captação de praticantes, por um lado, e a filtragem e despistagem de potenciais talento, por outro Patrícia Sampaio já tinha deixado clara, nos Olímpicos de Paris, a sua qualidade e vontade de vencer. Volta, alguns meses depois, à cidade-luz, e ilumina de modo dourado o judo português. Um exemplo de talento, dedicação e sucesso.
Cartão amarelo
O rapaz tem condições inatas para ser um dos melhores jogadores de futebol de sempre. Tem também vontade de mostrar serviço, sendo muito útil a um Real Madrid que, por vezes, até depende dele para descobrir caminho relvado para as balizas adversárias. Mas o seu mau feitio e o seu caráter truculento ainda o vão tramar. A cena de Vinícius Júnior questionando as palavras e a autoridade em campo do seu capitão Luka Modric apontam um caminho nada simpático ao jogador brasileiro, e demonstram que, sem acompanhamento rigoroso, Vini Jr. pode descambar facilmente, como já sucedeu com outros potenciais craques…
Rui Almeida, in a Bola
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