segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

SOB O SIGNO DO VAR


(os casos da 21ª jornada da Liga analisados ao pormenor por Duarte Gomes)
O ex-árbitro Duarte Gomes analisa os casos duvidosos da 21ª jornada da Liga portuguesa, em que o videoárbitro esteve em destaque
A jornada deste fim de semana (que hoje ainda terá partidas no Funchal - Marítimo-Portimonense, às 19h - e em Setúbal - Vitória de Setúbal-Belenenses, às 21h), decorreu sob o signo da vídeo-intervenção.
Em vários jogos, o videoárbitro (VAR) foi o recurso encontrado para chegar a decisões importantes, algumas das quais se revelaram decisivas no resultado final das partidas.
Na Luz, Manuel Oliveira (da AF Porto) dirigiu um jogo em que o avolumar do resultado diluiu qualquer eventual ruído ou protesto.
No golo do Rio Ave, Guedes foi mais forte, saltou mais alto do que Rúben Dias e marcou sem cometer qualquer infração.
Pouco depois, momento de dúvida na área vilacondense: Jonas isolou-se e ao passar por Cássio acabou por cair no solo. Na repetição, foi possível perceber que o guarda-redes do Rio Ave encolheu-se mas não conseguiu evitar o contacto, com a ponta das luvas, no pé direito do avançado do Benfica (pé esse que já estava no solo quando houve o toque). Ficou a ideia que essa ação não foi suficiente para derrubar Jonas que, diga-se, nada fez para o evitar. Em nossa opinião, o lance foi bem avaliado.
Na 2ª parte e além dos golos que contaram, o Benfica ainda introduziu a bola na baliza adversária por outras duas vezes, mas no primeiro caso a bola tinha saído totalmente do campo (pela linha de baliza) e no segundo Jonas estava em claro fora de jogo. Esteve muito bem, em ambos os casos, o árbitro assistente.
Nota para um erro disciplinar evidente: Bruno Teles viu amarelo, com justiça, aos 43' (rasteira antidesportiva sobre Rafa) mas devia-o ter visto também logo aos 12', quando protagonizou entrada duríssima e negligente sobre Salvio. Ali não havia gestão possível.
No Dragão, FC Porto e Braga protagonizaram jogo intenso, bem disputado e muito difícil de arbitrar. Destacamos quatro lances entre vários que poderiam aqui merecer análise.
O primeiro ocorreu pouco depois da meia hora de jogo: Corona entrou na área bracarense com a bola controlada e, num primeiro momento, foi importunado pelo braço direito de Jefferson, que o esticou para obstruir a sua passagem. Depois, ambos os jogadores travaram luta pela posse de bola (com os braços), mas o lateral do Braga acabaria por tocar, com o seu pé direito, no esquerdo de Corona, provocando a sua queda. Apesar do lance aparentar ser legal, de disputa dividida (o que terá iludido Hugo Miguel), ficámos com a ideia que seria merecedor de pontapé de penálti. Percebe-se a não intervenção do VAR, em função da subjetividade de análise da jogada.
Depois, dois momentos de foro disciplinar, que as imagens mostraram terem sido mal avaliados: Marega teve entrada muito dura (e negligente) sobre Danilo e conseguiu escapar ao amarelo; mais tarde, foi o próprio Danilo a carregar, de forma ostensiva e evidente, Brahimi. O médio bracarense usou o cotovelo/braço esquerdo para atingir o rosto do argelino do FC Porto, correndo o risco de o lesionar. Houve conduta violenta, que justificava cartão vermelho. O foco do árbitro estaria nos pés, zona onde a bola estava a ser disputada por ambos os jogadores. Aqui o VAR poderia ter atuado com eficácia.
Na última situação, ficou apenas uma dúvida, que nenhuma imagem ou repetição ajudou a esclarecer. Já sobre o apito final, Filipe parece ter puxado Dyego Souza para se antecipar e cabecear a bola. O desenho da jogada (a forma como ganhou a posse de bola e a maneira como o avançado do Braga caiu) sugere ter havido infração, mas o certo é que isso não foi claro na televisão, razão pela qual concedemos, naturalmente, o benefício da dúvida a Hugo Miguel (e, pelo mesmo motivo, ao VAR). É importante sublinhar que o lance ocorreu numa altura em que a bola não estava em disputa, o que justifica o facto do árbitro não se ter apercebido da eventual ilegalidade.
Na Amoreira, domingo, assistiu-se a uma verdadeira lição de como bem (video)arbitrar um jogo.
Trazemos aqui os três lances mais relevantes da partida, todos com a intervenção oportuna de Luís Ferreira, ontem VAR (houve outros lances nas duas áreas, mas todos bem analisados).
À passagem da meia hora, o árbitro assistente assinalou fora de jogo a Ewandro. Manuel Mota, experiente árbitro da partida, não interrompeu de imediato e só apitou bem depois da bola estar no fundo da baliza de Rui Patrício. Esse pequeno (grande) pormenor foi suficiente para permitir ao VAR repor a verdade do lance, dando indicação para validar o golo.
Com este novo paradigma, é ainda mais importante que os jogadores percebam que o jogo só está interrompido ao apito do árbitro (e não quando sobe a bandeira do assistente). Ontem deu a sensação de ter havido “desistência defensiva” do lance, o que facilitou a obtenção do golo. Para reflexão.
Mais tarde, aconteceu o oposto. O árbitro assistente não assinalou fora de jogo, mas Ailton estava mesmo adiantado antes de servir o companheiro para golo. Nova decisão bem retificada pelo VAR.
No último minuto de jogo, Luís Ferreira voltaria a ter intervenção muito oportuna: Montero estava mesmo adiantado e a opção inicial de não sancionar essa posição estava incorreta. O golo não podia valer.
Duas conclusões sobre este jogo: o brilhantismo das intervenções do VAR, que ontem reafirmou a importância desta tecnologia, quando bem aplicada; a gravidade dos erros cometidos, em campo, pelos árbitros assistentes, que devem merecer reflexão atenta dos próprios: o Videoárbitro é um auxílio, um complemento à decisão e não uma ferramenta de substituição. É importante que a tecnologia não promova relaxamento ou acomodação a quem está no terreno de jogo.
Mas para além dos chamados “três grandes”, houve mais VAR em outras partidas. Foi o que aconteceu, por exemplo, na Feira e em Guimarães.
No Feirense-D. Chaves, a bola ultrapassou a linha da baliza de António Filipe, mas nenhuma imagem esclareceu se por completo ou não. O árbitro assistente entendeu que sim e o VAR teve que confirmar a decisão, uma vez que não tinha evidências de que tinha sido cometido um erro claro. Faria exatamente o mesmo caso a opção tivesse sido de não considerar golo. Assim sendo, decisão acertada.
Depois, houve uma bola que parece ter batido, de forma muito suspeita, no braço levantado de Stephen mas, de facto, nenhuma imagem o comprovou de forma evidente. Precisamente por isso, o VAR foi coerente e não recomendou (bem, de novo) a alteração da decisão inicial.
Em Guimarães, a bola cruzada por João Aurélio bateu no braço direito de Ricardo, quando este o tinha colocado deliberadamente atrás das costas, junto ao corpo, para não cometer falta para penálti. Assinalar infração teria sido quase criminoso. Esteve muito bem Rui Oliveira (e o VAR) em considerar legal o lance.
Já na segunda parte, Bruno Santos usou o braço esquerdo para travar Sturgeon, agarrando-o de forma evidente no interior da sua área. O pontapé de penálti foi bem assinalado (e mais uma vez, bem validado pela vídeo-tecnologia).
Aos poucos, começam a assimilar-se rotinas e os resultados começam a melhorar.
Duarte Gomes, in Jornal Expresso

Sem comentários:

Enviar um comentário