"Pela primeira vez desde a pandemia, voltei ao Estádio. A Luz brilha e encandeia como nunca, transformou-se de inferno virtual em vulcão real, com a corrente eléctrica dos “leds” e dos altifalantes a tolher sentidos e a despertar uma atmosfera de momentânea felicidade que vai muito para lá da simples alienação clubística. A Luz é hoje uma das “arenas” mais avançadas da Europa, prometendo um ambiente frenético e espectacular quando os profissionais do Benfica souberem tirar partido das potencialidades do “software” que comanda a panóplia tecnológica que acaba de ser instalada, sem esquecer a necessidade de um “speaker” fora da caixa e que não pareça completamente desfasado do guião.
O Benfica empatou com o Sporting e não demonstrou a superioridade que quase um ponto a mais por jornada poderia sugerir. Pelo contrário, nem o Benfica é tão forte como a sua liderança esmagadora, nem o Sporting tão frágil quanto o seu prematuro afastamento da corrida do título.
O que este jogo me disse foi que o Benfica ainda terá de melhorar muito para chegar ao campeonato. Tem uma defesa que comete erros infantis, um meio-campo que retira profundidade ao jogo, porque os médios-ala não têm velocidade, e um ataque que se desenrasca, mas não se movimenta por uma estratégia sistemática. O Sporting está fora da corrida pelo título porque só a vitória lhe interessava e viu-se mais longe do segundo lugar por ter optado por especular com as incidências da partida, tentando tirar a bola ao Benfica e esperar por algum golo fortuito. Teve dois, mas não conseguiu segurar as vantagens, deixando apenas a certeza de ser uma equipa muito bem trabalhada colectivamente, mas também com reduzidas opções de ataque.
Assisti, assim, a duas “derrotas” desportivas, mas a um enorme espectáculo, digno do primeiro mundo do futebol. Os benfiquistas sempre souberam montar uma festa e têm agora um palco que eleva para “outro patamar” o paradigma do futebol profissional em Portugal, vincando cada vez mais a “opção SAD” em detrimento da “tradição clube” e o “all in” de Rui Costa no sucesso do seu “joker”, o treinador Roger Schmidt, que é, na prática, o verdadeiro e único CEO, chefe executivo da operação nuclear.
Se a aposta de evolução do futebol é evidente, no clube nada do que foi prometido no processo pós-Vieira, dos estatutos à auditoria, passando pela promessa de liderança política desportiva nacional, surge na primeira linha, talvez nem na última, do plano de execuções da direção. O que decorre, naturalmente, de Rui Costa ter continuado rodeado dos “yesmen” do seu antecessor, confirmando que a mudança era apenas necessária para que tudo permanecesse igual e, ainda, sob o peso dos processos judiciais que já esmagaram o anterior presidente e ameaçam desabar nos próximos meses em cima deste estado de graça.
Ainda se sente um forte odor a vieirismo por ali, embora capaz de oferecer um jogo de futebol quase sem insultos idiotas entre as claques, quase sem pirotecnia imbecil, com mais de 62 mil pessoas entusiasmadas, com adeptos do Sporting junto de adeptos do Benfica, enfim, um espectáculo do primeiro mundo futebolístico, com dois campeões do Catar em campo, coisa nunca vista entre nós.
Talvez aquilo tudo não represente o futebol português, cheio de casos e casinhos e uma mentalidade passadista, talvez aquela felicidade e tranquilidade final de toda a gente fosse só a ilusão que encandeia e o frenesim electrizante do “barulho” de luzes e ecrãs, como quando saímos de um concerto de rock. Talvez. Mas não é esse o objectivo final e único dos espectáculos, de proporcionar prazer a quem assiste - sem ódio, frustração ou desespero?
Ontem voltei à bola e gostei."
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