sábado, 17 de novembro de 2018

“SINTO-ME A 100%”


FUTEBOL
“Trabalho e dedicação” são palavras de ordem para o avançado brasileiro continuar a marcar.
Depois de uma pré-época complicada, Jonas está de regresso aos relvados. A entrevista do avançado de 34 anos é ao jornal A Bola, de quem recebeu a Bola de Prata – a segunda que conquista em Portugal, depois de 2015/2016 – pelo registo dos 34 golos marcados na temporada passada, quando foi o melhor marcador do Campeonato Nacional.
Qual o significado deste prémio?
Significa muito. Significa muito trabalho e dedicação, muitas horas no centro de treinos. Significa cumprir aquele objetivo que tinha no início da época passada. Foi cumprido, com muito sacrifício e trabalho.
Qual dos dois troféus de melhor marcador lhe deu mais gozo conquistar? O primeiro, em 2015/16, ou o da temporada passada?
Acho que o da primeira vez. Ganhámos o Campeonato, fui o melhor jogador da Liga. Prémio é prémio. As duas Bolas de Prata são importantes para mim, mas, se tivesse de escolher, escolhia a primeira. Vamos sempre à procura do que não temos. Esta também tem importância, mas na primeira juntei esse gosto de ter sido campeão juntamente com o coletivo.
Quando Jonas vence a primeira Bola de Prata, marca 32 golos em 4x4x2. Na época passada, marcou 34, com uma forma de jogar diferente, em 4x3x3. O que é que mudou em si como jogador, como avançado?
Mudou mais o sistema em relação à equipa. A nível individual, não mudei muito. Estou sempre próximo do golo, perto da baliza para marcar. Jogar em 4x4x2, com dois avançados, temos de compor sem bola a meio-campo, ajudar na marcação. Com essa formação [4x3x3] talvez diminua um pouco o meu trabalho a nível defensivo. Há mais jogadores atrás, a meio-campo. É mais coletivo. A nível individual, os movimentos que tinha em 4x4x2 são os mesmos no 4x3x3. Tenho proximidade com o golo, mas os movimentos são os mesmos que vinha a fazer.

Teve necessidade de se adaptar ao 4x3x3 ou a integração foi fácil?
Houve adaptação, mas surpreendeu-me, foi rápida. Joguei a minha carreira quase toda a segundo avançado. Na época passada, depois de uma conversa com o nosso treinador, ele optou por colocar-me mais à frente. Deu-me mais liberdade, fiquei mais próximo do golo, para que as bolas chegassem mais pelas alas, além de chegarem pelo meio, com maior proximidade dos companheiros. Deixou bem claro para mim que gostaria que jogasse mais próximo da área. No 4x4x2 recuava mais para criar jogadas. Em 2015/2016, fiz muitas assistências, acho que foram 18, foi talvez a época em que fiz mais assistências. Na época passada não fiz tantas, estava no último terço do campo para rematar. Foi essa a liberdade que ele me deu e, naquele momento, acho que era importante. De certa forma fiquei muito grato.
Em algumas partidas, sente vontade de jogar com outro avançado ao lado?
Estou adaptado aos dois sistemas. Não é só por estar a jogar com um avançado, seja eu, o Seferovic, o Castillo ou o Ferreyra. Eu, particularmente, não me vejo sozinho ou a precisar de um companheiro. Inclusivamente, fiz mais golos nesta função do que propriamente com um outro companheiro. O que muda é o número das assistências, não as faço tanto porque não recuo muito, se descer no campo não fica ali ninguém. Na minha mente, posso baixar, querer ter a bola, mas aí o míster pega no meu pé nos treinos e até nos jogos. Diz-me para não descer tanto, porque já estamos a jogar numa formação para eu estar ali, para o último remate. Isso foi importante para mim. Adaptei-me rapidamente a isso.
Esta é a segunda Bola de Prata que conquista em Portugal, depois de 2015/2016. Vê-se a ganhar mais alguma?
Confesso que o objetivo de ser o melhor marcador do campeonato português estava na minha mente desde que aqui cheguei. Como disseram, já a conquistei duas vezes. Hoje talvez não fosse o meu primeiro objetivo. Nas épocas anteriores sim. Hoje, por já ter ganho e estar num momento diferente, não se torna numa prioridade para mim.
Tem alguma meta definida de golos para esta temporada?
Fiquei afastado por lesão no início da época. O meu objetivo agora é pensar jogo a jogo. Foi diferente das anteriores, onde na maioria, eu iniciei e terminei a jogar. Nas épocas em que conquistei este prémio foi a fazer isso, a começar e a terminar a jogar quase todos os jogos do Campeonato. Esta temporada está a ser diferente. Nós, os atacantes, temos sempre esse objetivo de marcar. Mas agora é ir jogo a jogo, só penso em fazer o meu melhor, marcar golos em cada jogo. Mais à frente, se estiver nessa lista, vou brigar, claro. Mas não é prioridade neste momento.
Recebeu o prémio de Jogador do Ano em 2017 e disse, na altura, que sentia pressão e que tinha de lutar por troféus individuais. Neste momento, está a desfrutar mais?
Tenho de desfrutar do meu momento. Em algumas temporadas anteriores, tive algumas lesões graves, não foram problemas musculares, foram lesões graves. Isso afeta o rendimento, ficamos de fora alguns jogos. Nesta temporada tenho objetivos mais curtos. O que passa na minha cabeça é isso.
Como viveu este início de temporada em que esteve para sair e numa fase também de lesão?
A temporada passada já acabou de forma estranha para mim: não jogava, voltei no último jogo com o Moreirense, ganhámos, mas senti ali um pouco a minha lesão. Mas queria jogar, era o último jogo, estava disponível, já no dérbi com o Sporting estava pronto. Queria ajudar de alguma forma nos últimos dois jogos. Fui para férias e a lesão não me deixou fazer o trabalho que conseguia fazer nas férias. Em termos de descanso foi bom, tive mais tempo. Em termos de trabalho que costumava fazer foi diferente. Limitava-me muito. Nesse período recebi uma proposta financeira estrondosa da Arábia Saudita. Sentei-me com a minha família e com o presidente e decidi que o melhor caminho era continuar por aqui e ficar aqui até terminar a minha carreira, como sempre tenho dito. Financeiramente não vou ter mais aquele contrato. Aqui tenho muito mais para além do nível financeiro. Isso foi conversado com os meus pais, os meus irmãos. Todos gostam e amam isto por aqui. Eu também. Numa conversa com o presidente, deixei bem claro que queria continuar aqui.
Antes dessa proposta da Arábia Saudita, Jonas teve também uma oferta da China.
Sim, já nem penso nisso. Tenho outros planos. Não é fácil cumprir coisas no futebol, há coisas no intervalo que mudam, não por questões nossas, mas por decisões de outras pessoas. Permanecer aqui foi a melhor coisa. Sinto cada vez mais no coração o que quero cumprir, que é terminar aqui.
Jonas está com 34 anos e tem mais ano e meio de contrato. Vê-se a jogar depois dos 36 anos, quando acabar este vínculo com o Benfica?
Não me vejo a jogar depois desse período, [36 anos] é uma idade fantástica para acabar ao mais alto nível. Passa pela minha mente cumprir o meu contrato e terminar aqui.
Foram quase seis meses sem jogar com a lesão. O problema está ultrapassado?
Hoje estou muito bem, sinto-me a cem por cento, sem dores. Mas todos sabem que tenho um problema que só vai passar quando parar de jogar a alto nível, como jogo no Benfica, e quando parar de me treinar. Até lá, faço o meu trabalho diário, de prevenção. Já fazia antes, mas agora aumentou por causa da coluna.
Como foi passar tanto tempo sem jogar?
Sofri demais! Nestes últimos meses em que não joguei, limitado pela minha coluna, fiquei um pouco triste. Depois, com o trabalho, no dia a dia, com o apoio dos meus colegas que fazem-me sentir em casa. Deram-me muita força para retomar aquele espírito, aquela alegria que costumo ter. Isso foi fundamental para retomar, aos poucos, aquela forma de jogo que quero.
O que mudou em si depois dessa experiência?
O que fizer agora, quero fazer bem. Tomara que sejam muitos [golos], mas se forem poucos, que sejam bem feitos. Isto é o que está mais claro na minha cabeça. Sinto a pressão de querer fazer o melhor, de cumprir os objetivos coletivos e individuais. Tenho essa pressão desde que cheguei aqui. Com o passar do tempo, as coisas vão acontecendo. A pressão aumenta, colocamos mais objetivos e metas. Sinto essa pressão em todos os jogos, de fazer o melhor. Ajudar a equipa a fazer golos, é a minha função, e acabar exausto com sentimento que fiz tudo, que vou para casa satisfeito com o meu rendimento.
Não marcar mexe consigo?
Muito. Mexe mesmo muito. Quando não marco um golo, até brincam comigo em casa. Dizem que o meu humor muda. Sempre coloco o coletivo primeiro. Se não marco, mas a equipa ganha...tranquilo. Agora, se for um empate ou uma derrota, aí é difícil. Fico triste no pós-jogo.
O que aconteceu neste último ciclo?
Foram resultados atípicos a que não estávamos habituados. Se não me engano, foram seis jogos: duas vitórias, um empate e três derrotas. O que mais pesou neste momento difícil foi o golo do Ajax, em Amesterdão. Deixou-nos muito tristes. O jogo seria para o empate. Pelo que o Benfica jogou, até tivemos ocasiões mais claras do que o adversário. Fizemos um belo jogo lá. Infelizmente, no último minuto, a bola bate num jogador nosso, desvia e entra. Deixou-nos muito em baixo. No balneário e a viagem de regresso foi muito triste. Com o Belenenses, pensámos em recuperar. Começámos bem, com ocasiões, aí houve o penálti... foram momentos em que não estávamos tão bem emocionalmente para encarar os próximos jogos depois daquele golo do Ajax. Nos jogos seguintes estávamos um pouco aéreos, não estávamos tão concentrados como deveríamos. Perdemos com o Belenenses e depois em casa com o Moreirense. Tivemos de despertar com o Ajax. Para mim, fizemos um bom jogo, mas não vencemos. Pelo que jogamos, o Ajax é uma equipa tão qualificada como a nossa. Voltámos a vencer o Tondela. O momento mais difícil foi aquele golo com o Ajax, sem dúvida.
Com estes últimos resultados surgiu alguma contestação dos adeptos.
É normal. Quando não se ganha numa equipa como o Benfica a cobrança vai sempre existir, quer pelos adeptos, quer da nossa parte. Queremos logo o próximo resultado para que a nuvem negra passe logo. É aqui e em qualquer lado. Têm o direito, são parte desta instituição, mas, ao mesmo tempo, reconhecem o trabalho do Rui Vitória e dos jogadores. Agora não há outra maneira do que voltar ao lugar onde estamos acostumados, aos primeiros lugares. Sabemos que será difícil, mas quando o período não é bom é normal que apareçam críticas ao treinador e aos jogadores. Também fomos criticados, é normal, faz parte do futebol.
No final do jogo com o Ajax, entendeu as declarações de Grimaldo?
Depois do jogo falei com o jornalista e disse que se jogássemos como jogámos com o Ajax, estaríamos mais perto das vitórias. Pela maneira como jogámos, talvez o Grimaldo pensasse que ninguém estava a pedir aplausos, mas a garra, entrega e luta que a equipa mostrou foi diferente dos outros jogos. Aí sim, temos de concordar com os adeptos. Ali não pedimos para aplaudirem, mas as vaias dos adeptos naquele jogo não foram legais. Foi essa ideia que ele [Grimaldo] tentou passar naquele momento específico.
O Benfica saiu do clássico com dois pontos à frente do FC Porto, agora está quatro atrás. Sente que há condições para dar a volta?
Sim, há vários exemplos disso no futebol. O FC Porto estava a dois, agora tem quatro. Podemos ser nós depois. Nas épocas em que fomos campeões estivemos a oito, sete ou quatro pontos. Este ano será até ao fim. E será mais emocionante. Outras equipas vão estar ali, não vão ser apenas os três. Acho que o SC Braga chega lá. Além de ter uma equipa boa e um bom treinador, só estão a jogar a nível nacional. Não viajam para o estrangeiro. Isso ajuda bastante. É mais uma equipa, será emocionante. É bom e fortalece o futebol português.
Como é chegar ao balneário e não ver Luisão?
É estranho! Sou amigo do Luisão, as nossas famílias estão sempre juntas fora de campo. Estou sempre em contacto com ele. A referência Luisão nos campos e no balneário não se ganha de um dia para o outro. Temos de ser sinceros em relação a isso, não existe mais. Outros jogadores vão assumir essa responsabilidade. Temos o Jardel, agora o primeiro capitão, que está há muitos anos aqui. Tem todas as condições para assumir esse papel. Perdemos um grande jogador, uma grande pessoa e um grande líder. Mas faz parte.
Foi apanhado de surpresa?
Eu, particularmente, não. Falava comigo, sempre me disse que era a última temporada dele. Estava muito desgastado física e mentalmente. Quando manifestou a vontade dele perante todos, elogiei a sabedoria dele em saber parar na hora certa. Jogou a alto nível e terminou num clube fantástico. Foi o momento para ele. Já o vi várias vezes depois. Estava contente. Fez de tudo para defender este clube e os companheiros dele.

á se imaginou a tomar a mesma decisão?
Imagino. Não podemos esconder esses momentos. É natural que, quando se chega a uma certa idade, tendo alguns problemas físicos, pensa-se nesse sentido. Não vou mentir. Já tenho pensado algumas coisas em relação ao meu futuro, mas agora só quero desfrutar. Sou o mais velho (risos)! Saiu o Luisão, o Eliseu, o Paulo Lopes, o Júlio César. Eram os mais antigos, agora sou o velhinho. A responsabilidade maior é de quem está aqui há mais anos, agora sou o mais velho. Gosto de passar tranquilidade aos mais jovens, sobretudo os do Seixal que chegam à equipa principal. Passo tranquilidade e confiança para eles, mas também aos que chegam do estrangeiro.
O que é que o jogador mais experiente do plantel diz a um miúdo de 17/18 anos que chega da formação para a equipa principal?
Primeiro, gosto de lhes dizer uma palavra-chave: humildade. E trabalho. Da mesma forma que vieram lá de baixo e chegaram aqui com humildade e trabalho, aqui têm de manter. Não há segredo. Nos treinos é passar tranquilidade, ensiná-los. O míster também ensina muita coisa. Com a nossa experiência, ensinamos posicionamentos em campo nos treinos e jogos. De resto, humildade e trabalho para serem grandes jogadores. Alguns são campeões europeus, já se fala deles desde os juvenis. Têm de provar agora na equipa principal. Aqui têm todas as condições, têm uma estrutura fantástica. Agora depende deles terem esse foco. Todos eles são bons garotos. Pela idade, fico pensativo, estão bem maduros para encarar este desafio para o que vem agora na carreira deles.
Tem alguma mágoa por não ter ido mais vezes à seleção brasileira?
Mágoa não. O que passou na minha cabeça era ter uma oportunidade naquele período até ao Mundial-2018. Queria chegar lá e mostrar o trabalho que estava a fazer no Benfica. Gostava de ter tido uma oportunidade para mostrar o meu trabalho. Mas não me tira o sono, estou bem tranquilo. Fiz o meu melhor.
Que idade gostaria de ter neste momento?
Gostaria de ter a idade que tenho. Tudo o que passou na minha vida foi intenso. Tem sido fantástico. Bons momentos, maus momentos, mas estou satisfeito com tudo o que já passei. Agora, é desfrutar até porque já estou no período final da minha carreira.

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