"O homem desportivo não se pode reduzir ao “homo ludens”, caro a Johan Huizinga (1938), para quem o jogo era uma acção livre e elemento motivador de cultura, a Guy Jacquin (1954), acérrimo investigador dos aspectos educativos do jogo, e a Roger Caillois (1958), que lançou as bases de uma sociologia a partir dos jogos. Segundo estes autores, a categoria de “prática desportiva” seria aplicada a uma realidade universal e invariável, fundada em disposições psicológicas e partilhadas por todas as culturas, que levariam o homem a se dedicar aos jogos e aos desportos desde que as necessidades de sobrevivência estivessem satisfeitas. Norbert Elias e Eric Dunning (1986) mostraram, de forma convincente, que é falso pretender que todas as sociedades conheceram um conjunto de práticas que se poderiam qualificar de desporto e que não podemos ligar os desportos contemporâneos, que a Inglaterra do século XVIII e sobretudo do XIX viu emergir, dos ancestrais directos e nos quais mergulhavam nas suas raízes. Com a introdução do constrangimento da regra permite-se organizar competições ao nível nacional e internacional, respeitando a igualdade de condições do confronto. A necessidade de fixar e garantir a boa aplicação desta regulamentação conduz à criação de estruturas administrativas (as federações nacionais e as instâncias internacionais). A “desportização” é o processo pelo qual os jogos tradicionais foram submetidos a pressões visando-os a se transformarem em desporto. O desporto tornou-se, assim, o novo terreno de confronto, pacífico e regulado, dos Estados. É a forma mais visível de mostrar a bandeira, de existir aos olhos dos outros e de estar presente no mapa do mundo. Quando a globalização parece apagar as identidades nacionais, o desporto torna-se o meio identificável, na esperança de uma vitória ou de uma proeza, de uma amplificação variável segundo os estatutos, as experiências históricas e as expectativas relativas. O desporto é, actualmente, mais do que o desporto. É uma manifestação das emoções, do prazer, das vibrações, dos momentos de desespero, de fraternidade, de partilha, da geopolítica, etc. É também o palco de muitas manifestações de racismo e de xenofobia."
quarta-feira, 4 de março de 2020
DESPORTO É MAIS DO QUE O DESPORTO
"O homem desportivo não se pode reduzir ao “homo ludens”, caro a Johan Huizinga (1938), para quem o jogo era uma acção livre e elemento motivador de cultura, a Guy Jacquin (1954), acérrimo investigador dos aspectos educativos do jogo, e a Roger Caillois (1958), que lançou as bases de uma sociologia a partir dos jogos. Segundo estes autores, a categoria de “prática desportiva” seria aplicada a uma realidade universal e invariável, fundada em disposições psicológicas e partilhadas por todas as culturas, que levariam o homem a se dedicar aos jogos e aos desportos desde que as necessidades de sobrevivência estivessem satisfeitas. Norbert Elias e Eric Dunning (1986) mostraram, de forma convincente, que é falso pretender que todas as sociedades conheceram um conjunto de práticas que se poderiam qualificar de desporto e que não podemos ligar os desportos contemporâneos, que a Inglaterra do século XVIII e sobretudo do XIX viu emergir, dos ancestrais directos e nos quais mergulhavam nas suas raízes. Com a introdução do constrangimento da regra permite-se organizar competições ao nível nacional e internacional, respeitando a igualdade de condições do confronto. A necessidade de fixar e garantir a boa aplicação desta regulamentação conduz à criação de estruturas administrativas (as federações nacionais e as instâncias internacionais). A “desportização” é o processo pelo qual os jogos tradicionais foram submetidos a pressões visando-os a se transformarem em desporto. O desporto tornou-se, assim, o novo terreno de confronto, pacífico e regulado, dos Estados. É a forma mais visível de mostrar a bandeira, de existir aos olhos dos outros e de estar presente no mapa do mundo. Quando a globalização parece apagar as identidades nacionais, o desporto torna-se o meio identificável, na esperança de uma vitória ou de uma proeza, de uma amplificação variável segundo os estatutos, as experiências históricas e as expectativas relativas. O desporto é, actualmente, mais do que o desporto. É uma manifestação das emoções, do prazer, das vibrações, dos momentos de desespero, de fraternidade, de partilha, da geopolítica, etc. É também o palco de muitas manifestações de racismo e de xenofobia."
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