"Entre as épocas de 2013/2014 e 2018/2019, o Benfica juntou a liderança desportiva no futebol nacional, a uma aceitável performance económica. Venceu cinco Ligas e obteve um 2º lugar, domínio que coincidiu com resultados económicos sempre positivos, acumulando nesse período 131M de euros de lucro.
Em 2020/2021 deu-se uma queda abrupta, um 3º lugar na Liga, a nove pontos do vencedor e, no exercício económico, prejuízos avultados de 34M de euros. A gestão do clube não foi capaz de reduzir os custos operacionais, de molde a enfrentar a quebra de rendimentos, causada pela pandemia.
Entre 2021/2022 e 2023/2024, com a atual Direção, o desempenho do futebol foi insuficiente (apenas uma Liga em três épocas) e, na óptica dos resultados económicos, acumularam-se 71M de euros de prejuízos, dos quais 31M em 2023/2024.
No universo empresarial, a função de dirigente desportivo é talvez a única em que é possível acumular-se prejuízos sucessivos e passar-se razoavelmente despercebido.
Na época em curso, após o arranque medíocre que levou, finalmente, à saída de Schmidt, Bruno Lage, com muito mérito, recuperou a equipa oferecendo a perspetiva de ainda se alcançar o triunfo na Liga.
Contudo, o Benfica necessita não apenas de dominar as competições nacionais, mas também de ser competitivo na Liga dos Campeões. Neste plano, Bruno Lage foi amplamente criticado, sobretudo após a derrota na Alemanha, frente ao Bayern de Munique. Não tenho a fineza de análise de outros benfiquistas, igualmente não ligados profissionalmente à área do futebol, que depois dos acontecimentos, têm a perspicácia de identificar as táticas e planos de jogo alternativos e a distinta composição do onze titular, que o treinador, que decidiu a priori das ocorrências, supostamente deveria ter utilizado.
Mas a meditação sobre a fraqueza histórica do treinador profissional de futebol faz parte da riqueza intelectual destes comentários, que se repetem ao longo do tempo, contemplando sucessivos treinadores.
Na Liga dos Campeões, sem retirar valor aos enérgicos comentários críticos transversais ao "futebolês", para se ser competitivo, de uma forma constante, não parece suficiente focar-se na equipa de campo ou na figura do treinador. A competitividade tem de ser gerada a partir das Direções dos clubes.
Nas últimas cinco edições, das 20 vagas de semifinalistas, apenas duas (10%) foram ocupadas por equipas "atípicas". Os recursos financeiros não asseguram o êxito supremo (exemplo do PSG, com três meias-finais nesse período, mas sem nenhuma vitória), mas o sucesso constante não se se assegura sem recursos financeiros. Num jogo avulso, como na excelente vitória do Benfica frente ao poderoso Atlético de Madrid, tudo é possível. No conjunto dos jogos, cinco anos das últimas edições, dizem-nos que em 90% dos casos, quem tem músculo financeiro é quem alcança o top-4 da Europa.
Esta é a outra Liga dos Campeões, que não se joga no campo, mas sim na qualidade e eficiência da gestão dos dirigentes. Nessa Liga, o Bayern de Munique alcançou em 2023, 419M de euros de receitas das atividades comerciais, dos quais 264M de patrocínios. O Barcelona, outro rival na Champions atual, obteve em 2023/24, 370M de dólares apenas em patrocínios. Recentemente, fechou um contrato de Naming do seu estádio por 70M anuais (Spotify). Há quantos anos está o Benfica à procura de uma parceria deste tipo? Há apenas uns dias Joan Laporta, Presidente do Barça, fechou um contrato com a Nike de 127M de euros anuais e um bónus de assinatura de 158M. O valor total do contrato de longa duração é de 1700M de euros.
Segundo o Relatório e Contas, o futebol do Benfica encaixou em 2023/2024, 22M de euros de patrocínios, 12 vezes menos que o Bayern de Munique e cerca de 15 vezes menos que o Barça. Estas diferenças abismais, não podem ser apenas explicadas pela habitual remissão para a escassa dimensão nacional. Espanha tem uma economia de cerca de 35% da economia alemã. Contudo, tanto o Real Madrid (+13%), como o Barcelona (+69%) superaram o Bayern no total dos seus rendimentos operacionais em 2022/2023. O fator critico decisivo, pois, tem que ver com a eficiência da gestão empresarial dos clubes.
Após a recente grande vitória sobre o FCP, os dirigentes do Benfica, simpaticamente, anunciaram que, jogando a equipa sempre com o mesmo empenho, será possível ganhar todos os jogos no futuro.
Porém, talvez mais importante que dissertar sobre metas irrealistas, seja fazer um avanço significativo e constante na recuperação do diferencial de receitas, sobre as quais assenta hoje a dominância dos nossos rivais atuais, Bayern, Barça e Juventus, e de outros colossos europeus. Basta consultar o Relatório e Contas do Barcelona 2022/2023 para encontrar uma vasta panóplia de atividades geradoras de receitas, incluindo inovadoras iniciativas no digital.
Isso amenizaria a tentação mercantilista em que assenta o atual modelo de negócio do Benfica: a venda anual do melhor jogador da época. Um ano, Ramos, depois Neves, amanhã Tomás Araújo. Com o correspondente empobrecimento desportivo do plantel e a instabilidade da equipa-base.
Não é pois apenas, nem principalmente, Bruno Lage, que deve estar em avaliação na Liga de Campeões.
Esta Champions oculta, distante da atenção mediática, determinará, no horizonte dos próximos anos, o sucesso da Champions desportiva. Nesta outra Liga de Campeões, que se disputa no terreno da competência da atuação empresarial, estamos hoje em situação precária, longe da norma de efetividade do topo europeu, como se viu nos indicadores acima. Cada função tem a sua Liga dos Campeões para enfrentar e, no final, todos, treinador e dirigentes, cada um no momento apropriado, deverão ser avaliados pelos resultados que alcançaram e pelo legado que deixaram."
Nuno Paiva Brandão, in Record
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