Foi de longe o jogo mais complicado para o Benfica na presente temporada. Por deficiências próprias, mas sobretudo pelo mérito dos donos da casa, que leram bem a partida e colocaram muitas pedras na engrenagem encarnada. Se acabasse em empate, a equipa de Lage não teria nada de que se queixar.
Sim, o Benfica fez esta época quatro jogos oficiais, ganhou sempre, nunca sofreu golos, conquistou um troféu, apurou-se para o play-off da fase regular da Champions, e entrou a ganhar na Liga. Mas como cada jogo tem a sua própria história, a que foi escrita na Reboleira, pode dizer-se, teve um final feliz para os encarnados, que suaram, provavelmente aquilo que não esperavam, para levar os três pontos para a Luz. Ou seja, em casa do Estrela, foi o Benfica a ter a estrelinha que lhe permitiu ganhar um jogo que teve tudo para acabar empatado. E porquê, pode perguntar-se, não só atendendo à diferença de cilindrada entre as equipas, mas também recordando os triunfos concludentes nos três duelos anteriores?
Essencialmente porque o Estrela (e nesse particular o mau estado do relvado beneficiou a equipa da casa), começou por não deixar jogar o Benfica através da colocação de dois pontas-de-lança, daqueles que vão a todas e correm até caírem para o lado (foi o que aconteceu, em sentido figurado, é claro, com Godoy e Gastão, que seriam substituídos aos 64 minutos por outro par do mesmo calibre, formado por Stoica e Kikas), foi pressionante, com três unidades, sobre quem costuma pautar o jogo encarnado – Richard Ríos e Barrenechea – e com tudo isto secaram os pontas-de-lança do Benfica, que se viram quase sempre mal municiados.
Foi bem pensada a estratégia de José Faria, e esteve muito perto de dar frutos, até porque, também, do ponto de vista individual os encarnados tiveram algumas unidades em sub-rendimento (e isso não terá a ver, creio, com a proximidade do jogo com o Fenerbahçe).
A pedir correção
Por exemplo, Dedic, que se vê à légua que tem qualidades, foi muito inconsequente e indisciplinado do ponto de vista tático, e demasiadas vezes, por querer insistir no jogo interior (que não é a sua praia), foi pisar terrenos onde já estavam companheiros seus, e mais do que ajudar, atrapalhou. E para piorar o cenário do lado direito (caramba, Aursnes não chega para tudo, apenas para quase tudo...) algumas subidas a despropósito de Dedic desguarneceram defensivamente o flanco, fragilidade que foi bem aproveitada pelo Estrela da Amadora, essencialmente por Fábio Ronaldo e Jovane Cabral.
Mas não foram só as deficiências de integração no conjunto de Dedic (mais camufladas nos jogos anteriores), que criaram problemas sistémicos ao Benfica: Richad Ríos, desconfortável com a velocidade do jogo, o mau estado da relva e a agressividade dos adversários, quase nunca foi o elo de ligação da equipa com Ivanovic e Pavlidis, que devia ser. Essa circunstância penalizou mais o croata, que teve menos bola e acabou por, generosamente, se dar a tarefas defensivas que foram importantes para a sua equipa.
É verdade que Ivanovic podia ter arrumado as dúvidas ao minuto 80, quando rematou, com muita classe, para golo, e viu Renan Ribeiro realizar uma parada impossível e enviar a bola para canto. Mas não é menos verdade que o Estrela da Amadora, depois de Pavlidis, dos onze metros, ter colocado o Benfica na frente (curiosamente coincidindo com um quarto de hora inicial da segunda parte em que os tricolores foram melhores do que os encarnados), tiveram soberanas hipóteses de empatar, por exemplo ao minuto 90+1 quando uma displicência de António Silva (única nódoa numa boa exibição) acabou com Kikas isolado em frente a Trubin e a rematar por cima; ou no minuto 90+5, num livre de Rodrigo Pinho que ia provocando uma apoplexia em quem estava no banco do Benfica.
Primeira parte dividida
Do desconforto tático do Benfica na primeira parte, já aqui se falou. E não foi por acaso que a primeira grande sensação de golo do encontro pertenceu ao Estrela, aos 24 minutos, quando de um lance de laboratório entre os Cabrais (Jovane e Lopes) nasceu um cruzamento da esquerda que Chernev desperdiçou incrivelmente muito perto do risco fatal. E se logo a seguir (24) Dahl rematou com perigo e (27) Pavlidis, de calcanhar, esteve muito perto de marcar, a resposta por Gastão, com um remate cruzado com selo de golo (38), foi sustido por uma magnífica intervenção de Trubin. A primeira metade não terminaria sem o Benfica voltar a cheirar o golo, após um trabalho da coneção norueguesa, com Aursnes a colocar a bola em Schjelderup, a quem Luan, in extremis, tirou o pão da boca.
Lage, de novo, pragmático
Em vantagem a partir da hora de jogo (antes, aos 55 minutos, uma fífia de Trubin, após um livre de Lopes Cabral, redundou numa perdida escandalosa de Godoy, que não devia passar no VAR) e já depois de José Faria ter mudado a dupla de avançados, é que Bruno Lage refrescou a esquerda do ataque (Schjelderup, o elo mais fraco, por Prestianni, 70 minutos), vendo a seguir o Estrela dar poder à meia-distância, com Rodrigo Pinho (74) e mais fulgor às alas com Resende, e ao meio campo, com Meireles (82). Só aos 87 minutos é que entraram, tipo trancas à porta, Barreiro e Florentino, saindo Ivanovic e Berrenechea (quando era Ríos quem denotava menos fulgor...). E só mesmo aos 90+3, porque a isso foi obrigado, tirou o colombiano (atordoado por um choque de cabeças) e Pavlidis, para as entradas de Tiago Gouveia e Henrique Araújo. Foi com um suspiro de alívio que os benfiquistas ouviram o apito final, e celebraram três pontos, numa noite em que a equipa da Luz foi posta à prova como nem Sporting nem Nice tinham feito.
NOTAS DOS JOGADORES DO BENFICA:
Só de penálti uma águia tão cinzenta e sem ideias podia chegar ao golo. Dahl foi dos poucos que quiseram quebrar a monotonia e Enzo é aposta ganha. Médio contratado ao Palmeiras teve exibição para esquecer (ou lembrar-se para não repetir).
O MELHOR EM CAMPO - DAHL (7)
Perante tamanha inércia lá na frente, Dahl tentou mostrar como se faz. Aos 12', teve o primeiro remate perigoso do jogo e aos 17' repetiu a receita, em novo disparo de pé esquerdo, de fora da área, a rasar o poste. É dele o cruzamento que dá origem à grande penalidade com que o Benfica ganhou o jogo e, depois disso (76'), ainda voltou a ter boa incursão pelo lado esquerdo, acionando o cruzamento que terminou num remate frouxo de Ríos. Se a qualidade a atacar e o pé esquerdo preciso já lhe tinham sido reconhecidos na época passada, está agora a mostrar evolução no momento defensivo, apesar de Lopes Cabral lhe ter oferecido trabalho de sobra por aquele lado. Ainda não tem a influência de Carreras, claro, mas, neste momento, o lugar é dele e Obrador vai ter de 'dar ao pedal'.
5 TRUBIN — Aos 38', quando o Estrela mandava no jogo e encostava o Benfica às cordas, impediu um golo monumental a Gastão, voando para assinar uma grande defesa para canto. Na segunda parte (55') não teve a melhor abordagem a um livre direto batido por Lopes Cabral, deixando a bola à mercê de Godoy, que cabeceou ao lado.
5 DEDIC — É um lateral fisicamente vistoso, potente, de arranque fácil, mas ainda procura o melhor entendimento com Aursnes. O norueguês não é um jogador de linha, pelo que terá de ser mais expedito no momento atacante para que a águia consiga criar problemas pelo lado direito.
5 ANTÓNIO SILVA — Fez um jogo em crescendo e mostra-se cada vez mais à vontade com bola , mas ia borrando a pintura numa exibição consistente aos 90+1', quando quis sair a jogar de peito e entregou a bola ao Estrela. Valeu-lhe o desacerto de Kikas, incomodado por Otamendi, na cara de Trubin, rematando por cima.
6 OTAMENDI — A renovação de contrato foi dividindo os adeptos na época passada, mas o argentino vai dando provas de que a idade parece não passar por ele e continua com o sentido posicional e capacidade física intocáveis. Amarelado aos 53' por protestos.
5 AURSNES — Entrou algo desconcentrado, o que nele é muito pouco habitual, e a facilitar, acumulando alguns erros no passe, mas depois foi acertando o passo. A ligação que tão bem resultou com Schjelderup frente ao Nice voltou a quase dar frutos aos 43', quando fez um passe primoroso para o compatriota, que acabou por perder o lance em boa posição na área.
6 ENZO— Ainda procura os melhores índices físicos, mas é um enorme upgrade em relação à época passada na 1.ª fase de construção, já que tem no passe médio e longo uma das melhores valências. Aos 31', adornou em demasia quando podia ter visado a baliza, mas perdeu o timing do remate.
4 RÍOS — Se Enzo ainda não está no ponto fisicamente, o reforço mais caro da história do Benfica já traz meia época de Palmeiras nas pernas, pelo que essa questão fica posta de parte. Na primeira parte acumulou erros, com passes fáceis falhados e perdas de bola pouco aceitáveis para um jogador que custou 27 milhões de euros. Em Portugal não se joga no mesmo ritmo do Brasil e terá de perceber que não pode adornar tanto os lances, porque vai sempre ser castigado. Aos 79', tentou a sorte de livre direto... que não passou da barreira.
4 SCHJELDERUP — Brilhou contra o Nice, ontem nem se deu por ele e não teve rasgo. Perdeu boa chance aos 43', permitindo o corte a Luan, e, sem surpresa, foi o primeiro a ser substituído.
6 IVANOVIC — Ainda à procura do melhor entendimento com Pavlidis, o croata tem pisado zonas demasiado baixas no terreno para o que as caraterísticas dele pedem. Ainda assim, remou contra o bocejo que foi a águia ofensivamente, sofreu o penálti e teve o golo nos pés aos 80', negado por uma enorme intervenção de Renan Ribeiro.
5 PAVLIDIS — Só fica ligado à história do jogo por ter sido dele o golo que resolveu o jogo, depois de na primeira parte (27') ter falhado de calcanhar à boca da baliza após um primeiro remate de Aursnes.
5 PRESTIANNI — Contra um Nice já nas lonas teve tempo e espaço para mostrar a inegável qualidade técnica que tem. Entrou em momento difícil no jogo e parece não estar confortável a extremo esquerdo no novo 4-4-2 de Lage.
— FLORENTINO— Tampão defensivo para os últimos minutos
— BARREIRO — Para fechar ao lado de Florentino o último forcing do Estrela.
5 HENRIQUE ARAÚJO — Em dois minutos ainda tentou a sorte, num remate cruzado de pé esquerdo.
José Manuel Delgado, in a Bola



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