Mourinho foi tocado pelas estrelas. Quem o disse, na véspera do jogo, foi Sylaidopoulos, treinador do Rio Ave. E a sequência de toques das mais variadas estrelas sobre o técnico do Benfica, sobretudo do Sol, a estrela central do sistema solar, parecia destinada a continuar.
A águia de Mou, depois de um primeiro tempo muito pálido, arrancava uma segunda parte bem menos cinzenta. Lutou, correu, dominou e, já perto do fim, marcou por Sudakov. Era, finalmente, o golo da tranquilidade. O golo que confirmava que o setubalense continuava a ser tocado pelas estrelas mais resplandecentes.
Porém, todos os que são bafejados pelas estrelas estão também sujeitos às suas sombras. E o monumental remate de André Luiz, que deu o empate ao Rio Ave aos 90+1, colocou um véu sobre a figura de José Mourinho. Talvez o Benfica não merecesse perder. Aliás, no chamado ‘jogo jogado’, os encarnados mereciam os três pontos. Mas o futebol, frio e implacável, é simples: vence quem marca mais, como lembraria La Palisse. Assim, o Rio Ave regressa a casa com um justo ponto no bolso.
O início foi insólito, até antes do apito inicial: em campo, 22 jogadores e apenas um português, António Silva, acompanhados por mais 14 nacionalidades: ucranianos, bósnios, argentinos, suecos, noruegueses, colombianos, croatas, polacos, ingleses, checos, gregos, costa-riquenhos, alemães e espanhóis. Um retrato do futebol global.
Mourinho repetiu o onze que vencera o Aves SAD (3-0), enquanto Sylaidopoulos trocou cinco jogadores em relação ao jogo com o FC Porto (0-3), incluindo a estrela Clayton Silva, que começara a temporada com cinco golos em cinco jogos, mas chegava a esta partida em branco nos últimos dois.
Sem extremos, o Benfica sentiu enormes dificuldades na primeira parte para se aproximar da baliza vilacondense. O Rio Ave defendia num sólido 5x4x1, fechando os espaços de entrada aos médios encarnados. Sudakov tentava fugir ao ‘4x4x2 flat’, como Mourinho descreveu, recuando para procurar bola, mas invariavelmente tinha marcação cerrada. O cenário lembrava os primeiros 45 minutos frente ao Aves: sem ocasiões claras, sem pressão real sobre a defesa contrária e com muita posse estéril no meio-campo.
A equipa de Sylaidopoulos defendia com segurança e, quando tinha bola, desdobrava-se rápido, chegando perto de Trubin. O primeiro sinal de perigo até foi do Rio Ave: remate de Spikic, desviado por Aursnes, acabou fraco nas mãos do guarda-redes. O Benfica respondeu com um remate de Ríos muito por cima e, pouco depois, Pavlidis viu Petrasso cortar um lance promissor. Já perto do intervalo, após longa troca de passes, Aursnes atirou cruzado e ao lado.
Mourinho e Sylaidopoulos mantiveram os onzes após o descanso. O jogo continuava preso, previsível, até que, de repente, alguns jogadores do Benfica — António Silva, Pavlidis, Sudakov — pareciam também tocados pelas estrelas, iniciando uma mini-avalancha ofensiva. António Silva cruzou para Pavlidis, mas Miszta defendeu seguro.
O relógio avançava e o golo não surgia. Mourinho parecia prestes a lançar Lukebakio, mas foi o técnico do Rio Ave a mexer primeiro: Clayton e André Luiz entraram aos 60’. Logo depois, Pavlidis (ou António Silva) marcou, a Luz festejou, mas o VAR anulou por pisadela de Otamendi sobre Vroussay.
Este futebol não é para gente séria

Mourinho arriscou então: Ivanovic e Dahl deram lugar a Lukebakio e Schjelderup. Aursnes recuou para lateral-esquerdo, Schjelderup ocupou a esquerda e Lukebakio a direita. O belga teve grande oportunidade, mas o chapéu saiu curto. O Benfica cresceu. Ríos, servido por Lukebakio, quase marcou. A pressão aumentava, mas o Rio Ave não deixava de espreitar o contra-ataque. Até que, finalmente, Lukebakio cruzou atrasado, Sudakov rematou, a bola desviou em Petrasso e entrou: 1-0.
Mourinho decidiu reforçar o meio-campo com Barreiro para segurar a vantagem mínima. Mas aos 90+1, André Luiz fugiu pela esquerda e, rodeado de defesas encarnados, decidiu-se por um pontapé colossal: a bola só parou no fundo da baliza de Trubin:1-1.
Ainda houve tempo para Mourinho tentar o golpe de asa, lançando Henrique Araújo para o lugar de Ríos, mas já nada mudou. Na estreia de Mourinho na Luz, nem as estrelas nem as suas sombras evitaram o empate.
Rogério Azevedo, in a BOLA
DESTAQUES DO BENFICA
Figura do Benfica: Lukebakio (6)
O extremo internacional belga entrou aos 65 minutos e mostrou argumentos logo na primeira vez que tocou na bola: grande receção, movimento para o meio e remate que saiu tresloucado, sem a direção da baliza. Lukebakio vem de lesão e jogou pela primeira vez pelo Benfica, não terá seguramente a melhor condição, mas em quase todos os lances que teve colocou qualidade, capacidade para mudar o jogo da equipa e dar-lhe mais e melhores soluções. Aos 69' quase fez golo e a entrar pelo flanco esquerdo, mas o chapéu ao guarda-redes ficou curto; aos 72' quase ofereceu o golo a Richard Ríos com um cruzamento muito perigoso e intencional; aos 86' arrancou, ganhou o flanco direito e cruzou com inteligência para o golo de Sudakov.
TRUBIN (5) - Sem trabalho ou possibilidade de se mostrar durante o jogo inteiro. Concentrado. Mas sem asas para parar o remate do golo de André Luiz.
DEDIC (5) – Com muita vontade e iniciativas a queimar linhas para esticar a equipa, mas nem sempre com discernimento suficiente. Conseguiu agitar o flanco direito, a espaços, mas foi principalmente a defender que se destacou, sobretudo num grande corte, aos 50’, a negar a Aguilera um lance de golo iminente.
ANTÓNIO SILVA (6) – Resolveu com segurança vários lances de atrevimento do adversário e colocou qualidade na condução de bola, assumindo a responsabilidade de passes muito bons. Aos 55’ fez um grande cruzamento para Pavlidis rematar de cabeça. Aos 60’ esteve no lance do golo anulado ao Benfica.
OTAMENDI (6) – Intratável a tapar caminho ao ataque do Rio Ave e sempre a empurrar a equipa para a frente. Aos 60’ ganhou lance no qual o Benfica marcou golo, mas anulado por falta do central argentino.
DAHL (4) – Competente a defender, quis dar profundidade na ala esquerda, mas faltou-lhe qualidade nos cruzamentos e decidiu mal em vários lances prometedores. Teve espaço (e foi dos poucos na primeira parte) para fazer mais e melhor. Aos 26’ fez um bom passe a que Sudakov, com espaço no centro da área, não deu boa sequência.
AURSNES (4) – Equilibrado, mas sem capacidade para desiquilíbrio no flanco direito. Bom remate aos 45+4’, mas ao lado do poste. Com a saída de Dahl passou para lateral-esquerdo, mas pareceu cansado e, pese embora haja mais mérito de André Luiz do que demérito do nórdico, Aursnes concedeu muito espaço ao avançado para rematar para golo do Rio Ave.
RICHARD RÍOS (4) - Muita amplitude defensiva em todo o campo e agressividade, menos no lance do golo do Rio Ave. Também mostrou pouca arte para fazer crescer a equipa quando teve a bola nos pés. Demasiados passes errados, um remate tresloucado por cima da trave e milésimos de segundo atrasado para fazer golo ao segundo poste, aos 72’.
BARRENECHEA (5) – Não colocou muita velocidade no campo e no jogo, mas ocupou bem os espaços defensivos e foi dos mais eficazes a sair na pressão à saída de bola do Rio Ave. Aos 69’ fez grande passe que deixou Lukebakio na cara do golo. Menos fresco, permitiu mais espaço ao Rio Ave na reta final do jogo e não ficou bem na fotografia do golo do Rio Ave, esteve a frente a frente com o homem que fez o passe para André Luiz correr e empatar.
SUDAKOV (6) – Sempre a pedir bola, a querer assumir a organização do jogo ofensivo e com passes diferenciados, mas neste jogo passou demasiado tempo ausente e talvez muito longe das zonas de finalização. Quando se aproximou, marcou um bom golo.
PAVLIDIS (5) – Pressionou muito, deu muito trabalho à defesa e tentou encontrar espaço num labirinto de pernas para rematar à baliza, mas faltou inspiração ao ponta de lança. Poderia ter rematado melhor de cabeça num cruzamento de António Silva e surgiu, veloz, a confirmar a bola dentro da baliza, aos 60’, num lance invalidado por falta de Otamendi.
IVANOVIC (5) – Foram dele os lances de maior agressividade durante a primeira parte, pelo flanco esquerdo, mas faltou-lhe um pouco mais de qualidade na definição para ser feliz nas boas intenções.
SUPLENTES
SCHJELDERUP (5) – Trouxe versatilidade e maior criatividade à ala esquerda, com drible e cruzamento, mas ainda assim um pouco inconsequente.
LEANDRO BARREIRO (4) - Sem tempo para muito, mas repartiu responsabilidade a meio-campo, sob a esquerda, no espaço e tempo concedido ao Rio Ave para lançar o golo do empate.
HENRIQUE ARAÚJO (-) - Sem tempo, sem bola.
Nélson Feiteirona, in a Bola



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