Barbosa, simplesmente. Para ser Gabigol compete-lhe fazer em Portugal o que não foi capaz em Itália num ano: marcar golos.
O empréstimo de Gabriel Barbosa parece uma daquelas oportunidades que só acontecem uma vez. Ao Benfica apenas cabe despender uma verba de 500 mil euros pela cedência temporária e com direito de opção de compra, ficando o Inter de Milão responsável pelo pagamento do chorudo vencimento de 3,5 milhões.
Diz o povo que quando a esmola é grande até o pobre desconfia, mas, tratando-se de um dos talentos emergentes da selecção brasileira que venceu o torneio olímpico em 2016, a par de outro Gabriel, o Jesus, e de Neymar, a estrela da companhia, não se vislumbra razão para duvidar do sucesso da operação.
Gabriel Barbosa, com o potencial que lhe reconhecem, é um jogador interessante e uma boa opção, apesar de a história recente apontar em sentido contrário e aconselhar algumas reservas. Falhou o salto para a fase adulta e respondeu mal à transição para a Europa e para um grande clube, adquirindo logo todos os tiques de artista convencido que de repente se vê a nadar em dinheiro apenas pelo que promete, ainda por cima acompanhado por uma corte de servidores, desde segurança a fisioterapeuta particulares, o que suscita natural desconfiança.
Vai começar agora a etapa da confirmação na sua carreira de profissional de excelência, ainda por cumprir também pela má sorte de ter sido aliciado por um Inter na altura envolto em problemas e sem paciência para lhe dispensar a atenção indispensável a uma integração adequada. Atenção essa que, seguramente, vai encontrar no Benfica, o que representa um passo em frente.
Acerca do investimento no avançado brasileiro coloco-me na posição do adepto comum, expectante e curioso. No entanto, até para desincentivar entusiasmos precipitados, há uma interrogação que se impõe: Gabi quê? Barbosa, simplesmente. Para credibilizar o epíteto trazido do Brasil, Gabigol, ou goleador, compete-lhe fazer em meia dúzia de meses em Portugal e que não foi capaz em Itália durante um ano: marcar golos, de preferência muitos. Uma provocação aliciante que o deve motivar.
Na edição de ontem de A Bola, Oswaldo Oliveira, treinador de 66 anos, com mais de 30 de carreira, uma espécie de senador do futebol brasileiro, como é identificado pelo jornalista Rui Miguel Melo, e que ajudou a crescer Gabriel Barbosa como jogador, vê nele «o avançado que o Benfica precisa» porque tem talento, é rápido e vai corresponder às expectativas.
Considera que saiu cedo para a Europa e que o Benfica pode ajudá-lo, na medida em que ele e Jonas «podem fazer uma dupla muito boa, uma combinação de estilos que se podem complementar muito bem». Informa ainda ter usado Gabriel Barbosa no lado direito e «atrás do atacante, a segundo avançado».
Opinião a registar, sobretudo vinda de quem já chegou a uma fase da vida em que diz o que a consciência lhe determina e não o que lhe podem para dizer.
Foi com surpresa que li a notícia da exclusão de Krovinovic da lista do Benfica para a Liga dos Campeões. Surpresa por admitir que se via nele uma alternativa séria ao deficitário meio-campo. Ficou de fora em função das cotas estabelecidas pela UEFA, mas, em contrapartida, entraram Rúben Dias, Diogo Gonçalves e João Carvalho, como praticantes formados localmente (no clube e no país).
Não é mau. Colide até com o típico conservadorismo luso, em nome das inatingíveis questões tácticas, geralmente avesso a jovens que lutam pelo seu espaço. Repare-se no exemplo de Leonardo Jardim, um treinador muito à frente e que surpreendeu no Mónaco com uma base de jovens maravilhosos, por ele construída de raiz, e, à época, formada, entre outros, por Fabinho (23 anos), Bakayoko (22), Bernardo Silva (22), Lemar (21) e Mbappé (18), mais o lateral Mendy (22). Os monegascos eliminaram Manchester City e Borussia Dortmund.. Só foram parados pela poderosa Juventus nas meias-finais.
De entre os nossos mestres quem se atreveria a tamanha empreitada? Se calhar ninguém, por falta de ousadia ou de conhecimento, embora não ficasse mal perguntarem a Leonardo Jardim como chegou tão alto em três anos somente.
O argumento da experiência, e não da qualidade, note-se, pois são coisas diferentes, tal como a maioria dos treinadores portugueses e esgrime, permite iluminar carreiras de futebolistas na sua fase descendente, comissionar agentes e avolumar o endividamento dos clubes porque, regra geral, não tem futuro. É utilizado para consumo na hora e deitar fora.
Um campeonato não se ganha com miúdos imaturos, proclamam. E, provavelmente, também não se ganha com treinadores que ficam imobilizados no tempo em que o táctico valia muito e o humano contava pouco.
Razão tem o presidente do Benfica, para quem a formação é a prioridade e dela só quer desviar-se em situações muito concretas e devidamente ponderadas. Luís Filipe Vieira conhece o caminho. É no centro de treinos do Seixal que tudo começa, sendo certo que ninguém de boa fé exige campeões em um ano ou em dois, mas deve exigir que não se desaproveite nem mais um dia."
Fernando Guerra, in A Bola
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