segunda-feira, 25 de setembro de 2017

TENS RAZÃO RUI, NÃO É ASSIM TÃO ELEMENTAR


"Nas últimas semanas as razões apontadas para os maus resultados do Benfica foram muitas, e versaram sobre quase tudo. Razões mais profundas ou mais ligeiras, sobre factos ou pressupostos, e muitos ângulos foram abordados. Mais do que criticá-las ou validá-las, uma vez que falta-nos sempre a informação que só quem está dentro a possui, vale a pena considerar dois pontos fundamentais do actual momento do Benfica e das razões que foram enumeradas:
1. Provavelmente, muitas das razões estarão incompletas, mais do que certas ou erradas;
2. O erro maior passa por analisá-las de modo isolado e não holístico.
Ou seja, pense comigo!
Treinar uma equipa implica dominar as competências do jogo, do treino, da competição, das relações humanas e interpessoais, da comunicação e motivação, bem como possuir um bom autoconhecimento.
A juntar a isto, é importante perceber que este domínio acontece em contextos que se alteram com regularidade, seja naquilo que depende do treinador ou da equipa, ou ainda naquilo que não depende deles.
Lembre-se também que as equipas possuem processos e dinâmicas próprios e que muitas vezes, o que parece não é. As equipas não são as acções ou números estatísticos que produzem, mas a sua relação com os mesmos.
Finalmente, encontramos nas equipas desportivas algo que não acontece, por exemplo, nas equipas organizacionais. Não basta estar preparado para competir, ter quadros bem formados ou estratégias bem preparadas. No desporto, a competição acontece em tempo real, frente a frente, em que pontos fortes se anulam e pontos fracos podem ganhar preponderância.
Posto isto, caro Rui Vitória (ou outro treinador qualquer), acredito que a grande maioria das pessoas não junte as peças todas do puzzle demasiado grande que é liderar uma equipa, ainda mais porque nos falta informação interna. Isto não quer dizer que tudo o que está a ser feito esteja correto, mas a maioria compara simplesmente o Ederson ao Júlio César ou ao Varela e não equaciona o facto de a velocidade do hoje guarda-redes do Manchester City permitir ainda que a defesa jogue mais subida. Analisar de forma redutora que Nelson Semedo é melhor que qualquer outro defesa direito que esteja no Benfica não deveria ser apenas de falar de atacar ou defender melhor, mas também do que mexe, quase como se de uma concertina se tratasse, em que se estica ou encolhe os outros jogadores, consoante cada um deles.
Poderíamos estar aqui a analisar peça a peça, mas creio que a liderança de uma equipa é bem do que isso. E que, apesar da qualidade em alguns sectores ser menor este ano, outros e maiores desafios se colocam a um treinador ao juntar também as questões culturais de qualquer organização. A maioria de nós, a bater quase nos 99%, não sabe se algum jogador de qualquer equipa tem ou não problemas em casa. Ou quem tem mais sinergias naturais com um ou outro colega. Ou o que acontece num treino. Ou o porquê de alguns renderem mais nos treinos, e nos jogos quase nada.
Há sempre um «mas». Há coisas que são visíveis. Vemos um treinador mais ansioso este ano. Mesmo no primeiro ano de Rui Vitória, após aquela viagem ao México, que não se via um líder tão nervoso em vários momentos. Não agressivo ou mais assertivo, como o caso em que deu literalmente um murro na mesa. Este ano e especialmente nestes últimos jogos, o treinador do Benfica está menos controlado, tal como a equipa do Benfica, que deixou escapar três vezes uma vantagem (CSKA, Boavista e Sp. Braga).
Os traços comuns de Rui Vitória estão lá. Diria mesmo que é uma liderança mais situacional. Como referi no artigo anterior sobre Sérgio Conceição, esses traços ou identidade serão mais eficientes e compatíveis em determinados contextos. Rui Vitória já passou por isto quando teve de recuperar vários pontos. Superou o desafio. Só que hoje o contexto é diferente. Não são apenas os jogadores. É a exigência. A paciência. E mais algumas coisas internas que desconhecemos."

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