No auge da Primavera uma desusada saraivada, daquelas que obrigam o trânsito à marcha de caracol, colocou numa correria de espanto toda a gente de nariz encostado às vidraças, observando todo um espetáculo vestido de branco.
Eu sabia, porque acompanhei de perto o poisar repetido dum casal de melros em tarefas perfeitas na construção de seu ninho, num dos ramos de japoneira que espreita num pequeno lago e que ajuda a abrilhantar o jardim da frente de minha casa.
Entretanto, das duas ovinhas esverdeadas saltavam cá para fora outros tantos melrinhos que, na ocasião da dita saraivada, já quase cobertos de escura penugem, baloiçavam na fuga à intempérie.
Fui dar-lhes uma espreitadela, seguindo-me a minha “Bamby” – cadelinha outrora bebé abandonada no monte de Barrosas e que meu sogro me confiou de presente, para de biberão, lhe dar o alimento e o carinho dum aconchego numa lareira apetecida. Passou-me a olhar com uma ternura reconhecida, acompanhando os meus passos em tudo quanto era sítio – quando estava a ver o telejornal, quando estudava ou preparava aulas ou corrigia exames, quando dava um pequeno giro pelo quintal… saltava quando me via contente, entrava em melancolia quando me sentia preocupado… a minha Nelinha até dizia: «a esta cadelinha só lhe falta falar!…». Morreu, fez estes dias 7 anos … após 16 anos bem vividos, mas que uma fatal doença a quis levar. Recordo que nesse dia chorei de casa até à Faculdade… e de óculos escuros examinei 5 alunos em final de Curso e segui para Aveiro onde continuei a chorar e me “obriguei” a lecionar aos Treinadores 4 horas seguidas de matéria correspondente às Ciências do Comportamento… recordo bem que foi das aulas em que as palavras se misturavam com a saudade de quem já não encontraria os meigos latidos da minha chegada a casa e, jamais poderia voltar entender aquele olhar meigo interrompido por uma longa respiração!…
Voltando atrás e, como ia dizendo, fui ver como tinha ficado o ninho de melros, depois da áspera e ventosa saraivada e, claro, sempre com a dita “Bamby” a meus pés.
Voltando atrás e, como ia dizendo, fui ver como tinha ficado o ninho de melros, depois da áspera e ventosa saraivada e, claro, sempre com a dita “Bamby” a meus pés.
Deparei-me com a angústia de ver um dos melros a esvoaçar muito aflito na água do lago, enquanto o outro… já nem dava de si!... Rapidamente o tentei secar, mas escorregou-me entre mãos e num segundo de distração, oiço um agudo chilrear, foco o meu olhar para a Bamby que já o tinha entre os dentes. Hoje penso que foi a vontade de me ajudar a aquecê-lo com seu bafo, pois em correria o levou quase moribundo para casa, largando-o na carpete próximo do fogão de sala que dum luzidio brasido fazia um apetecido aquecimento.
Bom, uns dias passados, e aquele passarinho agoniante era já um melro de asas largas, bico amarelo e, à medida que me aproximava da gaiola, não se cansava de ensaiar um descontrolado reportório – dei-lhe o nome de “Sinatra”.
Mas, à medida do tempo, ia notando um nervoso saltitar, acompanhado dum piar inquietante por entre aquele gaiolão com comida, água e baloiço também – uma crise de liberdade.
Contrafeito, numa manhã quente de Agosto, resolvi, muito a custo, é claro, içar a gaiola para uma árvore do jardim das traseiras, amarrando-a a um cano, abrindo-lhe de seguida as portinholas. Num repente o “Sinatra” atira-se à liberdade, sem que antes descrevesse duas ou três voltas em redor da minha vista, até que se foi… Mas o interessante é que de vez em quando lá tinha eu que encher os depósitos da comida e água, porque ao cair das trindades o Sinatra resolvia fazer-nos uma visitinha. Até que lhe perdemos o rasto!…
Um dia destes, levou-me a canseira habitual de abrilhantar uma das árvores de Natal com luzinhas de muitas cores, até que, nem queria acreditar… mesmo ali ao lado – repiu-piu… piu… repiu-piu – lá estava o nosso “Sinatra” a cantarolar um hino de esplendor para uma visita num voar rasante de imensa alegria e em rapidíssimos zig zagues– trazendo-me à ideia a figura dum anjo de asas brancas bem estendidas, anunciando aos pastores:
Um dia destes, levou-me a canseira habitual de abrilhantar uma das árvores de Natal com luzinhas de muitas cores, até que, nem queria acreditar… mesmo ali ao lado – repiu-piu… piu… repiu-piu – lá estava o nosso “Sinatra” a cantarolar um hino de esplendor para uma visita num voar rasante de imensa alegria e em rapidíssimos zig zagues– trazendo-me à ideia a figura dum anjo de asas brancas bem estendidas, anunciando aos pastores:
«O Menino Jesus nasceu
Glória a Deus nas alturas
…e paz na terra aos homens de boa vontade»
Glória a Deus nas alturas
…e paz na terra aos homens de boa vontade»
Para todos os meus queridos/as leitores/as da bola.pt e de todos aqueles que habitam juntinho ao vosso coração, desejo Festas Felizes e que Deus, que mais uma vez neste Natal se vai fazer Menino, renove um sinal de luz, capaz de iluminar a esperança na felicidade, a paz no amor e a confiança no futuro.
José Neto: Metodólogo de Treino Desportivo; Mestre em Psicologia Desportiva; Doutorado em Ciências do Desporto/Futebol; Formador de Treinadores F.P.F./U.E.F.A.; Docente Universitário.
José Neto, in a Bola
Sem comentários:
Enviar um comentário