Por vezes o treinador do Benfica é flexível em demasia na abordagem aos jogos, mas ninguém o pode acusar de ficar de braços cruzados perante aquilo que entra em falência tática.
Se há defeito que Bruno Lage não tem é ser inflexível do ponto de vista tático. Aliás, por vezes o treinador do Benfica quer tanto olhar para os adversários que acaba por condicionar uma identidade própria, o que mais facilmente se converte em virtude na UEFA do que a nível interno, ainda que a visita a Munique tenha sido o expoente máximo dessa faceta mais submissa.
Mas reconheça-se em Lage o mérito de ser ajustável, quando na medida certa. De saber que o detalhe faz toda a diferença, e que basta trocar uma peça, ou até deslocá-la ligeiramente, para alterar toda a dinâmica, para o bem ou para o mal. Por aqui elogiei o detalhe dos acertos do treinador português quando substituiu Schmidt — o alemão tinha as suas virtudes, mas caiu por ser incapaz de negociar a sua ideia, já esgotada — e agora Lage quer combater a falência sua ideia inicial — ou de parte dela, pelo menos. Na polémica conversa de garagem chegou a lamentar que os jogadores não davam três passes seguidos, como se isso não fosse falha sua, mas nas últimas semanas assumiu a responsabilidade de tentar resolver esse e outros problemas.
A vitória sobre o Boavista, que deixou o Benfica na liderança da Liga, à condição, reforçou indicadores positivos de mutação. A expulsão de Reisinho precipitou aquilo que Vaclik adiava, perante melhoras evidentes das águias.
A pantera não arranhou muito à frente, mas também por força daquilo que a equipa de Lage ganhou com uma construção a três que aumenta a influência de Carreras, mais dentro do jogo e a estabelecer linha de comunicação eficaz com Dahl, reforço de inverno que tem deixado boa primeira impressão. Com o sueco projetado na ala, tal como Leandro Santos, Amdouni e Bruma procuraram fazer a diferença por dentro (lembra-se da última exibição do português na Luz, pelo SC Braga?) e formaram com Aursnes e Kokçu um quadrado que aumentou o jogo interior. Sacrificou-se alguma capacidade para atacar a profundidade, pelo menos até Pavlidis entrar (e marcar), mas Belotti, que abriu caminho ao triunfo e até podia ter cantado de galo mais vezes, mostrou capacidade associativa e acutilância na área.
Ainda na recente receção ao Mónaco o Benfica foi incapaz de gerir o jogo, mas Lage quer atacar o problema. Sabe que é um processo embrionário e que a equipa precisa continuar a evoluir dentro das novas dinâmicas. Não será fácil encontrar o equilíbrio, mas a base é promissora.
Nuno Travassos, in a Bola
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