Esfregar os olhos e voltar à realidade. Tão simples quanto isso. É tempo de virar a página e pensar no título e na Taça de Portugal, os importantes troféus em disputa.
O Benfica apareceu em Vila do Conde renovado e sem ponta de frustração europeia, atacando um jogo previsivelmente difícil sem hesitar. Pressão alta, ritmo forte e a bola a rondar a baliza do Rio Ave, ameaçando entrar em repetidas ocasiões. Os regressos de Carreras e Bruma deram vida nova ao lado esquerdo, para onde a influência atacante da equipa derivou. Amdouni, voltando ao onze, foi outra aposta ganha, contracenando com Aursnes entre a direita e o apoio a Pavlidis.
A primeira parte foi surpreendentemente boa e rápida, mesmo depois de um exigente jogo europeu e terá sido das melhores da época. As oportunidades sucediam-se, mas nada parecia capaz de mexer o resultado. Até que, cá vai disto, terá pensado Kokçu, honrando a sua condição de atirador de longa distância. Magnífico o golo do turco, misturando potência com perícia, na conta certa. Um recurso valioso, o remate à distância, para quem defronta defesas recuadas e que abriria finalmente a contagem, quando já se temiam cenários recentes de muito investir e pouco colher. A segunda parte começava com novo golo, que espelhava melhor o domínio exercido.
Porém, ninguém previa o que viria depois. Um livre frontal, resultante de falta talvez escusada, reduziu a diferença. Logo depois, um excesso de pouco zelo em zona proibida, ofereceu o empate. O caldo parecia entornado... Há já algumas semanas assinalei aqui que os golos muitas vezes sofrem-se aos pares, e em pouco tempo, tal o efeito que provocam, moralizando quem marca e afetando quem sofre. Num instante a situação inverteu-se e com substituições frescas, ainda feitas de acordo com o contexto anterior positivo. A verdade é que, mais uma vez, valeu que quem entrou fê-lo a todo o gás. Pouco tempo passado o irrequieto Belotti encaminhava o ataque, descobrindo Aursnes, que por sua vez libertou Akturkoglu na área para marcar. Um golo que reequilibrou a equipa e que valeu uma justa mas sofrida vitória.
UM QUASE GOLO
O recente duelo madrileno para a Liga dos Campeões ilustra bem como tudo pode acontecer da marca dos onze metros. Vinícius Júnior, considerado por muitos um dos melhores da atualidade, nem na baliza acertou, quando dispôs do momento que podia ter resolvido a eliminatória. Sorte e competência técnica ou azar e desacerto? Tudo é possível quando se depende de uma só ação técnica e de um único segundo.
A conversão ou falhanço de um penálti é um tema frequentemente falado, mas pouco explicado. O momento mais crítico está no pé e no controlo mental daquele que é responsabilizado para converter o que todos consideram um quase golo. A falada competência ajuda, mas está muito longe de ser tudo...Julián Álvarez, outro excelente avançado, foi igualmente protagonista no mesmo desempate, mas por razões diferentes. A anulação polémica do seu penálti, por ter escorregado e ao que parece tocado duas vezes na bola, promete durar.
Mas ainda houve mais: diz-se que o futebol é momento e Ancelotti expressou isso mesmo com uma substituição de última hora. Decidiu poupar o antes designado Endrick, escolhendo Rudiger, cujos talentos nada combinam entre si. A experiência e descaramento do central alemão ganharam, na cabeça do treinador, ao potencial, talvez inibido pelo momento, do prodígio brasileiro. Foi então Rudiger o autor do mais atabalhoado remate da noite, mas ironicamente o que valeu a vitória. A bola lá entrou a custo, com a ajuda do poste. Só podia acabar assim, uma noite de desempate invulgar.
GESTÃO DA DOR
As substituições frequentes de Tomás Araújo davam conta, já há algum tempo, de que a sua gestão física era preocupação da equipa técnica responsável. Não conheço exatamente do que sofre, mas mais uma vez volto ao que vivi, curiosamente no ano em que mais golos marquei ao serviço do Benfica. Jogava sempre, mas treinava menos que os meus companheiros, sendo poupado pelo menos na sessão anterior e na seguinte a cada jogo. O obrigatório gelo e o sistemático Voltaren, ajudavam, mas não curavam. A minha tendinite rotuliana haveria de arrastar-se, só interrompida aquando da minha fratura sofrida em Kiev. Afinal nem tudo foi mau nessa noite frente ao Dínamo, porque a longa paragem a que fui obrigado acabou por, pelo menos, curar a lesão anterior. Para grandes males grandes remédios...
Voltando a Tomás Araújo faz todo o sentido que na pausa das seleções nacionais se intensifique o tratamento e se interrompa ou modere o treino. Ocupando ele uma posição fragilizada da equipa, será vital que, na fase decisiva do campeonato, Bruno Lage conte com ele mas em melhor condição.
Rui Águas, in a Bola
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