sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

TUDO PERFEITO? NÃO


"Desculpem-me os mais contentes da bancada, mas, se bem pergunto, tudo ficou resolvido na sábado passado e anteontem? A tal crise está ultrapassada? O que era lento deixou de ser, naqueles jogos? O que era larvarmente insuficiente ter-se-á transformado, por magia, num modo de jogar definitivamente absoluto ou bom? Já estará, então, tudo nos trinques? Tudo nos conformes?
Digo eu que se engana redondamente quem pensar assim... Eu vejo jogar o Benfica há já muitos anos. E, para me lembrar só do meio-campo, por exemplo, vi jogar Coluna, Jaime Graça e João Alves, e só seu seu as memórias que me deixaram. Também jamais esquecerei do que vi fazer a Cavém, Santana, Valdo, Toni ou Aimar. E lembro-me, como se tivesse sido ontem, do que fazia Rui, Rui Costa, nesses espaços! O Benfica sempre continuou a crescer e a desenvolver-se. Sempre soube reinventar a chama que cada um dos seus maiores jogadores lhe foi trazendo, à medida em que cada um deles cedia o seu lugar a outro, mais jovem.
Clube único e inigualável no mundo, o Benfica fez-se grande não tanto pelo exemplo que cada um dos seus atletas mais representativos ou mais geniais lhe aportava em cada época, para inegável felicidade de todos, mas, sobretudo, porque os seus sócios sempre tiveram o bom senso de certificar e preservar eficazmente o essencial que os unia, da mesma forma que sempre souberam dispensar e arredar o que, apenas sendo efémero e conjuntural, ocasionalmente, os separasse.
Essa ideia de como se fez, construiu e desenvolveu a grandeza do Benfica é, portanto, o factor absolutamente primacial que nasceu da Amizade entre pequeno círculo de companheiros, ainda antes da fundação formal do Clube, consagrada em 1904.
E é essa mesma idade que tem de continuar a fazer desenvolver, para sempre, o Grande Benfica. Sejam quais forem os seus conjunturais intérpretes. Seja em que jogo, em que torneio, ou em que modalidade jogar um jogador ou uma equipa do Benfica. A partir de então, nada ficaria como dantes no cenário do associativismo em Portugal; e duas décadas mais tarde - já sendo muito, muito forte e muito relevante no contexto da sociedade portuguesa - o Benfica se tornava no mais pujante organismo civil independente no seio do qual, por sua força própria, a Democracia era cultivada com eleições livres e regulares, ao contrário do caldo ditatorial em que Portugal se reduzia e definhava.
Quando, nos dias de hoje, vejo jogadores do Benfica jogarem a passo e em passinhos para o lado, mais preocupados com o penteado ou com os vincos da roupa de jogo do que com a responsabilidade de se entregarem à defesa e ao prestígio dos símbolos que lhes fora concedido representar, ou quando os vejo perder ou empatar sem chorarem de raiva e de tristeza, vêm-me à abençoada memória que conservo aqueles jogadores memoráveis e a interpretações viva que eles honradamente representavam do Grande Benfica.
Por isso me identifiquei e me reconheci tão inteiramente na sinceridade (e na coragem) do testemunho e dos esclarecimentos que Luís Filipe Vieira fez questão em prestar aos sócios, num dos momentos mais difíceis dos seus quinze anos de presidência. Afinal, cumprindo a sua nobre missão de eleito Benfiquista, no momento que entendeu mais conveniente, o presidente soube afastar alguns epifenómenos dispensáveis e (de novo) fez bem em conservar o que, entre nós, é verdadeiramente essencial. E, por mim,, simplesmente não aceito as reticências que vou percepcionado habilmente dissimuladas nos posicionamentos de alguns que são seus próximos pares."

José Nuno Martins, in O Benfica

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