quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

VAGA "ANTIBENFICA" CHEGA MAIS CEDO


"Único motivo que se enxerga para tanta pressa: há um ano, por esta altura, o dragão estava sete pontos à frente da águia, agora está quatro atrás...

É incontrolável a mania de presidente de clubes se aproveitarem da projecção noticiosa que os jogos com os grandes suscita para dizerem inutilidades e mostrarem-se ao país.
No essencial, foi o que fez o presidente do Vitória SC, sem se dar conta do que seu treinador afirmara minutos antes - e se tivesse esse cuidado talvez a intervenção que resolveu fazer fosse no sentido de valorizar o desempenho da sua equipa e enaltecer a competência de quem a preparou e orientou, Ivo Vieira.
Preferiu enveredar por um discurso inócuo, tradutor de quem se deixou motivar por alguém ou alguma coisa para mostrar uma mão vazia de ideias. Acontece, sobretudo a quem chegou à presidência há pouco tempo e ainda se deslumbra com os recados que hábeis máquinas de propaganda colocam no mercado para consumidores distraídos. Recados com aquele que foi debatido na semana que antecedeu o clássico de Alvalade e assinado por figura de infinda experiência, que faz isto de olhos fechados. A intenção, porém, é a mesma de sempre: confundir, baralhar e voltar a dar de cada vez que a posição que não se desejam.
No último campeonato a epidemia só atingiu o pico a partir da 28.ª jornada, com a ridícula congeminação antibenfiquista relativamente ao jogo da Feira, mas no actual deve começar mais cedo. Creio até que já começou e o único motivo que se enxerga para tanta pressa terá a ver com a diferença no ordenamento classificativo de uma época para outra: se há um ano, por esta altura, o dragão estava sete pontos à frente da águia, agora está quatro atrás, com a particularidade de ter vencido nos dois clássicos que disputou na capital.

Esta jornada 15 interessante e prenunciadora de tempos muito difíceis para o Benfica, no campo, muito naturalmente, e fora dele, no jogo falado, em que o ilimitado exercício da palavra tudo consente, incluindo a intriga rasca e o insulto.
A inusitada atitude do presidente vimaranense provocou igualmente estranheza por trazer à colação o Sporting de Braga, esgrimindo o argumento de a equipa de arbitragem ter sido a mesma nos jogos dos dois clubes minhotos com o Benfica.
Em relação a este ponto, duas observações:
Sobre o trabalho do árbitro, a lamúria do costume, basta ler as opiniões da generalidade dos especialistas na matéria para verificar que lhe falta razão nos reparos que aventou.


Sobre a comparação ao SC Braga convinha que fosse esclarecedor e nada deixasse por dizer de maneira a poder entender-se o objectivo da mensagem. Dizer que o árbitro e o VAR foram os mesmos, sim, e depois? Clarifique!
Tentar argumentar o SC Braga para cruzada vitoriana até nem foi despiciendo, não pela questão esfarrapada da arbitragem, mas numa perspectiva de futuro, de maior abrangência, porque o caminho que Pinto Lisboa tem de trilhar, mesmo sem assumi-lo publicamente, devido às rivalidades pacóvias, será idêntico ao do seu vizinho António Salvador que também chegou à presidência do clube bracarense em cenário de enorme complexidade, mas foi célere a aprender que, se quisesse vingar, teria de ser duro, pensar pela sua cabeça e defender intransigentemente os interesses do seu clube sem se preocupar nem com comentários,, nem com reacções de outros actores, independentemente do peso e da influência que pudessem exercer.



Salvador depressa passou a ser conhecido como presidente de clube em afirmação que, no mesmo dia, tomava o pequeno no almoço em Lisboa com o presidente do Sporting, almoçava com o do Benfica e no regresso a casa jantava com o do FC Porto.
Por isso, fez o SC Braga sair do anonimato e adquirir dimensão europeia. Chegou ao patamar mais elevado, a Liga dos Campeões, e foi finalista da Liga Europa, tendo na presente temporada vencido seu grupo, um dos objectivos desportivos.
Por isso, o SC Braga promove a marca do clube, associada à cidade e à região, à semelhança do Liverpool, por exemplo, enquanto, sabe-se lá por que mistério assim procedem, adeptos do Vitória parecem mostrar-se relutantes em casar com Guimarães por se considerarem honrada e unicamente vitorianos, do Sport Clube, o que, em rigor, não diz nada a ninguém.
É um aliciante desafio que Pinto Lisboa deveria abraçar porque «o mundo pula e avança, como bola colorida». Isto é, ou o Vitória (de Guimarães) alarga os horizontes, sai das muralhas do castelo e enfrenta o risco de ficar eternamente limitado às discussões futeboleiras de café e resignado e testemunhar o crescimento do rival SC Braga, pelo menos enquanto António Salvador for o seu presidente."

Fernando Guerra, in A Bola

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