"O que sei é que o futebol é cada vez mais dominado por um bando de delinquentes que se aproveitam da paixão do grande público para extorquir, dominar e desenvolver espaços obscuros de poder e criminalidade, afastando cada vez mais as famílias dos estádios e desiludindo quem gosta de ver um bom jogo apenas pelo gosto do espetáculo do desporto.
Esta semana assistimos a mais um triste e trágico episódio do futebol português. Mais um entre muitos que têm manchado a reputação do desporto rei ao longo dos anos. Num dia que era suposto ser de festa para os adeptos portistas, voltámos a assistir a um espetáculo deplorável de agressões desta vez entre pessoas do mesmo clube, supostamente pertencentes a “gangues” rivais de diferentes bairros da cidade. Aquilo que os telemóveis puderam filmar, escalou depois para os festejos nas proximidades do estádio do Dragão, resultando numa morte brutal, visível em imagens a que infelizmente a grande maioria dos portugueses teve acesso, pela partilha em grupos de WhatsApp.
A mim sinceramente pouco me interessa saber o que tinham eles para resolver ou o que levou àquela situação. O que sei é que o futebol é cada vez mais dominado por um bando de delinquentes que se aproveitam da paixão do grande público para extorquir, dominar e desenvolver espaços obscuros de poder e criminalidade, afastando cada vez mais as famílias dos estádios e desiludindo quem gosta de ver um bom jogo apenas pelo gosto do espetáculo do desporto. Não são só as claques, são os agentes desportivos, os intermediários, os dirigentes e tantos outros que gravitam à volta de estruturas cada vez mais densas. Um autêntico parque recreativo para quem faz da corrupção, das ameaças e das jogadas de bastidores ilícitas o seu dia a dia.
Especificamente falando das claques, tenho muitos amigos que fazem parte delas. Seja na Madeira, em Lisboa, no Porto ou em Guimarães. A grande maioria deles em condições normais não faz mal a uma mosca, são pessoas boas e de bem. O problema é que muitas vezes uma pessoa isolada age de forma diferente do que quando integrada num bando. Alteram-se, viram bichos, tornam-se agressivos e ameaçadores. Não sei se é um culto lá deles ou representação para impressionar os outros. Dir-me-ão que por meia dúzia de jagunços não é justo pagarem os outros todos. Eu acho que é. Veja-se o que aconteceu em Inglaterra com os hooligans, as medidas duras que foram (e continuam a ser) tomadas e como o espetáculo passou a ser mais agradável e seguro. Ao contrário do que muitos diziam, os jogos não perderam magia nem os clubes perderam apoio. Mas o exemplo começa dentro das instituições que regem o futebol, que apadrinham e se escondem atrás destas organizações apoiando-as mesmo que indiretamente e dando-lhes força.
Enquanto outros desportos vão dando passos para que se possa aprimorar o espetáculo de quem paga um bilhete, no futebol vai-se continuando a fechar os olhos e a assobiar para o lado. E não é um problema do Porto. É do Sporting, do Benfica, do Vitória e de tantos outros. Enquanto não existir quem tenha a capacidade de fazer frente a estas hordas do crime organizado nunca teremos a evolução tão aguardada, a justiça desportiva e a leveza de praticar desporto. E não se pense nem por um minuto que sem claques o futebol perde apoio e parte da sua magia. O futebol é do povo, das multidões anónimas e das famílias, é festa, é convívio e emoção. São abraços e sorrisos. É sofrimento e explosão de alegria. É por isso que as claques não se enquadram no modelo atual. Porque representam a antítese de tudo o que é salutar."
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