"À primeira vista, prática desportiva e expressão artística são duas coisas que não têm pontos comuns ou uma ligação particular. O desporto pode ser definido por quatro elementos: a prática de um esforço físico, a orientação para a competição, uma atividade institucionalizada, com regras comuns, e uma prática federada. Quanto à arte, pode ser definida como sendo uma atividade humana, onde o produto desta atividade se direciona para os sentidos, as emoções e o intelecto. Como o desporto, a arte é uma construção cultural. Bismuth (2011), entende a arte como um desporto de combate.
Apesar da barreira que, aparentemente, associam estas duas palavras, a sua ligação é real. O desporto pode existir sob uma forma artística, mas a arte pode também ter o desporto como suporte. A dança, a patinagem artística, a ginástica, por exemplo, está em paralelo com a arte. Por outro lado, a fotografia, a pintura, a escultura, o vídeo, etc., são elementos importantes em matéria desportiva. O desporto pode, assim, tornar-se arte através da uma máquina fotográfica ou de uma câmara de filmar, mas também pode passar por artes mais manuais, como a pintura e a escultura. A ligação “desporto-arte” não é uma simples implicação (…=>…), mas uma equivalência (…<=>…). É, neste sentido, que certas práticas desportivas são consideradas como artísticas porque belas a ver (arte => desporto), mas também o desporto pode ser representado de forma artística (desporto => arte).
Na ideologia da Grécia Antiga, a superioridade física e a perfeição moral são dois fundamentos indissociáveis. É, por isso, que na escultura, nos vasos, mosaicos ou nos frescos murais, é corrente encontrar várias representações de atletas em plena ação. Os músculos, o movimento eficaz, o gesto, lembram-nos até que ponto é necessário obter uma harmonia perfeita entre o corpo e a alma. A arte sempre tentou colocar em destaque a imagem do desporto, mesmo antes de ele ser chamado assim. Uma das mais célebres estátuas da Antiguidade, atribuída ao escultor ateniense Míron, e datada do século V a.C., representa um atleta a lançar um disco. Chamado “Discóbolo”, esta estátua é geométrica.
Teoricamente, representa um homem com uma musculatura pura e ideal. Os séculos que se desfilam a seguir revelam-se famélicos em termos de representação do desporto, com a exceção de alguns quadros que nos mostram o jogo de palma (desporto de raquetes, do qual o atual ténis é descendente) em voga na corte de Louis XIV. As preocupações artísticas da época gravitam em torno da moral cristã e da religião em geral, rebaixando o corpo a uma simples bestialidade e opondo-se a virtude de espírito considerada mais próxima do divino.
Quando o desporto parece ter desaparecido dos radares artísticos, é no final do século XIX que a arte se interessa por ele novamente. É a celebração do corpo em movimento, a ode ao esforço físico e ao evento do prazer pelas atividades ao ar livre. Huitorel, crítico de arte e autor do livro “La beauté du geste : l’Art contemporain et le sport” (2005), refere que o evento do desporto, no sentido mais restrito, e a emergência da modernidade artística nas sociedades ocidentais são rigorosamente contemporâneas. Os Impressionistas retiram os seus cavaletes, as suas telas e os seus pincéis do atelier para se abrir ao mundo. Eles representam o que veem e isto faz eco aos lazeres dos seus contemporâneos. Les régates de Claude Monet ou de Alfred Sisley, as corridas de cavalos de Edouard Manet ou de Edgar Degas são alguns dos exemplos. Os vanguardistas do século XX vão prosseguir nesta vida traçada pelos Impressionistas e se interessam pelo desporto pelo prisma do movimento e da velocidade, caraterísticas dessa época.
Entre 1912 e 1916, Robert Delaunay se ataca a uma série de obras, pintando o rugby, o futebol e a corrida, com o famoso “Courreurs” inspirado pelo Cubismo. Entre 1912 e 1948, nas provas olímpicas de pintura, escultura, literatura, música e arquitetura, 150 medalhas foram atribuídas. O barão Pierre de Coubertin (1863-1937), célebre inventor dos Jogos Olímpicos (JO) modernos, em 1896, associa arte e desporto, como sendo um meio primordial de guardar uma ligação com o espírito dos Jogos que se desenrolaram na Grécia Antiga. Para concorrer, os artistas deveriam enviar as suas obras para o Comité Olímpico do seu país, que fazia uma primeira triagem e seleção para depois enviar para o Comité Olímpico Internacional (COI). As obras, que se deveriam inspirar do desporto, eram depois expostas durante o momento dos Jogos.
Vejamos alguns exemplos de arte e desporto:
Figura 1:
Notícia no jornal Fígaro sobre o Prémio Olímpico de Escultura, JO, 1924.
Figura 2:
Cartaz dos JO em Londres, 1948
Figuras 3 e 4:
Jean Jacoby, pintor: à esquerda, “Rugby”, à direita, “Corner”, 1928
Figura 5:
Cartaz sobre as provas de atletismo dos JO de Amesterdão, 1928
Este é um amplo campo de investigação, interligando a história da arte e o desporto. Eram bem-vindos trabalhos desta natureza."
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