1.
Há muitos programas de debate futebolístico.
Todos os canais promovem painéis que discutem ao pormenor cada frase, cada fora de jogo, cada penalty, cada pequena, média ou grande polémica.
Há debates com gente que percebe de futebol, mas há painéis com gente que só percebe de bola.
Os conspirativos e os racionais.
Os políticos e os equilibristas.
De há uns anos a esta parte os mais variados projetos de comunicação privilegiam adeptos dos clubes ou ex-futebolistas que saibam representar o Benfica, o FC. Porto e o Sporting.
2.
Mas se podemos encontrar os mais variados perfis, o que me satisfaz e facilita a escolha, só conseguimos encontrar um Octávio Machado.
Foi jogador de futebol e treinador de referência de um certo futebol português. Nesses tempos em que foi adjunto de Artur Jorge no FC. Porto e treinador principal no Sporting, era tão popular que chegou a ter um boneco no Contra Informação, aí era o Octávio Malvado.
Octávio Machado é um dos principais comentadores na CMTV. Normalmente vemo-lo ao domingo e é espantoso o modo como consegue ser tão desagradável, tão perverso e tão incendiário, o que é extraordinário tendo em conta que é presidente dos Bombeiros de Palmela há mais de vinte anos.
3.
No fabuloso Gangs of New York, Daniel Day Lewis compõe um personagem que fica para a história. Num mundo em mudança, Billy the Butcher" é o herói de uma época em decadência, um homem desajustado que continua a reger-se pelos padrões que conhece.
Um pouco injusta a comparação.
Porque "Billy the Butcher" é o símbolo de uma América de foras-da-lei que não se consegue adaptar ao progresso económico e a um novo mundo com linhas-de-ferro e comboios cobertos de oportunidades. Mas é grande como a América sempre foi.
Já Octávio Machado é apenas o símbolo de um futebol português feito de bufos, controleiros, esquemas e trapaças.
Ouvi-lo não me faz ter saudades do antigamente, o que me deixa contente. É que os anos me vão passando e começo a ter nostalgia de tudo - do Dartacão ao inspetor Corrado Cattani, da pasta medicinal Couto ao Vic Vaporub, do Fiat 127 ao Tony de Matos, do Verão Azul aos Jogos sem Fronteiras, do TV-Rural ao grande Vasco Granja.
Mas não tenho saudades do que era o futebol português.
Que ainda assim deve ter os seus apoiantes pois Octávio Machado lá continua todos os domingos a espalhar azedume, maus fígados e teses conspirativas.
4.
Parece carregar o peso do mundo aos ombros, está sempre chateado, sempre a olhar de lado, sempre a dar de si a imagem que sabe qualquer coisa que nós não sabemos, que há sempre interesses escondidos por baixo do pano.
De vez em quando fica muito calado e sorri.
Faz caixinha.
E espera que a pivot lhe pergunte qualquer coisa para então, como se fosse um senador da República, perorar sobre o futebol e as golpadas que ele sabe estarem a ser preparadas.
Noutras vezes diz coisas que não percebemos, que ninguém percebe, mas que servem para adensar qualquer mistério, qualquer suspeição, qualquer recado.
E também gosta de se fazer de sonso.
No programa do passado domingo afirmou esperar que ninguém ponha em causa os profissionais do Santa Clara que vão jogar contra o Benfica na última jornada...
... com isso é o primeiro a lançar a suspeição, o primeiro a lançar uma pedra e a esconder a mão.
5.
Não conheço, com pena minha, Rodolfo Reis.
Ou Manuel Fernandes que ontem foi muito justamente homenageado no Estádio de Alvalade.
Também eles corporizam o futebol de ou outro tempo.
E também eles são ou foram comentadores televisivos.
Mas há duas diferenças enormes: é que Rodolfo tem um enorme sentido de humor e Manuel Fernandes um enorme sentido de companheirismo e amizade. Mesmo quando são mauzinhos há uma ética de "homens do futebol" que os faz continuar vivos e respeitados - mesmo por quem não concorda com eles.
E confesso-te que perdoo tudo aos que têm humor ou aos que gostam de gostar dos outros, aos que são boas pessoas.
Octávio Machado não tem sentido de humor.
E o seu olhar é incapaz de qualquer ternura.
Não gosto quando ele me entra em casa ao domingo.
Mas o problema deve ser meu.
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