quinta-feira, 31 de agosto de 2023

BENFICA, NÃO É PRECISO PANICAR


"O ano passado foi tudo muito claro desde o princípio. Um 4-2-3-1 com Florentino e Enzo no meio, Rafa, João Mário e Aursnes (ou Neres) na frente e Gonçalo Ramos como referência atacante. Na baliza também não havia dúvidas e na defesa também não. Gilberto começou como titular, mas havia a noção clara que Bah acabaria por se superiorizar e depois aconteceu apenas a surpresa de Morato se lesionar e António Silva pegar de estaca. Logo desde os primeiros jogos da pré-temporada, Roger Schmidt estabilizou este onze e usou e abusou dele. E bem, porque o arranque de época do Benfica foi em alta rotação. Também assim teria que o ser à conta das duas pré-eliminatórias da Liga dos Campeões.
Depois durante o ano surgiu apenas o desafio de colmatar a saída de Enzo Fernández em janeiro. Schmidt testou Aursnes, mas o rendimento do «bacalhau» não foi o mesmo, apostou em Chiquinho e pareceu resultar (até as bancadas da Luz acharam piada), mas em boa hora surgiu João Neves mesmo nas jornadas finais para ajudar a segurar um barco que passava por águas perigosas. Mas tudo fica bem quando acaba bem. Com um onze estabilizado o ano todo, o Benfica foi campeão. Apesar de ter ficado curto nas taças nacionais e deixar a sensação de desgaste na parte final (quando já sonhava em ir ainda mais longe que os 1/4 de final na Champions), reforçando a ideia que o Benfica precisava de mais soluções fortes no banco e maior rotação do seu treinador.
Já em janeiro tinham chegado Guedes, Schjelderup e Tengstedt para reforçar o recheio do plantel e é também nesse prisma que mesmo surgindo Di María, o Benfica resiste a não abdicar de nenhum dos médios ofensivos que já tinha.
Só que este ano está tudo um pouco mais complexo e duvidoso. Pela primeira vez na era Roger Schmidt, sentimos que o alemão não está seguro do que está a fazer. Há indefinição na baliza. Vlachodimos foi afastado por uma má exibição (e porque, sejamos francos, nunca foi fenomenal), Samuel Soares tenta fazer pela vida e Trubin aguarda pela sua oportunidade. O Benfica precisava mesmo que o ucraniano fosse o Oblak de 2013/14. Nos primeiros jogos dessa mítica temporada, também no início o Benfica sofria vários golos com Artur e depois chegou o esloveno e fechou a cadeado a baliza do Benfica. Trubin vai acabar por ser o titular e será muito importante que confirme todos os elogios que lhe fazem. Que pegue de estaca. Se não, o Benfica tem um problema na baliza.
Também há indecisão na lateral esquerda. Grimaldo era um esteio nessa posição nos últimos largos anos e agora o Benfica está órfão dele. As primeiras sensações de Jurásek não foram boas e entretanto lesionou-se. Ristic até começou a titular contra o Porto na Supertaça, mas não saiu mais do banco. Há algo que nos escapa, porque nos poucos minutos em campo, nunca pareceu assim tão mau jogador. E à conta disso andamos com Aursnes a jogar adaptado a essa posição, o que, pese a qualidade e o voluntarismo do nosso querido «bacalhau», é um claro equívoco. Perdemos o seu talento lá na frente e torna-se num jogador limitado pelas circunstâncias.
Também há dúvidas no meio-campo. Kökçü parece intocável (deveria ser? Mesmo tendo custado 25 milhões? Não há dúvidas da sua qualidade, mas ainda parece em busca de adaptação a novo contexto) e, ao seu lado, Schmidt vai hesitando entre Florentino e João Neves. E mais à frente? Novas questões! Di María diz que não gosta de sair, David Neres já faz má cara ao banco, João Mário é a extensão do treinador no campo, mas procura recuperar a melhor forma do ano passado e só Rafa continua a voar, mesmo que aqui e ali continue a desesperar os adeptos com o seu «end product». Schjelderup aparentemente já percebeu que pouco jogará e terá pedido para sair.
E o ponta-de-lança? Também aí Roger tem dores de cabeça. O ano passado era muito óbvio: Ramos o titular, Musa o suplente. Mas este ano Musa entrou bem, só que teve a expulsão. Comprou-se Arthur Cabral, que até agora pouco mostrou. E até Tengstedt veio baralhar um pouco as contas, porque parecia que já nada contava e afinal foi o herói improvável na vitória sobre o Estrela da Amadora.
O Benfica é um barco gigantesco e tudo em si é ampliado. Para o bem e para o mal. É por isso que no bem surge muitas vezes a sensação de euforia e no mal surge a sensação de crise e pânico. Até porque os nossos adversários (e não inimigos, expressão horrível que Pinto da Costa tantas vezes usa nos seus habituais discursos contra os moinhos de vento do centralismo) estão sempre, quais abutres a rondar presas feridas, desejosos de atiçar o fogo no clube da Luz. Mas é importante os benfiquistas terem cabeça fria e parar um pouco e respirar fundo.
Schmidt já mostrou o ano passado a sua competência. O Benfica tem o mais forte e recheado plantel do futebol nacional. Tem uma massa associativa incomparável. Nas três primeiras jornadas ganhou duas e perdeu uma, num daqueles jogos que acontecem uma vez em 20. E conquistou a Supertaça Cândido de Oliveira, dando um amasso ao seu maior rival na segunda parte (aquele que se diz tantas vezes contra quem tem complexos mentais). Amasso esse que só acabou pouco destacado, porque Pepe e Sérgio Conceição chamaram a si os holofotes com um descalabro mental na parte final. Fossem todas as "crises" dos clubes estas, hein? Problemas de abundância no plantel, um troféu já conquistado e um início de campeonato que não tem sido perfeito, mas nada põe em causa.
O que é importante é Schmidt estabilizar o seu onze, provavelmente lançando Trubin na baliza, resolver a questão do lateral esquerdo e acreditarmos na subida de forma de Kökçü e Arthur Cabral. Isso aliado a nova casa cheia na Luz contra o Vitória de Guimarães na próxima semana e o Benfica tem tudo para voltar a fazer muito boa temporada.
Problemas de plantel? Problemas a sério era quando outro técnico alemão que tivemos, Jupp Heynckes, tinha que decidir se punha a lateral direito Okunowo ou Rojas. Se punha no meio-campo Uribe ou Machairidis. Agora Florentino ou João Neves, Di Maria ou David Neres? Prefiro muito mais esta vida de rico."

Filipe Inglês, in ZeroZero 

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