sábado, 30 de novembro de 2013

ENTREVISTA DE ANTÓNIO CARRAÇA

RECORD ? O que correu mal nesta sua segunda passagem pelo Benfica?

ANTÓNIO CARRAÇA ? Todos os projetos de vida ou profissionais têm objetivos. Individuais e coletivos. Do ponto de vista individual, foi um enorme privilégio ter liderado o departamento de futebol profissional do Benfica ao longo de dois anos. Ter estruturado e ser responsável por uma equipa, vasta e multidisciplinar, que deu sempre uma resposta profissional, competente, rápida e totalmente disponível às necessidades da equipa e do treinador, foi para mim um desafio ganho e uma experiência única e apaixonante. Do ponto de vista coletivo, além das vitórias e de muitas prestações de alto nível, o facto de termos falhado nos momentos cruciais obriga-nos, a todos, a assumir o fracasso de não termos atingido os objetivos definidos no início das épocas.

R ? O problema não foi então da estrutura?

AC ? O Benfica tem, na sua globalidade, uma das melhores estruturas do futebol europeu. Sempre defendi, e continuo a defender, que o próximo técnico do clube terá somente de se fazer acompanhar de um treinador de campo da sua confiança. O LAB, nas suas vertentes de Análise e de Fisiologia, o Departamento de Operações, de Segurança, Médico, de Apoio ao Jogador, de Equipamentos, de Comunicação e de Transporte são a estrutura que qualquer grande clube europeu desejaria ter.

R ? Bom, então o que é que correu mal?

AC ? A única coisa que correu mal foi não termos ganho os títulos que deveríamos obrigatoriamente ter ganho. Porque tínhamos a melhor estrutura, o melhor plantel, as melhores condições estruturais de trabalho, o melhor público e o melhor presidente, que nos proporcionou tudo o que uma equipa da dimensão do Benfica terá de ter para atingir o sucesso! Inclusive o seu total apoio e envolvimento.

R ? Sendo assim, saiu porquê?

AC ? Saí porque eu e o presidente entendemos ser a melhor decisão, de forma a defendermos os interesses da equipa e do clube. Ao longo dos meus 40 anos de profissional de futebol, sempre fui a solução e nunca o problema.

R ? E porque é que essa foi a melhor solução?

AC ? A partir do momento em que Luís Filipe Vieira decide renovar com Jorge Jesus, fica claro que a minha saída é inevitável. Quando o presidente, de forma convicta, aposta na continuidade de um técnico, que na minha perspetiva não reunia as condições ? técnicas, psicológicas, de relacionamento humano e de imagem pública ? para continuar a ser treinador do Benfica, este teria de ser o lógico desfecho.

R ? Não ficou magoado com a decisão?

AC ? Pode parecer estranho e contraditório, já que fiquei desempregado, mas aceito e compreendo a decisão do presidente. Do meu presidente. Quem como ele tem trabalhado para que o projeto desportivo do Benfica tenha sucesso, criando, com grande criatividade e engenho, as condições estruturais e humanas necessárias para os títulos, é perfeitamente natural que as opções tenham de se fazer. E essa é a sua função! Por isso é que é o presidente do Benfica com 83 por cento dos votos a sufrágio nas últimas eleições. Continuo, por isso, e porque sou seu amigo, a dar-lhe como sempre o meu apoio. E a defender o seu projeto e a sua continuidade à frente do Benfica.

R ? Acha que Jesus não deveria ter continuado no Benfica por ter perdido as três competições?

AC ? Nos meus relatórios, e ao pormenor, eram abordadas todas as questões estruturais, individuais e de funcionalidade do departamento de futebol. E aí defendi o fim de ciclo do treinador Jorge Jesus no Benfica. Por defender esta decisão, terminou o pequeno ciclo António Carraça.

R ? Sentiu-se como um bode expiatório no final da época? Afinal, foi a sua cabeça que rolou como se fosse o mal de todos os pecados?

AC ? De forma nenhuma. Quem como eu vive do e para o futebol profissional, sabe que o que se passa na realidade não é do conhecimento público. O que transparece na comunicação social é reflexo de falsas confidências, telefonemas com intenções determinadas, influências de amigos, um sem-número de virtualidades que não correspondem à verdade. Não houve bodes expiatórios, tão-somente decisões de índole política e de gestão de prioridades!

R ? Pagou por aquilo que se passou no Jamor na final da Taça?

AC ? Não, mas aconteceram dois factos graves na final da Taça de Portugal. A derrota da nossa equipa, que não poderia nunca acontecer. Nunca poderíamos perder, sem desrespeitar o Vitória, claro, com uma jovem equipa com cinco jogadores da equipa B e quatro meses de salários em atraso. Como não sou jogador ou treinador, a minha responsabilidade no resultado do jogo é tão-somente solidária com a equipa. Eu e a minha estrutura criámos todas as condições para que os jogadores e a equipa técnica tudo tivessem para fazer o seu trabalho.

R ? E o Cardozo?

AC ? O comportamento incorreto de Cardozo para com o seu técnico, eu também não o poderia evitar. Era impossível, pois nesse momento estava junto dos responsáveis da FPF, a tentar apressar as obrigações para a comunicação social e a entrega das medalhas. Por isso não estava perto. Além disso, o jogador em causa é um homem adulto, e responde pelos seus atos e atitudes. Ato que não poderia nunca ter sido protagonizado numa instituição como o Benfica por um seu atleta.

R ? Mas aconteceu?

AC ? Sim, e para resolver esses atos existem o Regulamento Interno e o Contrato Coletivo de Trabalho. O resto das insinuações, da minha pseudorresponsabilidade, de situações acontecidas no Jamor, do não cumprimento ao senhor Presidente da República ? que deveria estar acompanhado pelo presidente do Benfica para este fazer as devidas apresentações jogador a jogador ? e de não presenciarmos a entrega das medalhas aos vencedores aparecem a pedido de ?amigos? que não gostam do meu estilo de gestão e porque alguns pseudocomentadores de televisões e de jornais, que nunca deram nada ao futebol e que vivem desta forma paralela graças a ele, não tiveram coragem nem capacidade de dizer a verdade e explicar por que perdeu o Benfica onde deveria ter ganho!

R ? Já agora: porque não assistiram à entrega da Taça ao V. Guimarães?

AC ? Já tinham passado cerca de 25 minutos do fim do jogo - e o meu dever é proteger os meus jogadores ? e, por outro lado, onde estavam os vencedores aquando da entrega das medalhas aos vencidos?

R ? A agressão de Luisão ao árbitro na Alemanha: acha que lidou bem com o assunto?

AC ? Não houve agressão. Houve sim um contacto um pouco despropositado, que não deveria ter acontecido e que foi inflacionado por um pseudoárbitro, incompetente e comediante. Geri a situação, no sentido de sensibilizar o árbitro e os responsáveis alemães a continuarem o jogo, com pedido de desculpas do jogador e a sua substituição por outro jogador.

R ? Fez tudo o que deveria ter feito?

AC ? Fui sempre impedido de contactar com o árbitro pelos responsáveis do Fortuna. Durante cerca de 20 a 25 minutos, de forma infrutífera, tentei por todos os meios falar com o árbitro, sem me abrirem a porta. Não tenho dúvidas que só a influência e o poderio institucional da Federação alemã proporcionou o desfecho deste incidente. Basta ver os incidentes que acontecem todas as semanas por esse futebol mundial e comparar as sanções.

R ? Na memória ficou a imagem de Carraça e Jesus a rirem-se da situação. Não acha que foi altamente desajustado ao que se estava a passar?

AC ? Isso não é verdade. Não houve qualquer imagem do diretor do futebol a sorrir perante esses acontecimentos. Até porque entrei no relvado, e com o árbitro e dirigentes alemães recolhi logo ao túnel. Além disso, a situação não era para rir.

R ? Como define Vieira como líder?

AC ? É um presidente apaixonado pelo Benfica e pela sua função. Com enorme capacidade de trabalho, solidário, empenhado e com uma visão estratégica para o clube, para o futebol e empresas do grupo Benfica. Conseguiu regenerar por completo a situação financeira e empresarial do Benfica. Criou e construiu estruturas modernas, funcionais e de referência que o tornam num dos maiores clubes do Mundo. Quando obtiver sucesso desportivo, e acredito plenamente que o terá, será o presidente mais importante da história do clube.

R ? O que tem de fazer?

AC ? Terá de apostar, com tempo e estabilidade, em uma ou duas pessoas para trabalhar com ele no futebol. Se virmos o que se passa nos clubes de maior sucesso na Europa e no Mundo, as estruturas pensantes do futebol são compostas pelo presidente e por mais uma ou duas pessoas da sua total confiança. E que trabalham juntos durante mais de uma década. Que assumem, por inteiro, o controlo executivo das áreas do futebol. Sem interferências internas, de administradores, diretores, funcionários, etc. E sem interferências externas, de amigos, empresários, jornalistas, comentadores, que constantemente enviam emails e fazem telefonemas a darem a sua opinião, desajustada do que é a realidade, e que por vezes podem influenciar decisões. A estabilidade e a confiança são fundamentais para atingir o sucesso! Em dez anos, quantos responsáveis pelo futebol teve o Benfica? Que me lembre, quatro ou cinco.

R ? Entendeu-se sempre bem com ele?

AC ? O meu entendimento com Luís Filipe Vieira teve, tem e terá como bases a verdade, o respeito, a comunicação, o profissionalismo, a lealdade e a amizade. Ele sabe que lhe digo sempre o que penso. Mesmo que fique desempregado. Sabe que não defendo interesses pessoais e que acima de tudo está a equipa, o Benfica e a confiança que depositou em mim. Sabe que assumo sempre o que digo e o que faço. Sabe a paixão que tenho pelo meu trabalho. E sabe também que sou profissional do futebol há 40 anos, não tenho fortuna pessoal e nunca ganhei milhões de euros por ano, por isso necessito de trabalhar para viver, mas isso não me impede de ser independente no pensamento e nas decisões e que existem coisas que o dinheiro não compra!

R ? Sentiu-se sempre respaldado por Vieira?

AC ? Sempre me apoiou e me deu, a mim, à estrutura, aos jogadores e à equipa técnica, as condições de excelência de que necessitávamos para ganhar tudo. Sempre apoiou as minhas decisões.

R ? Foi alguma vez desautorizado ou desrespeitado pelo presidente?

AC ? Nunca isso aconteceu, durante os seis anos em que me deu a honra e o privilégio de trabalhar no Benfica e com ele.

R ? Há quem diga que Vieira sacode as responsabilidades quando as coisas correm mal. Concorda?

AC ? De forma nenhuma. Assume as responsabilidades dos seus atos e decisões. E é isso que todos os benfiquistas esperam dele. Por isso votaram em massa no seu projeto e na sua pessoa. Comete erros? Claro que comete! Mas segue em frente, retirando ilações e dando a cara e o peito às balas.

R ? Abandonou o Benfica em junho, mas só recentemente rescindiu o contrato. Porquê?

AC ? O timing foi definido pelo presidente e por mim. Ressalvo o facto de o Benfica ter cumprido todas as responsabilidades a seu tempo assumidas. No Benfica, a palavra e a honra fazem parte do seu código de conduta!

R ? Teve esperança de voltar?

AC ? O meu ciclo Benfica terminou. Com orgulho, prazer e tendo a certeza de que a minha passagem marcou algumas pessoas. Assim como elas me marcaram a mim. Não posso esquecer que muitas delas trabalharam comigo na formação, entre 2004 e 2008, e fui encontrá-las agora no futebol profissional. Assim como dezenas de jovens jogadores que nesses anos iniciaram o seu processo formativo e hoje são promessas do futebol português: Ivan Cavaleiro, Miguel Rosa, Bruno Varela, João Cancelo, Hélder Costa, Bernardo Silva e muitos outros.

R ? Ficou marcado logo no primeiro dia por ter afastado dois dirigentes do campo de treinos.

AC ? Marcado? Porquê e por quem? Não dei, nunca o fiz e nunca darei importância a esses ?fait divers?. Quem me conhece e quem trabalhou comigo, sabe que levo muito a sério o meu trabalho. Que imponho regras de funcionamento, no que concerne à proteção do grupo e blindagem da estrutura, de que não abdico. Que só frequentam os espaços da equipa quem dela faz parte. Toda a gente sabe que sou uma pessoa educada e respeitadora, que não invade o espaço de ninguém. E por isso exijo o mesmo!

R ? Há quem considere que abusou da sua autoridade.

AC ? Sou frontal e direto sempre que tenho de tomar qualquer posição e digo sempre o que penso, cara a cara, olhos nos olhos. Ao contrário de algumas figuras decorativas, ?papagaios? pequeninos, feios e vulgares, de interesses duvidosos e que vagueiam no universo Benfica de forma sorrateira e interesseira, aproveitando todas as oportunidades para aparecerem na fotografia e na televisão. E que, cobarde e intelectualmente mentirosos, desrespeitaram o meu trabalho e o do meu grupo e de forma maldosa teceram comentários acintosos e de falta de solidariedade institucional.

R ? Quem são os papagaios?

AC ? Todos os que estão atentos ao que se passa no clube, sabem a quem me refiro. O que se pode esperar de indivíduos que deixam o seu presidente sozinho, depois de uma derrota humilhante na final da Taça? O que se pode esperar de indivíduos que, mesmo ao lado do gabinete do presidente, traçam cenários de substituição presidencial para as próximas eleições? E, por favor, gostaria de ficar por aqui!

R ? A esta distância consegue explicar por que é que o Benfica falhou nos momentos decisivos?

AC ? Num processo coletivo, todos perdemos e todos ganhamos. É assim que entendo o trabalho de equipa. Onde todos contribuem com os seus conhecimentos, valências, decisões e responsabilidades para o sucesso. Também por isso, todos somos responsáveis, uns mais do que outros, pelos insucessos do coletivo. Mas não poderei, seria hipócrita da minha parte e iria contra as minhas convicções e ideais, no que entendo serem os interesses do Benfica, e porque dei conhecimento, em relatórios escritos ao presidente, deixar de assumir as principais razões por que falhámos nos momentos decisivos: por erros técnicos do treinador Jorge Jesus!

R ? Que erros técnicos?

AC ? Erros técnicos e de decisão duvidosa em jogos nucleares! Por incorreta e pouco inteligente gestão do plantel no que diz respeito à utilização de jogadores fundamentais em jogos onde poderiam e deveriam ser poupados! Por incorreta e insensível utilização de jogadores em treinos e jogos com alguma debilidade fisiológica. Esta é a verdade nua e crua. É a minha verdade.

R ? E nunca confrontou Jesus com esses erros?

AC ? Sempre que o treinador me pedia a opinião, eu dava-a. É importante que os treinadores tenham consciência de que também erram, e que essa consciência, discutida e analisada internamente, possa ser o caminho para a regeneração e para o êxito no futuro. Até porque as suas constantes más decisões podem pôr em risco investimentos de dezenas de milhões de euros.

R ? No final da época não deu conta aos seus superiores hierárquicos do que estava mal e do que deveria ser mudado?

AC ? Sempre reportei ao presidente. E é assim que terá de ser. Só poderemos ter sucesso com duas ou três pessoas a liderarem as áreas do futebol. A informação e o acesso têm de ser cerceados e limitados. E as decisões têm de ser rápidas e corretamente concretizadas. E sem desvios! Porque sempre assumi o que dizia ou fazia, elaborava frequentes documentos escritos a Luís Filipe Vieira, e nos dois finais de épocas entreguei relatórios com mais de 200 páginas. Analisando a atividade, assumindo erros, fazendo críticas, apresentando soluções e caminhos e, em ambos, pondo o lugar à disposição.

R ? E nesse sentido que indicações deu?

AC ? A análise foi pormenorizada e assentou em bases e princípios definidos no início da época. Todos sabíamos o que fazer. Todos sabíamos o que não podíamos fazer e o que não podíamos repetir no segundo ano. As minhas propostas foram sempre alicerçadas em dados concretos. Mas para haver mudança e evolução, temos todos de as querer. De saber trabalhar em grupo. Respeitando o trabalho e responsabilidades dos outros. Respeitando e aceitando a diferença. Ter a real consciência de que não sabemos tudo e que não controlamos tudo. Ter envergadura moral e intelectual, de forma a termos a admiração dos nossos pares. E ser solidário! E interiorizar, em todos os momentos, de que trabalhamos no Benfica. E que somos escrutinados por isso.

R ? Ficou a ideia de que as suas relações com Jesus foram sempre difíceis e conflituosas. Foi assim?

AC ? Todas as pessoas, na sua génese, têm formação e educação diferentes. E por isso adotam comportamentos e relacionam-se com os outros também de forma diferenciada. Tal como já referi, a minha forma de trabalhar tem como base o envolvimento coletivo, em que cada um desenvolve o seu trabalho o melhor que sabe e pode, assumindo as suas responsabilidades a quem lidera. E foi assim com a minha estrutura e com a estrutura técnica. Todos sabíamos qual a nossa função e em que áreas éramos os responsáveis.

R ? Nunca se meteu onde não devia?

AC ? Eu nunca me intrometi ou me intrometo na área técnica, até porque tenho a vantagem e a sensibilidade de ter sido treinador. Mas também, por isso, nunca admiti ou admito que alguém se intrometa na minha área de responsabilidade e gestão. Quem não entender isto, não tem condições para trabalhar num clube como o Benfica. Com a minha estrutura, tudo funcionou perfeitamente e a qualidade do trabalho desenvolvido é prova disso. Fomos uma equipa!

R ? É verdade que quase chegou a vias de facto com o treinador? Em que circunstâncias?

AC ? Para fazermos vincar a nossa autoridade não é necessário chegarmos a situações de conflito direto. Por isso somos seres racionais e inteligentes. E quando confrontados com seres menos inteligentes e menos racionais, só temos de fazer valer essa grande diferença nos nossos atos e posturas. Além isso, eu era o representante do Benfica e do presidente!


R ? Domingos Soares Oliveira tem um papel relevante no Benfica. Vê-o como um possível candidato à presidência?

AC ? De forma nenhuma. Primeiro, porque não o poderá ser tão depressa, pois presumo que só tem cerca de dez anos de associado; e depois porque a função que ocupa na hierarquia ? presidente da comissão executiva ? já lhe dá todo o poder executivo para liderar em quase todas as suas áreas. E porque as suas decisões e atos executivos não têm o escrutínio público, e não são penalizados, já que é Luís Filipe Vieira quem responde publicamente por toda essa gestão, não vejo razão para alterar o seu estatuto. Até à minha saída, Domingos Oliveira controlava todo o aparelho do clube e empresas associadas com profissionais escolhidos por ele e da sua confiança. Exceto o futebol profissional ? equipas A e B ?, cujo responsável era o diretor do futebol, que reportava somente ao presidente.

R ? Após a sua saída, assumiu mais responsabilidades no futebol.

AC ? Sim, começou a ter uma palavra também no futebol profissional, sendo agora normal reunir-se assiduamente no Seixal com o responsável da formação, que tem a equipa B a seu cargo, e com Lourenço Coelho. Acredito, com as diretrizes do presidente. A verdade é que não existe, em nenhum clube do Mundo, um quadro que detenha tanto controlo e poder em todas as suas áreas desportivas e empresariais. Não estou a tecer qualquer crítica, até porque é claramente uma opção do presidente. Trata-se de uma mera constatação de um sócio do Benfica.

R ? Manteve com ele uma boa relação?

AC ? Mantive com todos os profissionais e colaboradores do clube uma relação cordial, respeitadora e profissional. Mas, volto a referir, só trabalhei seis anos no Benfica como responsável pelas minhas áreas e sempre a reportar somente a Vieira. Estamos a falar de futebol!

R ? Foi conhecido o seu mau relacionamento com quase todos os elementos da direção do Benfica, à exceção do presidente. Não foi uma imprudência assumir a postura do quero, posso e mando?

AC ? Isso não é verdade. Não sou, nem nunca fui, um líder do quero, posso e mando. Liderei sempre com diálogo, justiça, verdade, constante interação entre todas as áreas do departamento, solidariedade e assumindo sempre uma lógica coletiva. Basta falar com os meus antigos colaboradores. Podem dizer, por outro lado, que sou exigente, rigoroso, intenso, chato por vezes, que sei o que quero e como quero, que não sou permeável a pressões e influências e acima de tudo independente nos meus pensamentos, atos e decisões! Em relação a esse pretenso mau relacionamento com os dirigentes, não sei do que se trata. Até porque os nossos contactos eram esporádicos. E porque o meu trabalho e área de ação não colidia com o seu espaço.

R ? Não era essa a impressão que passava...

AC ? Acredito que não seja o tipo de diretor a que sempre estiveram habituados. Além do presidente, a quem reportava, não permito interferências na minha área de responsabilidade nem discuto ou abro espaço para comentários sobre o futebol profissional. Não vou a jantares ou almoços em grupo ou frequento locais noturnos. Não contrato pseudobruxos ou pseudovidentes africanos, acreditando que assim posso influenciar resultados e ganhar jogos. Comigo não existem confusões e agressões nos túneis, já que essa é também uma área onde só está quem trabalha com a equipa. Nunca pressionei ou tentei influenciar, na competição ou fora dela, qualquer árbitro, já que defendo o respeito, a confiança e a independência entre ambas as partes e acredito que o Benfica não necessita disso para ganhar. E porque ganhar com batota não faz sentido e não tem qualquer valor. Não estabeleço ligações pessoais com jornalistas ou opinadores, no sentido de trocar informações e retirar proveitos pessoais e fazer assim lóbis de influência. Por tudo isto, é normal que existam pessoas que possam não gostar do meu perfil de profissional.

R ? Jesus nunca aceitou com agrado a sua presença na estrutura?

AC ? Terá de perguntar ao senhor treinador. Mas essa questão para mim não era e não é de todo importante.

R ? O treinador imiscuiu-se na sua área de ação?

AC ? Nunca lho permiti ou permitiria. Os treinadores têm de compreender que são responsáveis pela área técnica. E é nessa área que têm de se focar, para poderem desenvolver o seu trabalho com os jogadores. Claro que terá de existir um polo de comunicação constante, solidário, leal e construtivo entre o treinador e o diretor. Porque só assim o trabalho sai solidificado e forte e só assim será possível o clube ganhar.

R ? O diálogo com o treinador foi fácil?

AC ? Ninguém sabe tudo. Ninguém pode ter a arrogância de julgar ter o conhecimento único e total. Quando os treinadores têm essa atitude, acontece o descalabro. O fracasso. E num clube como o Benfica, aconteceu um terramoto de enormes proporções.

R ? Jesus é um treinador muito invasivo?

AC ? O treinador do Benfica tem enormes capacidades técnicas, conhece o jogo, é intuitivo, mas não quer trabalhar em equipa. É individualista e tem pouco sentido de respeito social, por isso prejudica a equipa, os jogadores e o clube. Se algum dia quiser e entender que o seu trabalho só melhora com o contributo e a qualidade individual dos profissionais que o rodeiam, não tentando intrometer-se nas áreas em que não tem valências e conhecimentos e quando se relacionar com os outros de forma respeitadora e educada, poderá ser um dos melhores treinadores o Mundo. Mas não acredito que o queira ser. Até porque foi assim que se tornou treinador do Benfica durante pelo menos cinco anos e é milionário!

R ? É um facto que Jesus cria profundo desgaste na relação com os jogadores?

AC ? Se um psicólogo analisar os comportamentos públicos do treinador do Benfica, se analisar as reações dos atletas durante os jogos a esses comportamentos e verificar como reagem em situações de jogo, temos a resposta.

R ? Recebeu muitas queixas dos jogadores?

AC ? Não irei de forma alguma falar sobre assuntos que abordei com os jogadores do Benfica em privado e no desenrolar das nossas atividades profissionais.

R ? Teve de gerir muitas situações de conflito provocadas pelo feitio de Jesus?

AC ? Sim, mas essa também era uma das muitas minhas funções. E tais ocorrências nunca foram públicas. Sinal de que a estrutura funcionava.

R ? Assumiu-se como o ?polícia? do balneário do Benfica. Foi isso?

AC ? Essa é uma ideia ridícula e disparatada. O meu relacionamento com os jogadores sempre se pautou dentro de um grande respeito mútuo, elevado profissionalismo, solidariedade, comunicação diária, amizade, cumplicidade e claro sentido de responsabilidade. Todos eles sabiam qual o seu papel e o papel do diretor. Quando existia motivo para um abraço e um elogio, eu dava-o. Quando existiam razões para uma chamada de atenção, uma crítica ou uma sanção, sempre de forma direta e esclarecedora ela acontecia. E sempre com sentido de justiça.

R ? Houve quem o visse como o ?bufo? do presidente. Quer comentar?

AC ? Essa é outra imagem acintosa e vulgar da minha função, lançada com propósitos claros, por pessoas que nunca trabalharam numa SAD e principalmente numa com a dimensão do Benfica. O meu ?report? ao presidente era natural, dentro do que foi determinado. Mas isso acontece em todas as grandes marcas e empresas pelo Mundo inteiro.

R - Foi jogador, treinador, presidente do sindicato, dirigente de clube. O que lhe falta fazer?

AC - São 40 anos de profissional de futebol. Queria ser cirurgião e apaixonei-me por este jogo. E não estou arrependido. Tudo o que sou, como homem, como cidadão e como profissional devo-o ao futebol e à minha família. À minha única, mágica e especial família que em todas as fases boas e menos boas da vida, estiveram ao meu lado. E continuarão a estar! Nunca me pus em bicos de pés na minha vida. Sempre tentei ser o mais discreto possível, tanto pessoal como profissionalmente, porque acredito que assim o trabalho de todos funciona melhor. Mas hoje, vou ser um pouco individualista, ao assumir, de que tenho um percurso profissional no futebol que poucos têm. E de que me orgulho! Como jogador, treinador e dirigente nacional e internacional. Mas tenho consciência de que ainda terei de fazer muito mais para sentir-me realizado. O que poderei fazer? Tudo, excepto ser algum dia presidente de clube...

R - Regressou ao Benfica para uma missão específica no futebol profissional. O que lhe pediu Vieira nessa altura?

AC - Regressei, penso que pelo meu perfil pessoal e profissional e pela minha experiência, para liderar uma estrutura e um grupo fantástico de atletas, que queria a todo o custo ganhar e ter sucesso desportivo. Queria e quer títulos. Tem fome de títulos! Com novos métodos de trabalho e de funcionalidade. Com uma lógica motivacional constante. Mais responsabilidade e disponibilidade. E sempre com grande paixão e prazer pelo nosso trabalho. Como entendo qualquer projeto dentro de uma lógica coletiva, fui mais um a contribuir para que conseguíssemos os títulos tão ansiados.

R ? Sim, mas o que lhe foi pedido em concreto?

AC - O documento que me foi entregue em Junho de 2011, "Futebol Profissional -Modelo Organizativo" determinava com precisão, todas as funções, de todos os profissionais da minha Estrutura e do próprio diretor do futebol profissional, a quem reportavam - a mim - que deveres e obrigações tinham, a quem eu reportava - somente a Vieira- e por isso, ficou muito claro a toda a gente, quais as áreas de competência e responsabilidade que me eram adstritas.

fonte:record

3 comentários:

  1. Boa tarde, obrigado por ter disponibilizado o artigo.
    Alguém sabe quem são os dirigentes e outras pessoas como empresários, colunistas, etc que se refere António Carraça?
    Saudações benfiquistas

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Isso era o k ele divia ter dito,mas como sempre falam falam mas escondem-se arás de meias palavras.
      Um abraço

      Eliminar
  2. Um deles será o idiota do Gomes da Silva, certamente..

    ResponderEliminar