Terão, porventura, reparado como este Mundial é exemplar no que diz respeito ao fim das guedelhas ao mais alto nível. Mais alto nível que o de um campeonato do mundo de futebol não há nem pode haver e o que também não há, porque deixou de haver, são cabelos compridos ou quaisquer espécies de melenas em campo. Desde que o futebol passou a ser uma indústria global tão avassaladora nos seus milhões, os futebolistas de elite, muitos deles ultra-milionários, descartaram automaticamente aquelas velhas irreverências de um passado não muito distante. O cabelo, hoje, quer-se curtinho. O futebolista que ambiciona o respeito ao público e que deseja impor o seu estatuto individual entre os companheiros deverá entregar o seu cabelo nas mãos de um barbeiro munido de máquina zero. Admite-se, como já se viu, uma sugestão de poupa como a do polaco Lewandowski, um traço minimal a verde a descolar da testa como o do nigeriano Troost-Ekong ou uma pequena coroa capilar em tons de louro como a do costa-riquenho Kandall Waston mas guedelhas compridas é que já não se aceitam, por amor de Deus. Cabelos curtos, sim, mas com um toque individual que exige sempre muito do barbeiro por mais do que óbvia falta de material. Penteia, cada um a seu gosto, o pouco pelo que houver para pentear e, assim, se afirma o carisma do futebolista moderno. Terá sido Cristiano Ronaldo a lançar a moda? É bem provável que sim.
O desalinho apenas aparente dos cabelos do brasileiro Marcelo e do egípcio Salah é a exceção permitida a indivíduos francamente especiais porque, ninguém duvide, requer grande descaramento mandar às malvas as convenções do momento e persistir num volume e, sobretudo, num despenteio que é todo ele uma proeza. Entre os nossos também não se registam devaneios neste capítulo. Bruno Alves esconde com elásticos todos os cabelos que tem a mais. Surpreendente apenas a decisão de Pepe, fabulosamente a contraciclo, que decidiu deixar crescer o cabelo quando os demais o decidiram cortar. Foi, portanto, com alguma melancolia que se assistiu ao afastamento do Perú tendo em conta que o seu treinador, o argentino Ricardo Gareca foi o único sujeito que se apresentou de cabeleira longamente escorrida nos palcos da Rússia mantendo-se fiel ao corte e ao estilo com que se estreou como jogador do Boca Juniors no já distante ano de 1978.
Que este relambório sirva – como se deseja – para fazer a vontade ao novo treinador do Sporting, o senhor Mihajlovic, que acha que as mulheres não devem falar de futebol. Ora isto não é futebol, é história das tendências na cultura popular no século XXI.
Leonor Pinhão, in Record
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