"O novo regulamento que regula a atividade dos agentes de futebol propõe, entre outras medidas, a imposição de tetos máximos às comissões que estes agentes passarão a poder cobrar aos seus clientes, medida que está a causar celeuma
O novo regulamento que regula a atividade dos agentes de futebol ainda não entrou plenamente em vigor e já tem sido alvo de contestação por parte de alguns dos seus destinatários. A medida mais controversa, que iniciará a sua vigência a partir de 1 de outubro de 2023, está relacionada com a imposição de tetos máximos às comissões que estes agentes passarão a poder cobrar aos seus clientes, embora outras alterações estejam também contestadas, entre as quais as que respeitam aos novos critérios previstos para a admissão da dupla representação ou às novas regras que passarão a regular a interação dos empresários desportivos com os atletas menores de idade.
Percebe-se a razão da celeuma: ao estabelecer limites, nalguns casos, de 3% sobre o valor do salário anual do jogador (quando em representação deste), ou de 10% quando em representação do clube vendedor, a FIFA impõe valores que se situam claramente abaixo do que vem sendo prática no ramo, estando em causa uma medida que poderá vir a ser considerada restritiva do direito ao desenvolvimento da atividade profissional destes agentes, para mais, num setor em que nenhum outro profissional sofre idênticas limitações. Nesse sentido, a própria legitimidade da FIFA para impor esses limites poderá ser questionada, quando parece incontroverso que a mesma já não a teria para fazer o mesmo quanto a outros profissionais que igualmente exercem a sua atividade no setor do futebol, como é o caso dos médicos ou dos advogados, entre outros.
Por sua vez, a fixação de diferentes escalões para as comissões dos agentes – consoante estes ajam em representação dos jogadores ou dos clubes, sendo os limites tendencialmente superiores neste último caso – alimenta um justo receio de que os agentes passem a sentir maiores incentivos para atuar do lado dos clubes, em claro detrimento dos jogadores, com o efeito indesejado de desproteção destes últimos nas negociações relativas às transferências e/ou à celebração de contratos de trabalho desportivo.
Do mesmo modo, no que respeita às medidas de proteção dos jogadores menores de idade, o novo Regulamento de Agentes da FIFA veio estabelecer que um agente de futebol não poderá abordar um jogador antes dos seis meses anteriores à data em que este atinja a idade permitida para celebrar o seu primeiro contrato de trabalho no país em que se pretende que este venha a ser contratado. O conceito de abordagem ao jogador é, aliás, definido em termos bastante amplos, englobando quer contatos diretos, quer indiretos com familiares, amigos ou pessoas relacionadas com o jogador. Sucede que, sabendo-se ser muitas vezes prática dos clubes formadores iniciarem conversações com os seus atletas mesmo antes do ano em que estes atingem a idade legal para celebrar o seu primeiro contrato de trabalho, a medida preconizada pela FIFA corre igualmente o risco de produzir um resultado inverso ao desejado, desprotegendo estes jogadores – vedando-lhes a possibilidade de representação – justamente no momento da celebração do seu primeiro vínculo profissional.
Finalmente, no que respeita à dupla representação, o novo regime, embora vedando tendencialmente a representação de mais do que uma parte numa mesma negociação – o que é de enaltecer, pois com isso se prossegue um objetivo de mitigação das possibilidades de ocorrência de conflitos de interesses nos mercados de transferências–, contempla, porém, uma exceção a esse princípio, admitindo-se que um agente atue simultaneamente em representação do jogador e do clube comprador dos seus direitos. Estando em causa uma evidente duplicidade de critérios, que tem sido compreensivelmente alvo de algumas objeções, caberá à FIFA justificar os critérios que presidiram a essa diferenciação.
Aliás, para fazer vingar uma parte significativa das soluções impostas no novo regulamento, designadamente no contexto de alguns processos judiciais que já foram publicamente anunciados, a FIFA ver-se-á certamente forçada a justificar os objetivos que se propõe alcançar com as suas medidas, demonstrando que as mesmas se revelam justas, adequadas e proporcionais face a esses fins."
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