Em clima pré-eleitoral, reuniram-se todas as condições para a AG do último sábado fosse um barril de pólvora. Porém, nada desculpa a falta de democracia, respeito e urbanidade verificados. Foi a primeira vez que isto aconteceu na AG de um clube? Não. Foi a primeira vez que isto aconteceu numa AG do Benfica? Não. Quem saiu mais favorecido? O mais vitimizado: Luís Filipe Vieira...
Num clube com centenas de milhares de sócios, sendo que cerca de 120 mil, por terem mais de 18 anos e as quotas regularizadas, têm capacidade eleitoral (são esperados mais de 50 mil votantes nas próximas eleições), não faz sentido nenhum que decisões importantes sejam tomadas em Assembleias Gerais que não recolhem, sendo generoso, mais do que um milhar de participantes, mais militantes, e residentes, ‘grosso modo’, na Grande Lisboa. Aceitar como boa esta realidade, e, nos novos estatutos, terem passado ao lado da possibilidade de criarem uma assembleia de delegados, que seria representativa do verdadeiro universo encarnado, pareceu-me sempre, a primeira um contrassenso e a segunda uma oportunidade desperdiçada. Dito isto, as lamentáveis cenas ocorridas na última reunião magna do Benfica, não foram novas, nem foram originais, perante uma plateia de ideias já formadas (foram chumbadas contas com um lucro de 40 milhões!), que esteve presente, mais do que para ouvir fosse o que fosse, - permitindo que algumas franjas radicais (não tomemos a parte pelo todo), assumissem comportamentos que não desdenhariam a quem provocou os tumultos da AG do FC Porto, no estertor do regime de Pinto da Costa – para marcar posição eleitoral.
Quem foi o principal beneficiário da situação criada? Obviamente Luís Filipe Vieira, que ao ver-se inibido de intervir como queria, numa manifestação antidemocrática que deve ter feito corar de vergonha póstuma os autores do Hino do Benfica, «Avante, avante pelo Benfica», de 1929, censurado pelo Estado Novo em 1942, viu criadas condições para uma vitimização que só lhe pode ser benéfica. Creio que continua a haver quem confunde a bolha das AG’s com o País benfiquista real, mas os votos em urna a 25 de outubro dissiparão todas as dúvidas.
Para já, numas eleições que dependem também de variáveis imprevisíveis, como o são os resultados da equipa principal de futebol, parece tomar forma a possibilidade de haver uma segunda volta, havendo quatro candidatos – João Diogo Manteigas, Luís Filipe Vieira, Noronha Lopes, e Rui Costa (aqui colocados por ordem alfabética) - que, pela notoriedade de que desfrutam no universo encarnado, surgem como mais candidatos que os restantes. Devo confessar que, com todo o respeito pelos órgãos de comunicação que as encomendam e publicam, e pelas empresas que as realizam, dentro de parâmetros de competência profissional, não acredito em sondagens para eleições em clubes desportivos. Daí que vá aguardar pelo que as urnas irão dizer a 25 de outubro...
Mas regressando à AG do último sábado, que teve cenas degradantes, haverá alguém que possa vir a terreiro dizer que não viu cenas igualmente deploráveis (podia falar de outros clubes, mas fico-me pelo Benfica) em reuniões magnas anteriores? Pela memória que tenho das últimas quatro décadas, retenho, como expoentes, uma AG no tempo de Fernando Martins, em que o presidente da Mesa da AG, Araújo e Sá, teve de recorrer a meios excecionais de dissuasão; recordo a AG da constituição da SAD, nos idos de Vale e Azevedo, em que imperou a tirania; e ainda, mais recentemente, aquela que envolveu fisicamente o presidente Luís Filipe Vieira e um associado. Para não falar do que sucedeu, noutras circunstâncias, fora dos holofotes da opinião pública...
Repito, na terceira década do século XXI, as Assembleias Gerais como foram pensadas em 1904 não fazem qualquer sentido, muito menos representam os sócios de um clube global, como o Benfica. Caberá aos benfiquistas decidir se querem viver sempre sob este estigma de instabilidade, ou se estão abertos a outras vias, já descobertas e aplicadas por ‘gigantes’, como o Real Madrid ou o Barcelona, que continuam a ser ‘clubes dos sócios’.
Nada disto terá influência nas eleições que se avizinham, onde a única coisa certa é a incerteza...
José Manuel Delgado, in a Bola

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