"Caro primeiro-ministro do XXII Governo Constitucional: eu sei que o Orçamento de Estado deve ainda ocupar grande parte do seu tempo e preocupações mas agora que o ano está a terminar gostaria de lhe pedir que olhasse para o nosso futebol com olhos de político e não de adepto. E recordasse que isto não é um mero desporto, antes uma actividade económica que tem um impacto a rondar os 0,3% do PIB, gerando receitas superiores a €499 milhões por época. Mas que poderia gerar muito mais (o que seriam óptimas notícias para Mário Centeno) e, consequentemente, ser menos poluído. Olhe para o que aconteceu aqui ao lado: a par de Portugal, Espanha era o país do top-10 do ranking UEFA que não tinha direitos televisivos centralizados (cada clube negociava por si). Real Madrid e Barcelona ganhavam 10 vezes mais que o último classificado (por cá a relação é de 14 para 1) e apesar do enorme poderio destes dois gigantes temia-se que o futebol espanhol entrasse em bancarrota. Foi aí que entrou em cena o poder central: em Maio de 2015, em conselho de ministros, saiu o decreto real que passava a centralizar os direitos. Abriu-se um concurso público para a venda do pacote como um todo e as receitas passaram de €600 milhões para €1800 milhões. Real Madrid e Barça continuaram a ganhar o mesmo (€155 e €166 milhões, respectivamente) mas o 20.º classificado passou a receber apenas 3,5 menos (em vez de 10 vezes menos). Ou seja, o Huesca (€44,2 milhões) ganha mais que qualquer um dos grandes em Portugal. Se a isto somarmos uma justiça desportiva muito mais assertiva (por exemplo, o Réus foi expulso três anos das competições profissionais por não pagar salários enquanto aqui andamos com jogos florais) compreendemos onde está o problema em Portugal: desigualdade, opacidade, instituições frágeis, muito ruído e pouca ópera. Isto só muda pela via política. Haja coragem. Feliz Natal."
Fernando Urbano, in A Bola
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