sábado, 22 de julho de 2023

EFAB⚽LAÇÃO (42) O AMARELO DE CRISTIANO RONALDO

 


"Os franceses enriqueceram o código desportivo ao darem a cor das páginas originais do “L’Équipe”, o jornal n.º 1 do desporto mundial, o significado de vitória, o amarelo dourado dos líderes e campeões, a camisola que distingue o primeiro do pelotão.
Mas os brasileiros, com o seu infinito talento para reinventar a língua portuguesa, ofereceram-nos o verbo “amarelar” para retratar o ridículo da falta de coragem perante os desafios da vida. É o amarelo negativo, do crepúsculo, do empalidecimento, da queda da folha - em contraste com a alegria irradiante da rainha Leopoldina imortalizada na bandeira e nas camisolas do “escrete”. A mesma cor tanto pode significar vitória (“nasr”, em árabe) como ocaso, luz e penumbra - dependendo do enquadramento e do ângulo de observação. Como comparar o amarelo triunfante de Jonas Vingegaard com o amarelo pálido de Cristiano Ronaldo.
Coincidência de verão, nestas semanas de emocionantes e agonísticos desafios nas montanhas de França, aprendendo os nomes intrincados dos novos heróis do pedal europeu, regressou o futebol no calor do Algarve com a apresentação da nova equipa do jogador que todos conhecem, um Cristiano Ronaldo em acelerado programa de propaganda a ensinar-nos em entrevistas diárias - como nunca o vimos na seleção nacional - a bem pronunciar Al-Nassr e a vender a camisola amarela de um dos vários emblemas do harém clubístico do Rei das Arábias. Habituados ao “peso” das camisolas históricas que Cristiano vestiu ao longo da carreira, foi um choque vê-lo de amarelo, a lembrar o Beira Mar de Eusébio, 40 anos atrás.
À primeira vista, parece o Rei-Sol, de brilho ofuscante. Mas depois, seguindo, penosamente, a sua marcha errática tentando sobressair como único soldado garboso numa parada de saltimbancos trôpegos, é o amarelo do outono que se sobrepõe aos nossos olhos, melancólico e triste. E lamentável.
Cristiano Ronaldo amarelou e ameaça prosseguir este desfile de “globetrotters” caducos, colhendo o aplauso e reconhecimento dos que nunca puderam vê-lo de perto no auge da carreira europeia, agora nos confins da Ásia, o derradeiro el-dorado, onde vai encher arenas nos próximos dois anos como o homem-bala na última digressão do circo de feras. Portanto, a camisola do Al-Nassr, o Vitória de Riade, a ser enxovalhada em sucessivos jogos frente a equipas de Ligas em perda de “qualidade”, como o Celta de Espanha e o Benfica de Portugal, nunca dará a Cristiano Ronaldo a dimensão de um n.º 1 do pelotão do maior desporto global.
Pelo contrário, é como um parasita à boleia da aura e da energia do jogador português para dourar aos olhos do mundo a infâmia de um regime sanguinário e medieval. Que, no entanto, também há-de cair de maduro."

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