quarta-feira, 29 de outubro de 2025

APOSTAS: O RISCO DE CORRUPÇÃO DO DESPORTO



No sábado decorreram as eleições no Benfica que resultaram numa 2.ª volta: Rui Costa teve 42,13% e Noronha Lopes 30,26%. Pode parecer serem favas contadas para o atual presidente, mas não esqueçamos que, em 1986, Freitas do Amaral ganhou a 1.ª volta das Presidenciais com cerca de 46%, bem acima dos 25% de Mário Soares. Na 2.ª volta, contra todas as apostas, Soares ganhou com 50,7%, superando os 48,4% de Freitas. História, simbolismo ou futuras possíveis coincidências à parte, em quem aposta, o caro leitor, para ganhar a presidência do Benfica? A verdade é que antes do dia das eleições, quem quis pôde apostar no resultado. E agora, na 2.ª volta, pode fazê-lo de novo.
A possibilidade de apostar em eventos desportivos, cujo resultado é influenciável pelos próprios protagonistas — jogadores e árbitros —, é, no mínimo, controversa. Hoje, a própria Liga portuguesa é patrocinada por uma casa de apostas. Um sinal dos tempos. Mas nem sempre foi assim.
Durante anos, as apostas desportivas foram ilegais em Portugal. A internet veio mudar tudo: tornou-se impossível travar o fenómeno num mundo onde há sempre um país em que é legal apostar — e onde se aposta até nos mercados onde isso é formalmente proibido.
Os números ajudam a perceber a dimensão do negócio. Estima-se que, na Liga dos Campeões, o volume de apostas em 2022/23 tenha rondado os 225 milhões de euros. Em Portugal, calcula-se que, por jogo, se apostem cerca de 899 mil euros na Liga e 282 mil na Liga 2. São valores enormes — e sempre que há muito dinheiro envolvido, há quem tente manipulá-lo. Por exemplo, nos EUA, na semana passada, mais de 30 pessoas, incluindo um treinador e um jogador da NBA, foram presas pelo FBI na sequência de investigação ao jogo ilegal.
É por isso que se torna essencial definir regras claras para impedir qualquer tentativa de influência sobre os resultados. A lei portuguesa é inequívoca. O artigo 20.º da Lei n.º 14/2024, conhecida como Lei da Integridade do Desporto, estabelece que «quem atuar no sentido de influenciar as incidências ou os resultados de um jogo, evento ou competição desportiva, com o propósito de obter uma vantagem em aposta desportiva, é punido com pena de prisão até cinco anos».
E vai mais longe: o artigo 21.º proíbe expressamente jogadores e árbitros de apostarem em competições nas quais participem ou estejam envolvidos, punindo a infração com pena de prisão até três anos. As normas da Federação Portuguesa de Futebol são igualmente claras e reforçam estas restrições.
O caso Jogo Duplo, que investigou práticas de match fixing em Portugal, terminou com cinco arguidos condenados a penas de cinco e seis anos de prisão. Um sinal de que as autoridades estão vigilantes — e de que a integridade do jogo é levada a sério.
Porque o futebol, e o desporto em geral, vivem da imprevisibilidade. Da emoção de não sabermos o que vai acontecer. Se o público começar a duvidar de que cada equipa está a dar o seu melhor, o espetáculo morrerá. Apostar é legítimo. Corromper o jogo não.
O Direito ao Golo esta semana é dos adeptos do Benfica. 85 mil foram votar em liberdade. 85 mil mostraram elevação. Liberdade e elevação são duas palavras que poderiam descrever Francisco Pinto Balsemão. A minha pequena homenagem ao grande homem que foi.

João Caiado Guerreiro, in a Bola 

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