"Sou homem de fé, religiosamente falando, mas não alimento qualquer fezada, desportivamente escrevendo na vitória neste campeonato.
O FC Porto ganhou o jogo na Luz e deu um passo avantajado na conquista do título. O Sport Lisboa e Benfica, tetra-campeão nacional - é bom não o esquecer, como fingem alguns mais desmemoriados - deixou de depender dos seus próprios jogos. O jogo foi equilibrado, com algum ascendente do Benfica na primeira parte e do Porto no segundo tempo. Desta vez, a sorte esteve do lado dos azuis e brancos, no único remate enquadrado com a baliza de Bruno Varela, que teve uma tarde relativamente desafogada. Tal como Casillas, se exceptuarmos os remates de Cervi e sobretudo de Pizzi ao cair da primeira parte que, aliás, poderia ter feito bem melhor.
Temos de saber aceitar os desaires, ainda que com a tristeza e desilusão que os envolve. Todos querem ganhar e nem sempre se pode vencer.
Podemos agora chorar a ausência de Jonas, que, creio, poderia ter tornado o jogo diferente. Mas o futebol é mesmo assim, com este tipo de contingências que podem surgir a qualquer momento. Já o treinador do Porto, com a chico-espertice habitual no reino do futebol, fez um enorme bluff com as lesões de Maerga e Corona, que, afinal, recuperaram num ápice milagroso.
Sentiu-se sempre que o Benfica não conseguiu superar o trauma dos jogos com o Porto, no Estádio da Luz. Apesar do notável apoio do público encarnado, pairou no ar a recente tradição de que não se tem conseguido vencer este clássico, ainda que na última derrota (2016) e dois empates (2015 e 2017), o Benfica se tenha sagrado justamente campeão.
O Benfica rematou muito pouco e só se ganham jogos olhando para a baliza. Lamento dizer, mas, na minha modesta opinião, Rui Vitória errou nas substituições, sobretudo na terceira que me pareceu inexplicável. Estando o resultado em 0-0 a poucos minutos do fim que era, apesar de tudo, menos mau para o Benfica que seguiria na frente e dependendo de si próprio (e até com dois nulos lá e cá, logo com uma ligeira vantagem de goal-average que poderia ser importante em caso de igualdade pontual no fim da Liga), tirar Pizzi para colocar Seferovic, que pouco ou nada tem feito, poderá ter estado na origem do golo portista. Onde Herrera foi feliz no chuto era onde Pizzi certamente andaria se estivesse em campo. Tratou-se de uma substituição apenas desportivamente correcta, como quem diz, não estou satisfeito com o empate, vai daí mais um atacante...
Sou homem de fé, religiosamente falando, mas não alimento qualquer fezada, desportivamente escrevendo, na vitória neste campeonato. Seria preciso ganhar todos os jogos e ver o FCP perder um jogo, sendo que, em teoria, só tem um jogo com alguma dificuldade no Funchal. Já nós, benfiquistas, com esta derrota iremos provavelmente disputar em Alvalade o direito ao segundo lugar do pódio que possibilita a oportunidade para entrar na fase de grupos da Liga dos Campeões.
Uma última palavra sobre a escolha do árbitro. Já não sei há quanto tempo e há quantos jogos este clássico é arbitrado por juízes da Associação do Porto, depois do tempo em que o lisboeta Pedro Proença sistematicamente prejudicava o Benfica. Será que não há outros árbitros que possam estar nestes jogos? O resto é tudo refugo só para os jogos menores? Se o critério é o de serem internacionais (até parece que só há os dois da A. do Porto), veja-se a ausência do Mundial de juízes portugueses, que fala eloquentemente sobre isso.
O certo é que Artur Soares Dias nunca mais foi o mesmo árbitro desde as brutais pressões se não directamente físicas, assaz psicológicas e familiares de que foi alvo (e outros) no Centro da Maia. Os sempre invocados e-mails do SLB mais parecem 'pressões de meninos de coro' quando comparados com as sevícias que foram levadas a cabo por energúmenos que, tal zelosos intermediários de outros poderes, há muito deveriam estar afastados. Permitam-me trocadilho: água dura em pedra mole, tanto dá até que muda!
No jogo propriamente dito, se exceptuarmos a evidente penalidade ao minuto 92 cometida contra Zivkovic (no Dragão e a favor do FCP, como teria sido a decisão?) não se pode dizer que o Benfica perdeu por causa do homem do apito. Mas lá que foi uma arbitragem medrosa, quiça manhosa, nos lances em que a decisão poderia cair para um lado ou para o outro, lá isso é verdade.
Ruth
Pude ver em ante-estreia o filme Ruth que passará a partir de Maio nos cinemas portugueses. Trata-se de uma magnífica realização de um jovem, António Pinhão Botelho, filho de Leonor Pinhão e de João Botelho. É caso para dizer que «filho de Botelho, sabe filmar».
O filme relato-nos, com dinâmica e rigor, a saga da vinda de Eusébio da Silva Ferreira para o Benfica nos já longínquos anos de 1960 e 61, após uma disputa taco-a-taco com o Sporting. O título do filme Ruth é simbolicamente feliz, pois foi com o nome falso de Ruth Malosso que o então promissor Eusébio viajou de avião para Lisboa, assim se antecipando ao seu eterno rival.
Gostei da obra. Não apenas e sobretudo por se tratar de uma história em que o meu clube escreveu o seu futuro, mas fundamentalmente porque nos possibilita fazer uma viagem no tempo, com peripécias hoje inimagináveis, com meios e instrumentos de persuasão e influência que agora seriam pré-históricos, com as quase ingénuas regras no tráfico de influências entre os venerados poderes administrativos, futebolísticos e políticos naqueles annus horribilis do Estado Novo.
Magnífico é o modo como nos é apresentado o ambiente da então Lourenço Marques, entre apaniguados dos dois clubes, entre as diferentes classes sociais de Moçambique daquele tempo, entre a propaganda e a utopia, entre o café dos brancos e a rua dos negros. Como disse o realizador, «o filme não é sobre futebol, nem sobre o Benfica ou Sporting. O filme é sobre uma pessoa, um país, uma época».
Um pormenor que gostaria aqui de partilhar. No fim do imbróglio da vinda de Eusébio para o Benfica, este teve de pagar ao Sporting de Lourenço Marques a quantia de 400 contos. Fiquei curioso em saber a que corresponderia hoje aquela importância. E, de acordo com a conversor da Pordata, equivaleria a 174.633,84 euros (cerca de 35.000 contos em moeda antiga). Como se constata, outros tempos em que o esbanjamento não era o que é hoje! E uma pechincha para o incomparável e eterno Eusébio da Silva Ferreira!
Excelente, em suma. E uma brilhante interpretação do jovem Igor Regalla, no papel de Eusébio então em trânsito para Lisboa.
Contraluz
- Arbitragem: Em Chamartin, no jogo Real Madrid - Juventus.
Os espanhóis continuam a ser escandalosamente beneficiados por arbitragens vergonhosas. Veja-se o que aconteceu nas meias-finais da Champions do ano passado, contra o Bayern de Munique. Pois agora depois dos italianos virarem por completo a eliminatória, um tal de árbitro auto-resolveu não prosseguir para o justo prolongamento e assinalou uma penalidade com lupa na mão e espuma no apito. E Buffon não merecia ter acabado a sua longa e exemplar carreira na Liga dos Campeões com uma expulsão, mas, que diabo, um homem não pode aguentar tudo com ar senhorial!
- Empolgante: A luta pela promoção...
... na competição que ainda chamo «Segunda Divisão». Há, ainda sete equipas que podem sonhar com aquela possibilidade, ainda que uma delas - o Nacional da Madeira - esteja quase com um pé na 1.ª Divisão. E é interessante observar que há uma grande e positiva dispersão geográfica e histórica entre os candidatos, desde os Açores (Santa Clara), ao Académico de Visei, ao Arouca, à sempre saudosa Académica de Coimbra, ao Leixões e ao Penafiel."
Bagão Félix, in A Bola
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